Filhos de trabalhador acidentado, falecido no curso de ação trabalhista, terão direito a indenização
Por José Francisco Turco
A 4ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, que tem sede em Campinas, manteve sentença da Vara do Trabalho de Lins, legitimando os herdeiros de trabalhador rural falecido durante o andamento de ação indenizatória a prosseguirem como partes no feito. O colegiado também não alterou a decisão da 1ª Instância, que deferiu ao autor indenização por danos materiais na forma de pensão, além de indenizações por danos estéticos, arbitrada em R$ 50 mil, e por danos morais, fixada em outros R$ 40 mil. O trabalhador perdeu mão e antebraço esquerdos enquanto operava em máquina trituradeira de cana-de-açúcar. O acórdão, além de considerar “flagrante a legitimação dos herdeiros, por sucessão processual, ao recebimento das indenizações por danos morais e materiais”, refutou a tese de intransmissibilidade dos direitos ao espólio, apresentada pelo empregador.
A ação, ajuizada na Justiça Comum em outubro de 2003, foi remetida ao Judiciário Trabalhista em março de 2006, logo após a ampliação da competência da Justiça especializada, que passou a julgar os acidentes de trabalho. No recurso, a empresa agropecuária alegou, preliminarmente, que as indenizações deferidas ao trabalhador traduzem direito personalíssimo e intransmissível aos herdeiros. No mérito, invocou que a culpa pelo acidente coube exclusivamente ao autor, que teria agido “de modo desatento, descuidado, conquanto fosse experiente na função”. Sustentou ainda que a máquina era segura e que foram fornecidos ao trabalhador equipamentos de proteção individuais (EPIs) suficientes à função. Alegou que o autor tinha antecedentes de embriaguez habitual e que, por isso, seria presumível ter ele procedido de forma insegura, entre outros argumentos.
Para a relatora do acórdão no Tribunal, a juíza convocada Olga Regiane Pilegis, é incompreensível a alegação do empregador de que, com o falecimento da vítima, a demanda tenha “perdido objeto” em relação ao pensionamento, “notadamente se a sentença determinou que a indenização por danos materiais fique ‘limitada à data de 05/02/06, quando o reclamante veio a falecer’” . Para a magistrada, a recorrente confunde perda de objeto com a limitação temporal da obrigação de indenizar, o que não se justifica. “E se o pleito é de pensão vitalícia, não havendo deferimento indenizatório para além do evento morte, não se justifica o inconformismo, no aspecto.”
Quanto à alegada “intransmissibilidade de direitos personalíssimos”, a relatora entendeu que é flagrante a legitimação dos herdeiros, por sucessão processual, ao recebimento das indenizações, “inclusive no aspecto do alegado dano moral, consoante regras contidas nos artigos 943 do Código Civil/2002 e 43 do Código de Processo Civil, matéria inclusive há muito pacificada na jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça”, fundamentou a relatora.
Culpa do trabalhador
Na avaliação da relatora, não há como presumir, das advertências anteriores, ou mesmo da certidão de óbito em que consta “alcoolismo crônico”, que no momento do acidente o trabalhador estivesse embriagado, “pois sendo fato invocado como impeditivo do direito reparatório (artigo 333-II CPC), cabia à reclamada a prova cabal e inconteste da alegada condição, do que não se desvencilhou, sequer minimamente”. Olga reforça que as três testemunhas convidadas pela empresa não presenciaram o acidente e não mencionaram que o autor estivesse alcoolizado. Já a testemunha do reclamante, exatamente o parceiro do trabalhador no dia do acidente, declarou que ele não aparentava ter bebido no dia do acidente, que ocorreu antes do almoço. “Demais disso, era dever da ré impedir que seus funcionários trabalhassem em suposto estado de embriaguez”, complementou.
“No momento do infortúnio, o reclamante utilizava vestimenta inadequada (camisa de manga longa) e a máquina operada (trituradeira) não dispunha do imprescindível botão de parada, que pudesse ser facilmente acionado pelos próprios ajudantes. Em caso de emergência, apenas se poderia parar a trituradeira por meio do desligamento do próprio trator, o que contraria manifestamente a previsão do item 12.2.1 da NR-12 (Portaria 3.214/78), caracterizando, portanto, condição insegura do labor”, acrescentou a relatora
Para Olga, o artigo 157 da CLT “é de clareza solar” ao determinar que as empresas cumpram e façam cumprir normas de segurança e medicina do trabalho, instruindo os empregados quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes de trabalho ou doenças ocupacionais. Segundo ela, há nas relações de emprego cláusula implícita conhecida por obrigação de custódia ou cláusula de incolumidade. “Se a ré optou por descumpri-la, deixando de dotar o equipamento dos anteparos e sistemas de segurança legalmente exigidos, além de não exigir o uso de vestimenta adequada e compatível com os conhecidos riscos da máquina trituradeira, incorreu em culpa, sem dúvida, pois não observou a sua obrigação de “reduzir os riscos inerentes ao trabalho”, a teor do artigo 7º, inciso XXII da Lei Maior”. (Processo 0066200-48.2006.5.15.0062 RO)
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