Almirante Negro: TRT abre a mostra João Cândido e a Luta pelos Direitos Humanos
Por Patrícia Campos de Sousa e Ana Claudia de Siqueira
Cerca de 60 pessoas, entre magistrados, advogados e servidores, compareceram na tarde desta terça-feira (16/8) à vernissagem da exposição itinerante “João Cândido e a Luta pelos Direitos Humanos”, instalada no Espaço Cultural do TRT da 15ª Região, no 1º andar do edifício-sede da Corte, em Campinas. Composta por 16 painéis ilustrados, que retratam a vida e a luta do “Almirante Negro” pela melhoria das condições de trabalho na Marinha brasileira no início do século XX – episódio que ficou conhecido como a Revolta da Chibata –, a mostra, idealizada em 2008 pela Fundação Banco do Brasil, em parceria com a Associação Cultural do Arquivo Nacional, visa resgatar o debate de temas ligados à sociedade da época, como escravidão, monocultura e latifúndio, e que ainda produzem reflexos no Brasil de hoje. Com entrada franca, a exposição pode ser vista até 16 de setembro, de segunda a sexta-feira, das 12 às 18 horas. O espaço também poderá ser visitado aos sábados, das 10 às 18, e aos domingos, das 14 às 18.
A mostra já percorreu diversos municípios brasileiros e integra o Projeto Memória, desenvolvido desde 1997 pela Fundação Banco do Brasil e, mais recentemente, também pela Petrobras, para “resgatar e difundir o pensamento, a obra e os fatos marcantes da história de personalidades que contribuíram para a transformação social e a construção da cultura brasileira”. Além da exposição, que deverá passar por mais de 800 municípios, o Projeto inclui a produção de um livro fotobiográfico e de um documentário em vídeo, distribuídos a mais de 5 mil bibliotecas, bem como de um conjunto pedagógico composto de um almanaque histórico, um livro de consulta do professor e um DVD, dirigidos a cerca de 18 mil escolas públicas, em todos os estados brasileiros. Já foram tema do Projeto, entre outros, o poeta Castro Alves, o escritor Monteiro Lobato, o jurista Rui Barbosa, o navegante Pedro Álvares Cabral, o ex-presidente da República Juscelino Kubitschek, o sanitarista Oswaldo Cruz, o sociólogo Josué de Castro e o educador Paulo Freire.
Parceria cultural
A coordenadora do Espaço Cultural do TRT, desembargadora Mariane Khayat, e o superintendente regional de Governo do Banco do Brasil, Jocil José Centanin (3º à dir.), com outros diretores do BB, na abertura da mostra
Em nome da Fundação Banco do Brasil e do próprio Banco, o superintendente regional de Governo do BB, Jocil José Centanin, agradeceu ao TRT pela parceria, em especial à coordenadora do Espaço Cultural da Corte, desembargadora Mariane Khayat, pelo empenho na viabilização do evento. Centanin ressaltou que, assim como João Cândido, o Tribunal da 15ª também “conquistou seu lugar na luta pela justiça e pelos direitos humanos”.
O presidente do Tribunal, desembargador Renato Buratto, também fez uso da palavra para parabenizar o Banco do Brasil, “nosso parceiro de todas as horas”, pelo “belíssimo trabalho de fomento cultural que vem realizando com as iniciativas da sua fundação”. O magistrado enalteceu o resgate da importância da Revolta da Chibata para a evolução da sociedade brasileira do início do século XX, assim como para o banimento das condições de trabalho degradantes, quase escravagistas, praticadas nos navios da marinha de então. “Apesar de seu triste fim, João Cândido escreveu seu capítulo na história recente do Brasil com o destemor que só os heróis natos possuem. Agora, sua trajetória de luta social é trazida à nossa reflexão por esta exposição, vindo ao encontro dos propósitos da Justiça do Trabalho brasileira, que comemora seus 70 anos de profícua existência, sempre atuando em prol da pacificação social e da valorização dos direitos da pessoa humana.” Buratto também fez questão de agradecer à desembargadora Mariane Khayat, pela dedicação, e ao Serviço de Comunicação Social da Corte, pelo êxito na organização do evento.
João Cândido, símbolo da luta pelos direitos humanos
O brasileiro João Cândido Felisberto, o Almirante Negro – eternizado no samba “O Mestre-Sala dos Mares”, de João Bosco e Aldir Blanc –, foi um dos líderes de um importante movimento pelos direitos humanos, conhecido como Revolta da Chibata. A luta teve como palco a Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, onde os encouraçados “Minas Gerais”, “São Paulo” e “Deodoro” e o cruzador “Bahia” estavam ancorados para a posse do marechal Hermes da Fonseca na Presidência da República, em 1910. Os baixos soldos, as péssimas condições de trabalho nos navios e o código disciplinar em vigor, que previa a aplicação de castigos corporais, foram as principais causas da revolta, que envolveu cerca de 2 mil marinheiros, a maioria negros, sob a liderança de João Cândido e Francisco Dias Martins.
O movimento, que parou o Rio de Janeiro, teve um triste fim. Como as reivindicações não foram atendidas, os revoltosos ameaçaram bombardear a cidade, mas com a aprovação, pelo Congresso Nacional, da abolição da chibata e da concessão de anistia aos revoltosos, os marinheiros decidiram encerrar o levante. O governo e as autoridades militares, no entanto, não cumpriram o acordo, prendendo e castigando os marujos, que se rebelaram novamente. A reação do governo foi bárbara: o massacre dos rebeldes na Ilha das Cobras. Os que não morreram foram presos e enviados ao Acre para a construção da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré.
João Cândido sobreviveu. Ele foi expulso da corporação e internado em um hospital para loucos. Acabou sendo solto alguns anos depois, tuberculoso. Durante o resto de sua vida, trabalhou como vendedor de peixes no mercado do Rio de Janeiro, onde morreu, sem patente e na miséria, em 1969, aos 89 anos de idade. Em 2008, a Lei nº 11.756 concedeu anistia post mortem a João Cândido e aos demais participantes da Revolta da Chibata, restaurando o que lhes havia sido assegurado pelo Decreto nº 2.280, de 25 de novembro de 1910.
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