Funcionário de funerária acusado de apropriação indébita não será indenizado
Por Ademar Lopes Junior
O reclamante trabalhou para uma funerária, em Palmital, de primeiro de agosto de 1993 a 21 de maio de 1994, mas foi demitido por justa causa, acusado de apropriação indébita durante o trabalho. Sua função era de cobrador de prestações de plano funerário, e segundo a empresa, em depoimento na Delegacia de Polícia, nos 20 dias anteriores ele vinha recebendo de associados e não efetuava os repasses dos valores recebidos à empresa, a titular dos créditos. Além disso, ainda segundo a empresa, o trabalhador teria se apropriado indevidamente de “um televisor branco/preto, cinco polegadas; e um capacete de motocicleta”. Por ter sofrido danos materiais e morais, o trabalhador procurou na Justiça a condenação da reclamada.
A ação correu no Juízo Cível, e em grau de recurso, o Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu a incompetência do Juízo Cível e determinou a remessa dos autos à Justiça do Trabalho. A 1ª Vara do Trabalho de Assis, para onde foi distribuída a ação, encaminhou os autos ao Tribunal Regional do Trabalho para conhecimento e julgamento do recurso, tendo o Tribunal suscitado conflito negativo de competência. Foi o Superior Tribunal de Justiça que reconheceu a competência do Juízo Trabalhista, porque “tanto a causa de pedir quanto o pedido iniciais decorriam de estrita relação empregatícia, cujos fatos alegados teriam surgido no âmbito dessa relação, determinando a anulação da sentença proferida pelo Juízo Cível e a remessa dos autos para prolação de nova decisão”.
A sentença reconheceu a competência material para conhecer e julgar a ação, porém destacou que “o prazo prescricional previsto no art. 7º, XXIX, da CF, estabelece prazo de cinco anos até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho”. A ação foi ajuizada em 25 de fevereiro de 1999, ou seja, “mais de dois anos da data do início da fluência do prazo prescricional”, e a sentença lembrou que “a prescrição, por tratar-se de norma de ordem pública, portanto cogente, tem por escopo impor segurança jurídica aos jurisdicionados e à própria sociedade, motivo pelo qual, no direito processual hodierno, é cognoscível de ofício, nos moldes do art. 219, § 5º, do CPC (com redação dada pela Lei nº 11.280/2006), de aplicação subsidiária ao processo laboral, com permissivo no art. 769, da CLT”. E por isso reconheceu de ofício a prescrição da pretensão formulada na inicial, “uma vez que a ação foi ajuizada após o decurso do biênio constitucional”, e julgou extinto o processo com resolução de mérito.
O reclamante, inconformado com a decisão de primeira instância, recorreu. Ele pede que “seja afastado o decreto de prescrição e deferido o pedido de indenização por danos morais e materiais”.
A relatora do acórdão da 2ª Câmara do TRT, desembargadora Mariane Khayat, divergiu do entendimento do Juízo de primeira instância, e ressaltou que o entendimento prevalecente na 2ª Câmara, é “no sentido de que é inaplicável ao processo do trabalho o disposto no artigo 219, § 5, do Código de Processo Civil”, e portanto, assim, “seria incabível o reconhecimento da prescrição de ofício na seara trabalhista”.
O acórdão salientou o andamento do processo, desde o ajuizamento da ação na Justiça Comum em fevereiro de 1999, passando pela prolação da sentença em 16 de maio de 2000, o reconhecimento pelo Tribunal de Justiça da incompetência da Justiça Comum em julgar o feito, em 12 de agosto de 2005, em face da edição da Emenda Constitucional 45/04, até ser o processo remetido à Justiça do Trabalho. O acórdão ressaltou que, apesar de reconhecer que “cabe à Justiça do Trabalho julgar e apreciar as demandas que envolvem indenização por danos morais decorrentes da relação de emprego e que a prescrição incidente, nestes casos, é a trabalhista, não pode ignorar que, quando da dispensa do reclamante (21/5/1994), este posicionamento não era pacífico”, e que “a competência somente veio a ser definida, de forma explícita, com a edição da EC 45/04”.
Por isso, a decisão colegiada reconheceu, “em face do princípio da segurança jurídica” que “o prazo prescricional aplicável ao caso é o de vinte anos, previsto no artigo 177 daquele diploma legal”, uma vez que a ação foi ajuizada “na vigência do Código Civil de 1916”. E reformou, por isso, a decisão de origem, “para afastar a prescrição decretada”, apoiando-se em ementa do Tribunal Superior do Trabalho, na mesma linha de entendimento: “o marco temporal a partir do qual será considerada aplicável a prescrição trabalhista à pretensão de indenização por danos morais decorrentes da relação de emprego será a data da promulgação da Emenda Constitucional nº 45, ou seja, 31/12/2004. No caso, infere-se do acórdão regional, que a lesão ocorreu antes da promulgação da referida emenda constitucional, não incidindo, portanto, a prescrição trabalhista, mas a cível” (Processo: RR - 279240-16.2003.5.02.0019 Data de Julgamento: 2/3/2011, Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 18/3/2011).
No que tange aos danos morais e materiais pedidos pelo trabalhador acusado de crime, o acórdão destacou que o autor foi absolvido na esfera criminal “por ausência de provas”, e que, segundo o autor, “a atitude da empregadora, de acusá-lo de se apropriar dos valores recebidos dos associados, não é verdadeira e lesou a sua honra e imagem”. Também ressaltou que, segundo a reclamada, esta “não agiu de má-fé e apenas exerceu o seu direito de solicitar a averiguação de eventual delito de apropriação indevida”. A empresa afirmou que “havia vários indícios de que o autor praticou o crime”.
O acórdão salientou que “o fato de ter sido reconhecida a dispensa imotivada ou de ter sido noticiado o suposto crime à autoridade policial, por si só, não confere ao autor o direito de receber as indenizações postuladas”, e acrescentou que “o mesmo se diga em relação à absolvição no processo crime com base no artigo 386, VI do CPP”, e afirmou que para que as indenizações sejam devidas, “faz-se necessária a comprovação de que a reclamada agiu com má-fé”. Porém, a decisão colegiada não vislumbrou “má-fé ou abuso da reclamada no caso”.
A decisão se baseou também em informação de testemunha, de que “efetuou o pagamento da mensalidade ao reclamante, o qual não lhe forneceu recibo”, além disso, “posteriormente outro cobrador compareceu em sua residência, a fim de receber a mensalidade, ocasião em que comunicou que o valor já havia sido pago”. Outras três testemunhas confirmaram essa versão, e “embora não soubessem dizer o nome do cobrador, puderam descrevê-lo”. Mas o trabalhador continuou negando os fatos em juízo.
O acórdão então conclui que “não há elementos que permitam a inferência de intenção deliberada da reclamada de prejudicar o reclamante ao comunicar à autoridade policial o suposto crime”, nem vislumbrou a existência de culpa grave, já que “se baseou nos fatos que lhe foram relatados pelos associados e na constatação de que parte dos valores não lhe foram efetivamente repassados”. E por isso, considerou que “não há falar em indenização por danos morais e materiais”. (Processo 0054200-94.2006.5.15.0036)
- 75 visualizações