As novas tecnologias e os acidentes de trabalho no meio rural foi o tema de encerramento do XVII Congresso
Por Ademar Lopes Junior
"As novas tecnologias e os acidentes de trabalho no meio rural" foi o tema da conferência de encerramento do XVII Congresso Brasileiro de Direito do Trabalho Rural, na sexta-feira, 9/10, em Marília. A exposição ficou a cargo do ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Cláudio Mascarenhas Brandão, com apresentação do presidente do TRT-15, desembargador Lorival Ferreira dos Santos.
O ministro Cláudio Brandão, que é mestre em Direito pela Universidade Federal da Bahia, discorreu sobre o tema em três eixos, especificamente a conceituação da saúde, a realidade das tecnologias aplicadas ao meio rural e, também, como o Tribunal Superior do Trabalho tem decidido nos casos que envolvem a responsabilidade objetiva e subjetiva em caso de acidentes de trabalho.
Sobre a saúde, o ministro afirmou que este é um conceito permanentemente dinâmico, e ressaltou a importância de as políticas públicas buscarem a saúde como um ideal, que se entrelaça com o próprio meio ambiente, com seus fatores biológicos, ecológicos e socioeconômicos. Esse conceito plural é reafirmado também pela Medicina que, segundo o ministro, leva em conta ainda outros elementos como os hábitos de vida das pessoas como causa de acidentes de trabalho no meio ambiente do trabalho. O ministro salientou que "os acidentes não são obra do acaso, mas sim previsíveis e, em grande parte, evitáveis", o que se comprova, segundo o ministro, com a evolução da ciência médica na catalogação das doenças, número que cresce historicamente (na década de 1920, havia 3.000 doenças diferentes registradas; em 2003, esse número passava de 30 mil e, atualmente, entre 500 e 600 novas enfermidades são catalogadas a cada ano).
O ministro afirmou que existe uma relação direta entre trabalho e saúde, o que se confirma cada vez mais com as novas formas de gestão, com os novos processos de produção, muitas vezes realizada sob condições adversas (agentes físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e psíquicos, além das rápidas e constantes mudanças nos processos de trabalho), os fatores sociais, os riscos psicossociais e, também, pelas inovações tecnológicas, que impõem o fim de limites físicos e temporais.
O expositor destacou que a Constituição Federal é fértil em disposições que protegem a saúde do trabalhador, e destacou a importância da incorporação das convenções da OIT (art. 5º, § 2º), e sua dimensão supranacional de proteção à pessoa, bem como a natureza de norma supralegal (STF, RE n. 466.343-1/SP, Rel. Min. Cesar Peluso), a ampla garantia de reparação (art. 5º, V e X), o direito social (art. 6º), a defesa do meio ambiente (art. 170), a garantia do direito à saúde (art. 194, "caput"), a política de redução dos riscos de doenças (art. 196), a execução de políticas de saúde do trabalhador (art. 200, II) e, por fim, o meio ambiente do trabalho integrante do conceito de meio ambiente (art. 200, VIII).
No campo da prevenção dos acidentes, o ministro ainda destacou o decreto 7.602/2011, que trata da "Política Nacional de Saúde e Segurança no Trabalho", cujos objetivos são, em linhas gerais, a promoção da saúde, a melhoria da qualidade de vida, a prevenção de acidentes e de danos à saúde advindos ou relacionados ao trabalho, ou que ocorram por meio dele por meio da eliminação ou redução dos riscos nos ambientes de trabalho. Ainda de acordo com o ministro, baseado no relatório da OIT do ano de 2007, "Healh and Safety Executive", do Reino Unido, essa política de prevenção apresenta como efeitos: "grandes reduções nas taxas de absenteísmo, maior produtividade, melhoria dos níveis de qualificação prévia, maior nível de satisfação, ânimo, motivação e concentração, melhoria na capacidade de retenção, na relação entre cliente e fornecedor e na ‘imagem' e reputação da empresa".
No meio rural, segundo dados da Organização Mundial da Saúde de 1995, são registrados anualmente 83 milhões de acidentes (30% das estimativas de acidentes no trabalho ocorridos no mundo), 170 mil mortes (50% do total relacionado ao trabalho) além de 2 a 5 milhões de intoxicações pela exposição aos agrotóxicos. No Brasil, segundo o ministro Brandão, em contrapartida, "existe um elevado grau de subnotificação, sendo que um em cada três acidentes gera aposentadoria por invalidez (incapacidade permanente). O ministro ressaltou também que no país, os homens (15-24 anos) são as maiores vítimas dos acidentes de trabalho, e representam "80% acidentes-típicos, já as doenças ocupacionais atingem trabalhadores com idade mais avançada". O ministro lembrou também que, entre 2004 e 2012, houve um aumento de 58% do número total de acidentes.
O expositor abordou ainda casos de acidentes do trabalho com tratores, que representam mais de 60% das mortes (sendo 40% dessas mortes com crianças); com agrotóxicos (segundo informações da OMS, o Brasil é um dos cinco maiores consumidores de agrotóxicos do mundo), campo em que apenas 1/6 dos acidentes são registrados, na aviação agrícola, setor que registrou aumento de 165% no número de acidentes entre 2008 e 2014, e por fim, no ramo sucroalcooleiro, setor que ainda amarga péssimas condições de trabalho, com turnos de até 24h no carregamento da cana e de 12h no corte (manual ou mecanizado).
O ministro Brandão concluiu sua exposição afirmando que "o progresso no campo gera cada vez mais danos" e, aproveitando um pensamento do jurista Inocêncio Mártires Coelho, afirmou que "a norma constitucional não deve ser encarada como um momento estático e permanente na vida do Estado Brasileiro, "e sim como algo dinâmico, que se renova continuamente, a compasso das transformações, igualmente constantes, por que passa a realidade que as normas constitucionais intentam regular".
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