Câmara nega horas extras a ex-empregada de empresa de telemarketing
Trabalhadora fundamentou recurso em norma do Ministério do Trabalho e Emprego,
que limitou a seis horas diárias a jornada de trabalho dos profissionais do setor
Por Ademar Lopes Junior
A reclamante trabalhava para uma empresa especializada em telemarketing. Foi admitida em 5 de dezembro de 2006, para exercer a função de operadora de cobrança, e dispensada em 5 de novembro de 2007. Ela recebia, além do salário fixo, comissões no importe médio de R$ 250, sob a rubrica de “prêmios”. As comissões, no entanto, não integravam o descanso semanal remunerado (DSR). A empresa admitiu o pagamento dos prêmios, mas não concordou com a sua integração no DSR, alegando ser “pagamento decorrente do atingimento de metas”.
Outro pedido da trabalhadora foi o pagamento de horas extras, uma vez que, a partir de 20 de agosto de 2008, por força de acordo coletivo de trabalho, a reclamada passou a adotar jornada de 36 horas semanais, destinada aos operadores de telemarketing, ajustando-se, assim, aos termos do Anexo II da Norma Regulamentar 17 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
A sentença da 4ª Vara do Trabalho de Bauru considerou que há a “necessidade de integração da parte variável do salário, independente da denominação, quer prêmios, quer de comissões, no descanso semanal remunerado”, e condenou a reclamada ao pagamento dos reflexos dos prêmios, em valores constantes nos recibos de pagamento, sobre o DSR, mas ressaltou que “os descansos semanais remunerados assim enriquecidos não produzirão novos reflexos, para que se evite a duplicidade de repercussões”.
Quanto ao pedido de horas extras, a sentença salientou que “a citada Portaria Ministerial padece do vício formal da inconstitucionalidade, pois restou violado o princípio da reserva legal e da competência exclusiva do Poder Legislativo para editar normas sobre Direito do Trabalho, na linha dos artigos 5º e 22, I, da Constituição Federal”. O juízo de primeira instância lembrou que o Anexo II da Norma Regulamentar 17, editado pelo MTE por meio da Portaria 9, de 30 de março de 2007, e que preconiza que “o tempo de trabalho em efetiva atividade de teleatendimento/telemarketing é de, no máximo, 6 (seis) horas diárias, nele incluídas as pausas, sem prejuízo da remuneração”, tem por finalidade normativa da portaria, que é “típico ato administrativo”, explicitar melhor “o conteúdo de lei pré-existente”.
A sentença afirmou que “não pode o Poder Executivo, no exercício da função regulamentar, estabelecer através de Portarias Ministeriais jornada de trabalho especial para determinada categoria, visto que a seara própria para a discussão é através de Lei em sentido formal, na medida em que a edição de normas de Direito do Trabalho, como aquelas que dispõem são normas típicas de Direito do Trabalho que, a teor do preceito constante do artigo 22, I, da Constituição da República, somente o Congresso Nacional, com a sanção presidencial, poderá fazê-lo”.
Em conclusão, o juízo de primeira instância julgou parcialmente procedentes os pedidos e condenou a reclamada ao pagamento dos reflexos dos prêmios no descanso semanal remunerado.
Inconformadas, as partes recorreram. A empresa pediu a reforma do julgado, discordando de sua condenação em reflexos da parte variável da remuneração em DSRs. Alegou que “o equívoco reside em considerar devida a repercussão da parcela paga como prêmio no descanso semanal remunerado, sob o argumento de que a parte variável tinha apuração no interstício mensal, independentemente do número de presenças no hiato, e condicionada ao atingimento de metas”. E sustentou que, “sem embargo de não se discutir a natureza salarial da parcela ‘prêmio’, é certo que já remunerado o repouso semanal da recorrida”. A reclamante, por sua vez, se insurgiu contra a parte da sentença que entendeu ser inconstitucional o Anexo II, da NR-17, do Ministério do Trabalho e Emprego, notadamente quanto à redução da jornada de trabalho dos empregados de teleatendimento/telemarketing, para 6 (seis) horas diárias e 36 (trinta e seis) horas semanais. Ela defendeu a constitucionalidade das Normas Regulamentadoras, criadas com fulcro na Portaria nº 3.214/1978, uma vez que, no entendimento da recorrente, as Normas têm status de lei ordinária, por força do artigo 200 da CLT. A trabalhadora defendeu também que “a NR-17 não fixou jornada de trabalho, mas apenas limitou o tempo efetivo em atividade de teleatendimento”.
A relatora do acórdão da 8ª Câmara, desembargadora Erodite Ribeiro dos Santos De Biasi, não acolheu nenhum dos principais pedidos das partes. Para a reclamada, que defendeu que os “prêmios” já haviam sido remunerados e não têm reflexo nos DSRs, o acórdão afirmou que “não há como prevalecer tal entendimento” e acrescentou que “à luz dos documentos carreados aos autos, conclui-se que a verba, paga mensalmente, se baseava na produção (era condicionada ao atingimento de metas), com valores distintos, o que implica sua integração ao salário e, consequentemente, a condenação da reclamada aos reflexos nos DSRs”.
Já com relação ao pedido da trabalhadora, o acórdão ressaltou que “em momento algum vislumbra-se a autorização para o Ministério do Trabalho definir a jornada de trabalho de determinada categoria ou função. Na verdade, referidos dispositivos apenas autorizam a edição de normas relativas à saúde, higiene e segurança, as quais não abrangem a fixação da jornada”. A decisão colegiada ainda afirmou que “a definição da jornada de trabalho não se insere no poder regulamentador do Ministério do Trabalho, ainda que, no entender da recorrente, a redução da jornada esteja substancialmente ligada à saúde do trabalhador e, portanto, possível de ser instituída por norma regulamentar”. A decisão colegiada completou que “a competência para legislar sobre Direito do Trabalho é privativa da União, não podendo o Ministério do Trabalho estabelecer uma jornada de seis horas para aquela categoria”. E como, no caso dos operadores de telemarketing, ainda não foi instituída a jornada específica, esta será de 8 horas diárias e 44 horas semanais, nos termos do artigo 58 da CLT, decidiu a Câmara. (Processo 0131300-52.2009.5.15.0091)
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