Culpa do trabalhador em acidente não isenta empregador também culpado
Por unanimidade, a 12ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região concedeu provimento parcial a recurso de um auxiliar de marceneiro, em reclamação movida contra empresa que fabrica e comercializa móveis, condenando a reclamada a pagar ao autor R$ 10 mil a título de indenização por danos morais decorrentes de acidente de trabalho em que houve culpa das duas partes. Para o relator, juiz Edison dos Santos Pelegrini, “cabe indenização por dano moral decorrente de acidente de trabalho ocorrido por culpa concorrente, na medida em que ambos, empregador e empregado, concorreram culposamente para o infortúnio”. O acidente causou a perda de parte do dedo anular esquerdo do operário.
O reclamante trabalhava como operador de desempenadeira, mantendo, por iniciativa própria, o sistema de segurança do equipamento travado. Por sua vez, a chefia tinha conhecimento e tolerava a conduta do trabalhador. Entretanto, explica o relator, embora a culpa concorrente não exima a empresa de responsabilidade, reduz o valor da indenização, conforme dispõe o artigo 945 do Código Civil: “Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.”
Via de mão dupla
Originalmente, a Vara do Trabalho de Votuporanga, município da região de São José do Rio Preto, no Noroeste do Estado de São Paulo, julgou improcedente a reclamação - em que o autor pretendia a condenação da empresa ao pagamento de danos materiais e morais -, acatando a tese da reclamada no sentido de que a culpa teria sido exclusiva do reclamante. No recurso, o autor alegou a culpa concorrente da reclamada, que, entre outros fatores, não forneceria os equipamentos de segurança necessários para a atividade. O trabalhador argumentou, ainda, que o dispositivo de segurança da máquina estaria quebrado.
Admitido em 1° de outubro de 2001, o trabalhador sofreu o acidente apenas 17 dias depois. A perícia constatou que o contato físico do operador da máquina com o eixo de corte, elemento que extirpou parte do dedo do reclamante, somente seria possível se o operador, intencional e manualmente, travasse o dispositivo de segurança ou, durante a passagem da peça de madeira, agisse de maneira negligente, colocando a mão em área indevida. Segundo o perito, se a operação da máquina for realizada obedecendo-se aos padrões para os quais foi fabricada, e se o operador desempenhar sua atividade com a atenção devida, o equipamento pode ser considerado como de “elevado nível de segurança”.
A empresa comprovou que o reclamante, ao ser admitido, recebeu orientação para operar a máquina, bem como os equipamentos de proteção necessários. Por sua vez, uma das testemunhas ouvidas afirmou que o trabalhador, no intuito de “mostrar serviços”, costumava travar ou desativar o dispositivo de segurança da desempenadeira, para "facilitar" a execução do trabalho. De sua parte, o encarregado sabia da conduta perigosa do autor, mas limitou-se a adverti-lo, fazendo, de certa forma, “vista grossa”, sem tomar nenhuma providência mais enérgica, conforme declarou outra testemunha.
Jeitinho brasileiro
Na visão do relator, o operário efetivamente sabia que deveria trabalhar com o dispositivo de segurança acionado, mas acabou “dando um jeitinho, à moda brasileira, de encontrar atalho a fim de ‘facilitar’ o serviço, descuidando da segurança”. De sua parte, a chefia também sabia da conduta inadequada do empregado, “porém fazia de conta que não via”, avaliou o juiz Edison. “Patrão e empregado”, concluiu o relator, “acabaram concorrendo para o infortúnio, na medida da culpabilidade de cada um, eis que ambos descuidaram do fator segurança do trabalho”.
Quanto aos danos materiais, o magistrado negou o pedido do autor, por considerar que ele não conseguiu comprovar a perda. “O reclamante recuperou sua capacidade de trabalho, voltando a exercer as mesmas funções e a operar o mesmo equipamento”, justificou o relator.
Já sobre os danos morais não restou dúvida, no entendimento do juiz Edison, que considerou não só as seqüelas e dores físicas sofridas pelo trabalhador, mas também as perdas de caráter psíquico, como a angústia e o sofrimento causados pela deformidade adquirida.
Para fixar o valor da indenização em R$ 10 mil, o magistrado levou em consideração, além da culpa concorrente do reclamante, fatores como a personalidade do indivíduo, a extensão da lesão, a intensidade do sofrimento, o contexto e as demais circunstâncias pessoais e econômicas emergentes do acontecimento, inclusive o porte econômico do réu. (Processo n° 595-2005-027-15-00-3)
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