Carta de Sorocaba-SP sobre a abolição do trabalho infantil

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Os participantes do Seminário "Combate ao Trabalho Infantil– Boas Práticas", promovido pelo Comitê de Erradicação do Trabalho Infantil e pela Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, com o apoio do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região e Faculdade de Direito de Sorocaba, reunidos em 06 de Maio de 2016, na cidade de Sorocaba-SP, manifestam a sua convicção de que o trabalho precoce subtrai a infância, causa dano irreparável à formação e desenvolvimento de pessoas em peculiar condição de desenvolvimento e aniquila o futuro daqueles que, despreparados, não terão condições de ingressar num mercado de trabalho cada vez mais competitivo, restando-lhes o desemprego ou, quando muito, o subemprego. Reafirmam ainda a sua convicção de que:

1) A intensificação das ações de combate ao trabalho infantil precisa ocupar lugar de destaque na agenda positiva nacional, especialmente quando se constata que, depois de mais de duas décadas de redução no exército de crianças e adolescentes explorados no Brasil, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD de 2014, subiu para 3,331 milhões o número de trabalhadores com idade entre cinco e dezessete anos, o que é é absolutamente condenável sob todos os aspectos.

2) Crises econômicas e políticas não podem servir de justificativa para ignorar o comando constitucional e legal de proteção integral e absolutamente prioritária que deve ser devotada a crianças, adolescentes e, sem ignorar a precedência destes, também ao jovem. Na área trabalhista, tal proteção implica respeito à idade mínima e observância estrita aos direitos trabalhistas e previdenciários.

3) A substituição da infância pelo trabalho precoce pode comprometer seriamente o desenvolvimento biopsicossocial de crianças e adolescentes, com prejuízos irreparáveis, gerando adultos frustrados e psicologicamente abalados.

4) A partir da EC 59/2009, que modificou o artigo 208 da CRFB para tornar obrigatórios, até 2016, também a pré-escola e o ensino médio, que integram a educação básica compulsória dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos, deve ser elevada a idade mínima para o trabalho, que hoje é de 16 (dezesseis) anos (exceto na condição de aprendiz, a partir dos catorze), para 18 (dezoito) anos. Isto deriva da observância da Convenção 138 da OIT, ratificada pelo País, que veda a fixação da idade mínima para trabalhar antes do término da escolarização obrigatória.

5) O Brasil não cumpriu o compromisso interno e internacional de erradicar as piores formas de trabalho infantil até 2015, não cumprirá em 2016 e tem que realizar esforço interinstitucional articulado para, senão abolir totalmente, reduzir drasticamente todas as formas de trabalho infantil até 2020. Temos condições de dar exemplo ao mundo na área de direitos fundamentais e humanos.

6) Não podem prosperar a PEC 18/2011 e as cinco outras a ela apensadas. Em tema de proteção à infância e adolescência, que deve ser integral e absolutamente prioritária, não se concebe retrocesso social. São inconstitucionais e representam inegável afronta aos direitos humanos de pessoas em peculiar condição de desenvolvimento e à Convenção 138 da OIT quaisquer tentativas de redução da idade mínima para o trabalho.

7) A educação gratuita, universalizada, atrativa, integral, de preferência em tempo também integral, dos quatro aos dezessete anos, como asseguram a Constituição da República Federativa do Brasil e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, é, inequivocamente, o melhor e mais eficaz instrumento de combate ao trabalho infantil e de preparação para uma vida adulta saudável, feliz e realizada, pessoal e profissionalmente.

8) A Justiça do Trabalho, por intermédio do seu Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem (CSJT-TST), que envolve, além do Tribunal Superior do Trabalho, os 24 Tribunais Regionais do Trabalho do País, tem, como ramo especializado de um dos Poderes da República, a missão constitucional de integrar-se à rede de proteção de crianças e adolescentes, enfrentando com rigor a chaga social do trabalho infantil, afirmando a necessidade de buscar-se o pleno emprego e o trabalho decente, por intermédio da educação e profissionalização de adolescentes e jovens.

9) O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, por seu Comitê de Erradicação do Trabalho Infantil, gestores regionais do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem, por seus 10 Juizados Especiais da Infância e da Adolescência (JEIA), por todos os seus Juízes e Desembargadores, tem a consciência do seu papel fundamental na luta contra o trabalho infantil e de estímulo à educação e aprendizagem.

10) A aprendizagem verdadeira, em que prepondera o aspecto formativo-educacional sobre o produtivo, é porta válida e protegida para a profissionalização e caminho seguro a ser trilhado para o primeiro emprego.

11) O Trabalho Infantil Doméstico, por submeter crianças e adolescentes a riscos de toda ordem e até mesmo a abusos sexuais, integra a lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP), sendo, por isso, expressamente vedado antes dos dezoito anos de idade. Cabe ao Ministério do Trabalho e Previdência Social, em casos mais graves com apoio da Polícia Federal, rescindir administrativamente e resgatar a menina ou menino explorados, sem prejuízo da atuação do Ministério Público do Trabalho e resposta jurisdicional da Justiça do Trabalho.

12) Compete à Justiça do Trabalho autorizar a fiscalização em situação de trabalho infantil doméstico. O lar é o asilo inviolável da pessoa, mas não pode a garantia constitucional servir de salvo-conduto para a exploração de crianças e adolescentes. A autorização poderá ser solicitada diretamente pelo Auditor Fiscal do Trabalho e/ou pelo Ministério Público do Trabalho, sendo que, em estado de flagrância de exploração criminosa, como a de abuso sexual, cárcere privado e trabalho escravo, nem necessidade há de autorização judicial. Sorocaba, 6 de Maio de 2016.

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Comunicação Social