Mantida concessão de tutela antecipada a idoso em ação movida contra a Fazenda Pública de São Paulo
Por Luiz Manoel Guimarães
“Tratando-se de cidadãos enquadrados legalmente como idosos, é possível a concessão de antecipação de tutela contra a Fazenda Pública para garantir a percepção imediata de verba de natureza alimentar, necessária à sua própria subsistência.” Sob essa fundamentação, a 10ª Câmara do TRT da 15ª julgou improcedente uma ação cautelar inominada movida pela Fazenda Pública do Estado de São Paulo, que pretendia a concessão de liminar para imprimir efeito suspensivo a um recurso ordinário interposto contra decisão proferida pelo juízo da 3ª Vara do Trabalho de Ribeirão Preto.
A decisão de 1ª instância concedeu a antecipação dos efeitos da tutela no sentido de que a Fazenda Pública do Estado de São Paulo, independentemente do trânsito em julgado da sentença, fizesse, no prazo de trinta dias a partir da publicação da sentença, a inclusão em folha de pagamento do valor correto da complementação de aposentadoria deferida ao reclamante, que completou 85 anos em 16 de maio passado. Na cautelar, a Fazenda invocou o artigo 2º-B da Lei nº 9.494/1997, incluído pela Medida Provisória nº 2.180-35, de 24 de agosto de 2001: “A sentença que tenha por objeto a liberação de recurso, inclusão em folha de pagamento, reclassificação, equiparação, concessão de aumento ou extensão de vantagens a servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, inclusive de suas autarquias e fundações, somente poderá ser executada após seu trânsito em julgado”. No entendimento da Fazenda, a manutenção da medida implicaria “prejuízo irreversível ao ente público”.
“Embora não se negue vigência ao dispositivo legal invocado pela requerente, é importante ressaltar que o legislador assegurou ampla proteção ao cidadão idoso, por intermédio de um feixe de normas muito abrangente, estendendo essa proteção também aos interesses que estejam sendo discutidos em juízo, a fim de garantir prioridade na solução da demanda”, ponderou, em seu voto, o relator do acórdão, desembargador Fernando da Silva Borges. Segundo o magistrado, a proteção legal garantida atualmente aos idosos do País resulta de “dois dos fundamentos da República Federativa do Brasil, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho (Constituição Federal, artigo 1º, incisos III e IV)”.
Em referência à Carta Magna e ao Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003), Borges argumentou que “o exame dessas disposições legais deixa claro que “tanto o legislador constituinte quanto o legislador ordinário pretenderam conferir à dignidade da pessoa humana maior relevância que a outros bens jurídicos tutelados pela legislação vigente, dentre os quais o risco de irreversibilidade do provimento antecipado, mesmo implicando eventual prejuízo à Fazenda Pública”.
Entre outros pontos, lecionou o relator, o Estatuto do Idoso estabelece, no artigo 3º, que é “obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária”. Conforme o artigo 71 do Estatuto, relacionou o desembargador, “é assegurada prioridade na tramitação dos processos e procedimentos e na execução dos atos e diligências judiciais em que figure como parte ou interveniente pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, em qualquer instância”. Borges baseou-se ainda no artigo 83, parágrafo 1º, da Lei 10.741: “Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, na forma do artigo 273 do Código de Processo Civil”.
Sobre o disposto no artigo 2º-B da Lei nº 9.494/1997, o relator argumentou que o intérprete da lei não pode ignorar “todas as normas jurídicas de proteção ao idoso, mesmo porque qualquer dispositivo legal deve ser interpretado de forma sistemática com o conjunto da legislação que integra o ordenamento jurídico de um Estado, não podendo ser considerado como uma norma totalmente autônoma”. Borges salientou ainda que é entendimento pacificado pela jurisprudência que o artigo “deve ser interpretado restritivamente, resultando daí que a vedação quanto à concessão da antecipação dos efeitos da tutela deve ficar limitada às hipóteses ali expressamente indicadas”.
Dessa forma, somadas a idade avançada do aposentado e a natureza alimentar do benefício deferido na sentença de 1ª instância, o relator decidiu pela rejeição da medida cautelar ajuizada pela Fazenda Pública, “ficando mantida a antecipação da tutela jurisdicional concedida na origem”, entendimento no qual foi seguido unanimemente pelos demais componentes da Câmara. (Processo nº 0000634-71.2011.5.15.0000)
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