Câmara mantém penhora sobre imóvel qualificado como bem de família pelos sócios da empresa executada
Por Ademar Lopes Junior
A penhora recaiu sobre o imóvel de propriedade dos quatro sócios de uma empresa executada, após várias tentativas frustradas de penhora ao longo dos anos em que se arrasta a execução. Inconformados com a decisão da Vara do Trabalho de Amparo – que julgou improcedentes os embargos à penhora –, mas sem mencionar a existência de outros bens livres e desembaraçados que pudessem suportar o valor da execução, os sócios interpuseram agravo de petição, sob o argumento de que “o imóvel penhorado foi doado muito antes da propositura da ação trabalhista que originou a presente execução, além de ser anterior à desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada”. Segundo os sócios, a doação decorreu de formal de partilha iniciado em 28 de julho de 1999. Em sua defesa, alegaram ainda que “o imóvel constitui único bem da família, onde residem todos os familiares, sendo, portanto, impenhorável” e que “não houve fraude contra credores e que o imóvel em questão é indivisível”. E sustentaram que, “com a decretação de falência da empresa, devem ser suspensas todas as ações e execuções contra a falida, com a promoção pelo exequente de sua habilitação junto ao Juízo Universal”.
O exequente alegou “preliminar de não conhecimento do agravo por inobservância do artigo 897, parágrafo 1º, da CLT, bem como por irregularidade de representação processual”, e pediu, ainda, a condenação dos agravantes às penas por litigância de má-fé.
O relator do acórdão da 7ª Câmara do TRT, desembargador Fabio Grasselli, rejeitou a tese de litigância de má-fé, por não vislumbrar nenhuma das hipóteses do artigo 17 do Código de Processo Civil (CPC) no comportamento dos executados. Porém, contrariando a tese de que a falência da empresa acarreta a suspensão da execução, reconheceu a despersonalização da pessoa jurídica determinada pelo juízo de 1ª instância e o prosseguimento da execução em face dos sócios, “de forma que o patrimônio desses é que passou a ser objeto da execução”.
A cópia do Registro Geral referente à matrícula no Cartório de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Amparo revela que os quatro sócios da empresa executada adquiriram a propriedade do imóvel formalmente em 11 de abril de 2002, sendo que em 29 de dezembro de 2003 o bem foi transferido por doação aos seus filhos, todos menores impúberes, consignando-se no registro da escritura o direito de usufruto vitalício sobre o imóvel, bem como as cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade.
O acórdão reconheceu como verdade que “a doação levada a efeito ocorreu em data anterior ao ajuizamento da reclamação trabalhista que originou a presente execução, proposta em 29 de abril de 2004”. Porém, afirmou que “tal fato, por si só, não torna lícito o ato jurídico praticado”, isso porque o reclamante trabalhou para a empresa de que são sócios os agravantes no período de janeiro de 2002 a fevereiro de 2004, “sendo que a partir de agosto de 2003 (e, portanto, antes da doação do imóvel), o empregador já vinha atrasando os salários dos trabalhadores, alegando dificuldades financeiras, ressaltando-se que alguns meses de salário e as verbas rescisórias foram pagos com cheques sem provisão de fundos”. Além disso, o acórdão também salientou que “a realização da doação por parte dos sócios da empresa executada se deu em prol dos seus filhos, menores impúberes, evidenciando que a finalidade do ato foi a preservação do patrimônio em detrimento de créditos de terceiros, mesmo porque, na época, os sócios já sabiam das dificuldades econômicas do empreendimento”.
A tentativa de se resguardar o patrimônio não impediu que o acórdão concluísse pela “fraude à execução ou contra credores”, ainda que ocorridos antes do ajuizamento da ação trabalhista ou do próprio redirecionamento da execução para os sócios proprietários da empresa executada. A decisão colegiada destacou que “as cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade inseridas na doação são inócuas, já que o próprio ato ou negócio é ineficaz”.
A 7ª Câmara também afastou a tese de que o imóvel penhorado fosse “bem de família” e ressaltou que a proteção dada pela lei “não pode ir além dos bens necessários a uma vida digna, não compreendendo a propriedade de grande extensão, que refoge aos padrões normais”. No caso, o imóvel é um sítio com 3,98 alqueires, em Monte Alegre do Sul. No local, funcionou a empresa por longo tempo, e ali também moram dois dos quatro sócios, com suas respectivas famílias. O oficial de justiça avaliador constatou que “o imóvel é ocupado com empreendimentos comerciais (loja de materiais de decoração e elétricos instalada onde antes funcionava a empresa executada, bem como outras duas locações em barracões na parte de trás), além de três casas onde residem o pai dos sócios e estes, com os familiares, sem contar uma pequena área cultivada com eucaliptos”.
O acórdão destacou que “pela dimensão do terreno, vê-se que a impenhorabilidade absoluta extrapolaria o objetivo da lei, que foi assegurar à unidade familiar a residência em bem próprio, pondo-o a salvo da penhora. Em relação ao imóvel rural, o legislador permite a penhora, afastando-a apenas quanto à sede de moradia (Lei nº 8.009/1990, artigo 4º, parágrafo 2º)”. E por isso concluiu que “resguardadas as residências familiares, nada impede que a penhora recaia sobre a parte remanescente do imóvel, com ampla possibilidade de ser desmembrado”, lembrando que a constrição realizada “incide sobre fração de 1/100 (um centésimo) do imóvel e recai sobre parte do edifício fabril (terreno e edificações) nele existente”, conforme detalhado no auto de penhora. E, por isso, negou provimento ao agravo. (Processo 0057600-15.2004.5.15.0060)
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