Seminário discute terceirização e ensino do Direito do Trabalho
"Intermediação de Mão-de-Obra e Responsabilidade Solidária" foi o tema do segundo e último painel do primeiro dia do II Encontro Internacional de Professores de Direito do Trabalho e II Seminário Internacional da Associação dos Magistrados do Trabalho da 15ª Região (Amatra XV), evento que reuniu desembargadores, juízes, procuradores, servidores, advogados, professores e estudantes, na última quinta-feira (14/2), no Plenário do TRT da15ª Região, em Campinas.
Presidido pelo desembargador federal do trabalho Lorival Ferreira dos Santos, coordenador da Escola da Magistratura do Trabalho da 15ª Região (Ematra XV), co-promotora do encontro, o painel teve como expositores o magistrado Mauricio César Arese, juiz camarista da Justiça do Trabalho de Córdoba (Argentina) e professor da Universidade Nacional de Córdoba, o juiz Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani, titular da Vara do Trabalho (VT) de Campo Limpo Paulista e também professor universitário, e o advogado e professor da Universidade da República (Uruguai) Alejandro Castello.
O juiz argentino Cesar Arese abriu o painel ressaltando o grande desafio que a terceirização representa para o Direito do Trabalho em seu país, onde a intermediação legalizada de mão-de-obra, mediante empresas de seleção e contratação de pessoal, apresentou um crescimento de 30% em 2007, prevendo-se igual crescimento para 2008. Ele explicou que, embora a Lei de Contrato de Trabalho (LCT) argentina distinga várias possíveis formas de intermediação, é reconhecida, em todos os casos, a solidariedade entre a empresa que intermedeia os serviços do trabalhador e aquela que os utiliza quando se trata de direitos trabalhistas. Mesmo admitindo a importância fundamental do instituto da responsabilidade solidária na proteção aos “trabalhadores indiretos”, Arese crê que a realidade dos terceirizados hoje requer respostas mais eficazes.
Em sua exposição, o juiz Francisco Giordani lamentou a posição do Brasil como o único país, dentre os representados no evento, em que a responsabilidade da empresa tomadora do serviço é considerada subsidiária, e não solidária, com relação à empresa prestadora. Segundo o magistrado, embora o artigo 265 do Código Civil brasileiro disponha que a solidariedade não se presume, resultando apenas da lei ou da vontade das partes, a empresa principal, da qual a empresa prestadora seria mero preposto, deveria compartilhar com esta os encargos inerentes ao empreendimento, uma vez que ambas são igualmente beneficiárias do trabalho do terceirizado. Para Giordani, sob uma visão moderna do Direito, a lei deve ser considerada o seu ponto de partida, e não de chegada, devendo-se, no julgamento das conflitos, aplicar não apenas as regras jurídicas, mas todo o ordenamento jurídico, o que inclui os princípios gerais que o norteiam. Dentre os princípios por ele invocados para o reconhecimento da responsabilidade solidária das empresas tomadoras estão os da dignidade da pessoa humana - basilar em nosso ordenamento jurídico -, da proteção da confiança - ou seja, o reconhecimento das legítimas expectativas do trabalhador -, os princípios protetores do Direito do Trabalho e o princípio da boa-fé objetiva. Para o magistrado, não há dúvida de que a responsabilidade subsidiária provoca grande angústia no trabalhador, obrigado a driblar todo tipo de armadilha para ter seus direitos reconhecidos. No entendimento de Giordani, a responsabilidade solidária entre as empresas que se beneficiam dos serviços do empregado é uma alternativa mais justa.
O professor Alejandro Castello tratou da evolução da terceirização em seu país, o Uruguai, onde o fenômeno, apesar de antigo, apresentou nos últimos 15 anos grande expansão e diversificação, por causa das transformações operadas no sistema de produção capitalista. De uma concepção negativa (de fraude), o país passou a um enfoque permissivo, reconhecendo-se a intermediação ao menos em algumas formas. Castello ponderou, contudo, que a liberdade de iniciativa econômica que fundamenta a moderna forma de organização empresarial – mais flexível, desmaterializada, com a transferência a outras empresas da responsabilidade por parte de suas atividades, visando à diminuição de custos – não pode violar ou impedir o exercício de direitos adquiridos do trabalhador ou determinar a deterioração de suas condições de vida. Como antídoto a essa situação, ele defendeu a flexibilização do conceito de empregador e a igualdade de direitos sociais e sindicais entre trabalhadores diretos e indiretos. Mostrando-se otimista, disse que a pior parte já passou, e que hoje vêm sendo implementadas importantes modificações nas legislações trabalhistas de vários países, como o próprio Uruguai, o Chile e a Espanha, visando compatibilizar eficiência com proteção e limitar os efeitos negativos da subcontratação.
Troca de experiências
Finalizando a programação do dia, os professores presentes foram convidados a falar acerca de suas experiências como docentes e sobre o ensino do Direito do Trabalho em suas universidades. O primeiro encontro nesse sentido ocorreu em agosto de 2007, em Córdoba, na Argentina.
As intervenções, de maneira geral, convergiram para uma mesma avaliação: o ensino jurídico na América Latina, com algumas honrosas exceções, tende a ser excessivamente teórico, centrado no mero conhecimento da legislação e voltado para a preparação de advogados. Referindo-se ao caso brasileiro, o juiz Ricardo Regis Laraia, titular da 1ª VT de Paulínia e coordenador da exposição, afirmou inexistir, no ensino de Direito no País, maior estímulo à composição de conflitos. “Ensina-se a postular, a litigar, a advogar, mas não se ensina a decidir”, alertou.
Os professores também ressaltaram a desvalorização do ensino do Direito do Trabalho nas universidades latino-americanas, onde é tratado como disciplina secundária, o que atribuem à atual primazia dada aos valores do mercado, em detrimento dos valores humanos, reduzindo a dimensão ética do Direito. Por fim, a organização do evento e os demais participantes acolheram e saudaram a solicitação do procurador do trabalho Ricardo Tadeu Marques da Fonseca, da Procuradoria Regional do Trabalho da 9ª Região (PR), para que os membros do Ministério Público do Trabalho possam integrar o grupo de discussão dos professores. O III Encontro Internacional de Professores de Direito do Trabalho deverá ocorrer ainda no segundo semestre de 2008, no Rio Grande do Sul.
- 4 visualizações