Motorista monitorado por rastreador conquista direito a horas extras
A 10ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, em votação unânime, negou provimento a recurso ordinário de uma empresa de transportes, em processo movido por um motorista de caminhão. A decisão manteve a condenação da reclamada ao pagamento de horas extras e reflexos, imposta pela 1ª Vara do Trabalho de Paulínia, município da região de Campinas. Embora o trabalhador exercesse atividade externa, toda a movimentação do caminhão por ele dirigido era monitorada pela empresa, por meio de um sistema de rastreamento instalado no veículo, o que foi considerado pelo colegiado como controle da jornada de trabalho.
“São inaplicáveis as disposições previstas no artigo 62, inciso I, da Consolidação das leis do Trabalho (CLT), quando demonstrada a existência de efetiva fiscalização do horário de trabalho externo do motorista, ainda que de forma indireta, exercida por intermédio do monitoramento que, além dos seus fins precípuos, também era utilizado para controlar a jornada de trabalho do reclamante, mediante os registros de todos os períodos em que o veículo se encontrava em movimento ou parado.” Assim o relator do acórdão no TRT, desembargador federal do trabalho Fernando da Silva Borges, resumiu, em seu voto, o fundamento que norteou a decisão da Câmara.
Exceção
A reclamada baseou seu recurso exatamente no inciso I do artigo 62 da CLT, que exclui da jornada normal os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho. De fato, o reclamante foi contratado para desempenhar a função de motorista de veículo pesado, prestando serviços exclusivamente externos, condição que consta de sua ficha de registro. Além disso, a recorrente salientou que as normas coletivas da categoria vigentes à época do contrato de trabalho mantido com o reclamante não contradizem a exceção prevista na CLT.
No entanto, destacou o relator, “os aspectos formais da relação jurídica de emprego não se sobrepõem à realidade, diante do princípio da primazia desta sobre a forma, consagrado no Direito do Trabalho”. Para o desembargador, também o conteúdo das normas coletivas “não possui o alcance pretendido pela reclamada, na medida em que as convenções ou acordos coletivos de trabalho não têm o condão de subtrair do trabalhador um direito individual, assegurado constitucionalmente, quando o empregador detém meios de controlar o horário de trabalho”.
No entendimento da Câmara, a prova oral produzida no processo revelou que a reclamada possuía total controle do tempo despendido pelo motorista para o desempenho de suas atividades. “O rastreador via satélite não constitui instrumento próprio para registro de jornada, tratando-se de equipamento que permite a localização de determinado veículo, e a adoção desse equipamento ou mesmo outros comumente utilizados por empresas de transportes de carga rodoviária, como o tacógrafo, na verdade visam atender aos interesses do empregador quanto à segurança da tripulação, do veículo e da respectiva carga, além de se tratar de exigência do Departamento Nacional de Trânsito”, detalhou o relator. Na situação em julgamento, porém, assinalou o magistrado, o depoimento prestado pela testemunha apresentada pela própria reclamada comprovou que o rastreador foi instalado no veículo não só por razões de segurança, mas também para ser utilizado como “autêntico controlador das atividades desenvolvidas pelo motorista, a qualquer momento”, enfatizou Borges. A testemunha declarou textualmente “que os horários de início e término de carregamento, entrada e saída no cliente e as paradas para refeição devem ser anotadas no rastreador”. Se a anotação não for feita, prosseguiu o depoente, a empresa entra em contato com o motorista pelo próprio rastreador, “para chamar a atenção”, e o caminhão pode até ser bloqueado.
“Não resta dúvida de que o reclamante não detinha autonomia do seu horário de labuta, pois a reclamada, conquanto conferisse ao empregado relativa flexibilidade na consecução do trabalho, possuía plenas condições do seu controle, uma vez que era possível bloquear o veículo e saber a localização exata deste, além de o motorista ser obrigado a prestar contas de quaisquer paradas realizadas, previstas ou não, permitindo à empresa, conseqüentemente, mensurar a jornada de trabalho”, concluiu o relator, no que foi acompanhado pelos demais integrantes a Câmara.
O colegiado manteve, inclusive, a jornada de trabalho fixada na sentença de primeira instância - das 7 h às 22 h, de segunda a sábado, com uma hora de intervalo para refeição -, com base no depoimento da testemunha trazida pelo reclamante, depoimento esse que, assinalou o relator, não foi contrariado por nenhuma outra prova produzida no processo. (Processo 0259-2006-087-15-00-5 RO)
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