JT é competente para julgar ação de brasileiro que trabalhou no exterior

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Quanto à legislação, prevalece a do país
onde os serviços foram prestados

Em votação unânime, a 1ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região rejeitou preliminar de incompetência de jurisdição argüida por uma empresa espanhola do ramo da aeronáutica e manteve a competência da Justiça Trabalhista de São José dos Campos para julgar processo em que também são reclamadas a filial brasileira da empresa e uma cooperativa de serviços e engenharia. A empresa espanhola alegou, nas contra-razões ao recurso ordinário interposto pelo reclamante, a incompetência da Justiça brasileira para conhecer e julgar a ação, pelo fato de as partes terem assinado o contrato de trabalho na Espanha e por ter ocorrido lá a prestação de serviços, ainda que a proposta de trabalho tenha sido discutida anteriormente no Brasil.

Para julgar-se competente para dirimir a demanda, a 1ª Vara do Trabalho de São José dos Campos buscou fundamento no artigo 651, parágrafos 2º e 3º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). No entanto, o relator do acórdão no TRT, juiz convocado José Otávio de Souza Ferreira, observou em seu voto que o artigo 651 trata da competência trabalhista interna, “pois se encontra situado no Título VIII, capítulo II, seção II da CLT, que trata especificamente da competência das Varas do Trabalho”. Para o juiz José Otávio, a discussão travada no processo diz respeito à competência de jurisdição, caso em que, assinala o relator, a CLT é omissa, devendo ser aplicado, de forma subsidiária, o que estabelecem os artigos 88 a 90 [Capítulo II do Título IV, que regulamenta a competência internacional] do Código de Processo Civil (CPC). “Analisando-se tais dispositivos legais, conclui-se pela competência da jurisdição nacional para conhecer e decidir esta demanda, com fulcro no inciso I e no parágrafo único do artigo 88 do CPC, pois todas as reclamadas possuem domicílio no Brasil”, assinalou o magistrado. “Assim, embora sob outros fundamentos, rejeita-se a argüição de incompetência de jurisdição.”

Leis de Espanha

A segunda controvérsia levantada na ação se referia à legislação a ser aplicada e foi trazida à baila pelo trabalhador. Alegando ter sido contratado no Brasil pela cooperativa para prestar serviços na matriz espanhola da empresa de aeronáutica, o autor pleiteou que fosse aplicada à ação a legislação brasileira. Argumentou que a aplicação da lei espanhola só se justificaria se ele tivesse ido para a Espanha por sua própria conta e risco. “Existindo conflito de leis trabalhistas no espaço”, ponderou o juiz José Otávio, “há dois critérios jurídicos a serem sopesados: aquele que privilegia a legislação do local da celebração do contrato (‘lex loci actum’), existente na Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro (LICC) [artigo 9º: ‘para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem’], ou aquele que elege a legislação do local de execução do trabalho (‘lex loci executionis’), adotado pelo ‘Código de Bustamante’”. Ratificado no Brasil pelo Decreto 18.871, de 13 de agosto de 1929, esse código preconiza que é territorial a legislação sobre acidentes do trabalho e proteção social do trabalhador. Seguindo proposição do relator, a Câmara decidiu pela aplicação deste último.

“Considerando que ambos os critérios apresentados encontram-se previstos em regras de mesma hierarquia e simultaneamente em vigor (...) há que se fazer uma opção em relação a um deles, tendo-se em conta o caráter mutuamente excludente das disposições neles contidas”, apontou o juiz José Otávio. Para ele, a escolha deve recair no Código de Bustamante, pelo caráter especial de seu artigo 198, “que, especificamente, regula a questão referente ao conflito de leis trabalhistas no espaço”. Por sua vez, o artigo 9º da LICC deve ser afastado “dada a generalidade de suas disposições”, defendeu o relator. “Não há qualquer contradição em se reconhecer a competência da Justiça brasileira e decidir pela aplicação da lei espanhola, pois poderá a justiça brasileira aplicar direito estrangeiro em casos como tais”, justificou o magistrado. Ele também fundamentou sua proposição na Súmula 207 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), segundo a qual “a relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação de serviço e não por aquelas do local da contratação”.

Improcedente

Quanto ao mérito, a Câmara mais uma vez manteve o julgamento da 1ª VT de São José dos Campos, que decidiu pela improcedência do processo. O juiz José Otávio ressaltou que, no recurso, o reclamante não promoveu nenhuma impugnação específica, limitando-se a se insurgir genericamente contra a sentença de primeira instância, sob a alegação de que os pedidos feitos na petição inicial estariam em consonância com as propostas que originaram o contrato verbal de trabalho, discutido no Brasil com a cooperativa, antes da formalização do contrato na Espanha. “Incumbe à parte, ao recorrer, demonstrar os motivos de fato e de direito pelos quais pretende a reforma do julgado (...) fundamentando o seu inconformismo de acordo com o que restou decidido na instância originária, o que não ocorreu no presente caso”, advertiu o relator. “A matéria passível de conhecimento pela instância recursal restringe-se àquela impugnada pelo recorrente, não bastando que a parte decline o seu inconformismo”, insistiu o juiz, citando os artigos 514 e 515 do CPC. “Assim, por estarem as razões recursais apresentadas pelo reclamante em desarmonia com os fundamentos da sentença, resta inviabilizada a apreciação do recurso pelo Tribunal.”

Nem mesmo a menção do artigo 3° da Lei 7.064 de 1982 adiantou ao recorrente. O artigo, opôs-se o relator, “é inaplicável ao caso em análise por cuidar de hipóteses especiais de transferência de empregados para prestar serviços em localidade diversa daquela para a qual foram contratados”. (Processo 1326-2005-013-15-00-1 RO)

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