Na “boca do caixa”: empresa é condenada por castigar funcionários que não atingiam metas de vendas
Por Ademar Lopes Junior
A funcionária de importante rede de lojas de departamento nacional alega condições de trabalho humilhantes, especialmente na “boca do caixa”, que, segundo ela, era o local de trabalho (“castigo”) dos que não atingiam suas metas nas vendas e onde “deveriam enganar os clientes para realizar vendas de seguros e garantias adicionais”. Além disso, ela pede ressarcimento dos gastos que teve para trabalhar, já que “a reclamada exigia o uso de calças e sapatos pretos para a execução do trabalho e, no entanto, não fornecia tais peças ou reembolsava os valores”. Por fim, disse que havia diferenças pendentes relativas a horas extras e pediu o valor de R$ 50 mil como compensação aos danos morais sofridos.
A empresa se defendeu com o argumento de que “as jornadas de trabalho foram regularmente registradas nos controles de ponto, salientando que eventual condenação deve considerar os registros de ponto”. Sustentou que foi regularmente pactuado o acordo de compensação de horas, e que hipotética condenação deveria ficar limitada ao adicional extraordinário, na forma da Súmula nº 340 do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Asseverou que, quando havia necessidade de se prorrogar a jornada de trabalho no mês de dezembro, ocorria a respectiva compensação, bem como que eventual trabalho aos domingos e feriados foi regularmente compensado ou pago. Acrescentou ainda que o intervalo intrajornada foi concedido.
O juízo de primeira instância entendeu que a pretensão da trabalhadora não era procedente e negou os pedidos. Segundo a sentença da Vara do Trabalho de Itatiba, “deve ser considerada a validade dos horários anotados nos controles de ponto, salientando que em relação ao labor aos domingos e feriados houve a respectiva compensação”. Inconformada, a trabalhadora recorreu.
O relator do acórdão, desembargador Lorival Ferreira dos Santos, da 5ª Câmara do TRT, entendeu que a pretensão da autora era parcialmente procedente, ponderando, no entanto, que “a prova testemunhal produzida pela autora mostrou-se frágil e inconsistente para rechaçar os horários estampados nos cartões de ponto”. Além disso, afirmou o desembargador, “a primeira testemunha da autora confirmou a veracidade dos registros de ponto em relação aos horários de saída”. A decisão colegiada ainda dispôs que “em relação ao intervalo intrajornada, os controles de ponto indicam assinalação de período inferior a 1h – por amostragem, no dia 23.06.2007 – fl. 262, cumprindo observar que a partir de outubro/2007, a própria autora, na vestibular, admitiu a fruição do intervalo mínimo de 1h”. O relator afirmou que a conclusão do juízo de primeiro grau estava correta “ao admitir a veracidade das anotações dos cartões de ponto”.
O desembargador lembrou que “à reclamante incumbia o ônus de apontar a existência de eventuais diferenças, considerados os registros de ponto e os recibos de pagamento existentes nos autos. E de tal ônus constata-se que a autora desvencilhou-se de forma satisfatória, considerando o conjunto probatório”. Segundo o acórdão, “não há, nos autos, qualquer acordo de compensação de horas e, tampouco, de ‘banco de horas’, cumprindo ainda destacar que tal forma de compensação está condicionada à existência de estipulação normativa, em conformidade com o disposto no parágrafo 2º do artigo 59 da CLT. E, no caso, as estipulações constantes na cláusula 13ª (fl. 183) possuem caráter meramente informativo”.
Quanto aos danos morais, o juízo de origem rejeitou a pretensão da trabalhadora, sob o fundamento de que “a reclamante não foi humilhada, bem como não havia determinação referente à venda embutida de seguros e garantias”. O acórdão da 5ª Câmara seguiu em sentido contrário ao da sentença de primeira instância e entendeu que “devida é a indenização por danos morais sofridos pela empregada”. O acórdão dispôs que “a prova dos autos revelou a adoção de uma forma injuriosa e vil de gestão de administração apenas visando albergar o interesse patronal, com vistas a alavancar a produção e que culminava na imposição de tratamento constrangedor e humilhante. Ao invés de estimular os trabalhadores, feria-lhes a autoestima”. A decisão da 5ª Câmara ainda registrou que “não se pode olvidar que o trabalho na ‘boca do caixa’ dava-se a título de punição ou castigo destinado aos vendedores que não atingiam as metas de vendas impostas pela empregadora, atitude esta que não se pode admitir”.
Nessa linha, a 5ª Câmara fixou a indenização por danos morais em R$ 10 mil, a qual reputou como “razoável, ressaltando-se que esse valor não acarretará o enriquecimento do trabalhador e tampouco importará em dificuldades financeiras a serem suportadas pela reclamada, considerando seu notório e significativo porte econômico”. Além da indenização, o acórdão também condenou a reclamada, ante o descumprimento integral da obrigação de fornecer uniformes (calças e sapatos pretos), ao ressarcimento do valor de R$ 650 (que sequer foram impugnados pela reclamada), que “foram gastos pela autora para a aquisição completa do uniforme (sete calças pretas e quatro pares de sapatos)”. (Processo 043200-56.2009.5.15.0145 RO)
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