Suposto furto de lingüiça: trabalhadora de supermercado será indenizada
Acusar empregado sem as devidas provas, além de ameaçá-lo e constrangê-lo pelo alegado fato, promovendo, ainda, a divulgação desnecessária no ambiente profissional, pode possibilitar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Fica também sujeito o empregador a pagar indenização por dano moral, em decorrência do ilícito por ele praticado, em prejuízo à honra e à dignidade do trabalhador. Assim decidiu por unanimidade a 1ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, ao julgar recurso de um supermercado, tentando reformar sentença da 9ª Vara Trabalhista de Campinas. Revertendo apenas a condenação do empregador na questão dos honorários advocatícios, o colegiado manteve a decisão da 1ª instância, que condenou o varejista em um processo movido por uma trabalhadora que teria sido acusada de furto.
Segundo a própria reclamante, o episódio se deu quando um fiscal da loja, interessado em comprar certa porção de lingüiça, perguntou a ela o preço do produto. A profissional informou ao colega que a mercadoria não estava mais em promoção, mas que poderia colocar outra etiqueta com o mesmo preço. Em seguida, o próprio segurança pesou e levou o embutido. O supermercado alega que, em conseqüência do fato, teria aplicado apenas uma advertência à comerciária.
A trabalhadora, por sua vez, disse que o gerente a acusou de estar roubando e que, em razão disso, ela seria demitida por justa causa. O superior hierárquico também teria ameaçado chamar a polícia. Negando-se a assinar os papéis da justa causa, a reclamante não voltou a trabalhar, alegando estar deprimida e abalada, além de se sentir ofendida, já que foi acusada de algo que não fez.
Uma das testemunhas da autora disse que presenciou a trabalhadora acompanhada do segurança e de outras pessoas dirigindo-se à sobreloja. Cerca de 30 minutos depois, a reclamante voltou aos prantos. A mesma testemunha disse que um representante da empresa passou por todos os departamentos avisando que a reclamante tinha sido dispensada por justa causa pelo “roubo” do produto.
Em sua defesa, o empregador afirma que a reclamante apenas descumpriu procedimento interno da empresa, sendo advertida por seu ato. Disse que o motivo da rescisão do contrato de trabalho por justa causa se deu pelo não comparecimento ao trabalho por mais de trinta dias, sem justificação. Segundo o supermercado, não ficou comprovado o ato ilícito a ele imputado, nem tampouco o abalo moral sofrido pela trabalhadora, não justificando, assim, a condenação ao pagamento de indenização por dano moral. A recorrente pediu ainda a redução do valor arbitrado na sentença, caso fosse mantida a condenação.
Para a juíza Maria de Fátima Vianna Coelho, que julgou o processo na 1ª instância, não é razoável acusar empregada de ter furtado mercadoria quando, na verdade, a falha consistiu apenas na manutenção do preço em promoção para um colega de trabalho. “Muito menos razoável é o tratamento que lhe foi dispensado em razão dessa falha. Houve excesso, principalmente na desnecessária divulgação dos fatos perante os demais empregados da ré.”
Excesso comprovado
Na mesma linha, o relator do recurso no TRT (2ª instância), o desembargador federal do trabalho Luiz Antonio Lazarim, reforça que “a reclamante logrou êxito em comprovar o excesso cometido pelo empregador ao apurar a prática de simples irregularidade - utilização errada da etiqueta de preço (depoimento pessoal da Reclamada - fl. 33), o que justifica o não-retorno da obreira ao trabalho, afastando, de vez, a configuração da justa causa, por abandono de emprego.”
O relator leciona que a imputação de ato delituoso à reclamante - “roubo” de mercadoria, sem a devida prova e caracterização -, acompanhada de ameaças e constrangimentos, e com divulgação desnecessária dos fatos no ambiente de trabalho, dá ensejo à rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483, “e”, da CLT, com a condenação da reclamada ao pagamento das versas rescisórias daí decorrentes. Esse dispositivo prevê que “o empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama.”
Ao lembrar que a indenização por dano moral não tem a finalidade de enriquecer ou empobrecer as partes envolvidas, nem de apagar os efeitos da lesão, mas sim de reparar os danos, o desembargador Lazarim entendeu que o valor fixado na sentença (R$ 5.740,00) “observou o princípio da razoabilidade, a extensão do dano, o grau de culpabilidade e a capacidade econômica da empresa, sendo suficiente para atingir o efeito pedagógico da condenação. (1255-2007-114-ROPS)
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