Seminário celebra os 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos

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Os 20 anos da “Constituição Cidadã” também foram comemorados

Para marcar os 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos e os 20 anos da Constituição Federal do Brasil, comemorados, respectivamente, em 10 de dezembro e em 5 de outubro deste ano, foi realizado nos dias 13 e 14 de novembro, no Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, o Seminário Declaração Universal, Constituição e Direitos Sociais. Promovido pelo TRT, pela Escola da Magistratura da Justiça do Trabalho da 15ª Região (Ematra XV) e pela Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 15ª Região (Amatra XV), o evento ocorreu no Plenário do Tribunal, no 1º andar do edifício-sede, em Campinas, com a participação de aproximadamente 250 pessoas, entre magistrados, procuradores, advogados, servidores, estudantes e outros profissionais.

Além do presidente do TRT, desembargador federal do trabalho Luiz Carlos de Araújo, a Mesa de Abertura foi composta pelas seguintes autoridades: o desembargador federal do trabalho Flavio Allegretti de Campos Cooper, diretor da Ematra XV e corregedor regional eleito da 15ª Região; a presidente da Amatra XV, juíza Ana Paula Pellegrina Lockmann; a procuradora-chefe da Procuradoria Regional do Trabalho (PRT) da 15ª Região, Eleonora Bordini Coca; o presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), juiz Cláudio José Montesso; o juiz Luiz Antonio Alves Torrano, diretor-adjunto do Departamento de Interiorização da Associação Paulista de Magistrados (Apamagis), representando o presidente da entidade, desembargador Henrique Nelson Calandra; o vice-presidente da Comissão de Prerrogativas da Secção de São Paulo da OAB, Eli Alves da Silva, representando o presidente da Secção, Luiz Flávio Borges D´Urso; o advogado Jesus Arriel Cones Júnior, representando a presidente da Subsecção Campinas da OAB, Tereza Nascimento Rocha Dóro; e o procurador federal Fábio Munhoz.

Redemocratização

Na abertura, o presidente do TRT recordou que também se completaram, em 17 de outubro passado, 30 anos da revogação do Ato Institucional nº 5, “fato que nos livrou de enormes opressões e privações, reabrindo nossa Nação para a democracia”. Sobre o vigésimo aniversário da promulgação da Carta Magna, o desembargador ressaltou que “a ‘Constituição Cidadã’ foi aperfeiçoada e se amoldou, ainda que não imediatamente, às peculiaridades políticas e econômicas que fizeram as mudanças recentes do País”. O presidente destacou ainda o papel atual do Supremo Tribunal Federal, que, na opinião do magistrado, tem-se firmado “muito mais como Corte constitucional do que simplesmente como a última instância do Judiciário”.

Araújo contrapôs as mazelas que ainda hoje assolam grande parte da população brasileira e mundial – como o trabalho escravo, infantil ou degradante; a superlotação de presídios; a criminalidade organizada e o drama de refugiados palestinos e africanos – ao pronto socorro prestado recentemente a bancos e seguradoras particulares pelos governos das grandes potências econômicas do planeta, que não hesitaram em injetar, afirmou o desembargador, trilhões de dólares na tentativa de salvar o que restou de muitas empresas desses ramos. Para o magistrado, essa iniciativa desmascarou a suposta falta de recursos financeiros “para a erradicação da fome e da miséria de bilhões de pessoas espalhadas pelo mundo”, problema historicamente alegado por esses mesmos governos sempre que eram cobrados a respeito de sua responsabilidade nessa situação.

Recordação

Outra data próxima também foi lembrada, desta vez pelo diretor da Ematra XV. Em março de 2009, serão completados 90 anos da famosa conferência “A questão social e política no Brasil”, proferida por Rui Barbosa em 1919 no já demolido Teatro Lírico do Rio de Janeiro, durante sua campanha à Presidência da República. O texto se inspira no livro Urupês, de Monteiro Lobato – de cuja 1ª edição Rui recebera um exemplar no ano anterior, enviado pelo próprio autor –, e mais especificamente no Jeca Tatu, célebre personagem lobatiano. Sobre a conferência, assim se manifesta o site www.projetomemoria.art.br: “Naquele discurso (...) Rui apresentava (...) o Jeca Tatu como síntese do povo brasileiro, cuja situação de penúria e ignorância deveria ser enfrentada por meio de um avançado plano de reformas sociais e econômicas, como as que ele incluía no seu programa de governo.”

De repente, adentra o Plenário do TRT ninguém menos do que o próprio Rui Barbosa, na verdade o juiz Orlando Amâncio Taveira – titular da Vara do Trabalho de Caçapava, no Vale do Paraíba –, devidamente caracterizado, para relembrar um pequeno trecho da conferência:

– O trabalho não é o castigo: é a santificação das criaturas. Tudo o que nasce do trabalho é bom. Tudo o que se amontoa pelo trabalho é justo. Tudo o que assenta no trabalho é útil. Por isso, a riqueza, por isso, o capital, que emanam do trabalho, são, como ele, providenciais; como ele, necessários; benfazejos como ele. Mas já que do capital e da riqueza é manancial o trabalho, ao trabalho cabe a primazia incontestável sobre a riqueza e o capital – recordou Taveira, ou “Rui”, com direito a exibir uma vistosa cartola.

Re-humanização

A primeira conferência coube ao corregedor-geral da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Carlos Weis. Especialista em Direito do Estado e mestre em Teoria Geral do Estado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Weis é, desde setembro de 2002, membro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça. Apresentado ao público pela juíza do trabalho Alzeni Aparecida de Oliveira Furlan – integrante do Conselho Consultivo e de Programas da Ematra XV, no qual representa os juízes substitutos da 15ª Região –, o defensor falou sobre “Os 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos”.

O conferencista assinala que a idéia de se editar normas jurídicas de validade universal não surge em 1945, com a criação da Organização das Nações Unidas. Weis lembra que a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, integrada à Constituição francesa, remonta a 1789, quando floresce a concepção de que todo ser humano é portador de direitos fundamentais, que nascem com a própria pessoa.

Na 1ª metade do Século XX, no entanto, lamenta o defensor, essa crença em direitos inatos “vai por água abaixo”, com muitas pessoas trabalhando acorrentadas às máquinas ou, ao se verem desprovidas de energia para o trabalho, “abandonadas à própria sorte na sarjeta”, observou Weis. O mundo vive, nessa época, um duelo de ideários, sintetiza ele. De um lado, o marxismo, que condena o direito de propriedade e prega a chamada “ditadura do proletariado”. Do outro, a proposta que interpreta as populações humanas como sociedades de desiguais, nas quais existem indivíduos “talhados” para conduzir o Estado ao bem comum. Seriam estes verdadeiros super-homens, líderes de Estados todo-poderosos, superdimensionados. Está aí o espírito do nazi-fascismo, destaca Weis.

“O nascimento de um estado que se organiza e cresce administrativamente para causar o mal é conseqüência do abandono da idéia de que todos os seres humanos são possuidores de direitos fundamentais”, defende o conferencista. Mas, por outro lado, afirma, o episódio das bombas atômicas lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki, matando indistintamente centenas de milhares de pessoas, quer fossem militares, quer fossem mulheres, idosos e crianças, também é fruto do esquecimento do princípio da universalidade dos direitos fundamentais, mostrando que, opina o defensor, essa “falta de memória” não foi exclusividade dos nazi-fascistas.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos surge, então, três anos depois do fim da guerra, como resgate dessa idéia de que toda pessoa é detentora de direitos, nasce com eles. Do documento, mais do que os 30 artigos que o constituem, Weis destacou, em sua conferência, o preâmbulo, cuja redação foi de “uma felicidade divina”, na opinião do defensor:

“Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo,

Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que todos gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum,

Considerando ser essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo império da lei, para que o ser humano não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão,

Considerando ser essencial promover o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações,

Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta da ONU, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor do ser humano e na igualdade de direitos entre homens e mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla,

Considerando que os Estados-Membros se comprometeram a promover, em cooperação com as Nações Unidas, o respeito universal aos direitos e liberdades humanas fundamentais e a observância desses direitos e liberdades,

Considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades é da mais alta importância para o pleno cumprimento desse compromisso,

agora portanto,

A Assembléia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos

como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforce, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universal e efetiva, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição.”

Weis advertiu, no entanto, que a idéia de que existe uma dignidade inerente a cada ser humano, essência da Declaração Universal, ainda é ignorada com enorme freqüência mesmo nos dias atuais. Para exemplificar, o conferencista recorreu ao universo das relações trabalhistas, esfera em que ainda é comum “o ser humano ser tratado como coisa, a começar pela existência ainda hoje de trabalho escravo em larga escala em muitos países, inclusive no Brasil”, assinalou.

Na seqüência da programação, o filósofo Renato Joaquim Mendes, mestre em Psicologia Comunitária, proferiu a conferência “Direitos fundamentais da pessoa humana e as normas internacionais”. Renato é coordenador do Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil, desenvolvido pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). Este ano, o lema do Programa é “Educação: resposta certa contra o trabalho infantil”.

Encerrando o primeiro dia, o desembargador federal Luís Carlos Hiroki Muta, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (SP e MS), falou sobre “A Constituição Federal e as ações afirmativas”. Especialista em Direito Público, mestre em Direito e Estado pela Universidade de Brasília, o magistrado é professor universitário e autor dos livros “Direito Constitucional – Tomo I” e “Direito Constitucional – Organização do Estado e dos Poderes – Tomo II”.

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Comunicação Social