Mantida justa causa de trabalhadora acusada de se apropriar de R$ 2 mil de banco
Câmara também manteve o reconhecimento de vínculo empregatício entre o banco e a reclamante, que, contratada como estagiária, trabalhava como se empregada fosse
Por Ademar Lopes Junior
A trabalhadora ainda era estudante e cursava Administração de Empresas quando foi contratada como estagiária por um grande banco de origem europeia, e ela trabalhou nessa condição de 1º de março de 2002 a 7 de abril de 2004. Segundo ela, a contratação era “disfarçada”, pois as atividades e os horários estabelecidos nos Acordos de Cooperação e Termo de Compromisso de Estágio não foram respeitados, e a trabalhadora exercia, na verdade, atividades iguais e com as mesmas responsabilidades dos empregados do banco, inclusive cumprindo metas de vendas de produtos. Para desenvolver seu trabalho, a reclamante tinha duas senhas, sendo uma equivalente ao cargo de escriturário, e outra, ao de supervisor. A jornada, segundo ela, era superior a oito horas diárias. Ela mesma era quem respondia o questionário encaminhado pelo Centro de Integração Empresa-Escola e referente à avaliação do próprio estágio, uma vez que não havia um gestor do estágio (seu supervisor havia falecido).
Porém, a trabalhadora foi demitida por justa causa em 13 de setembro de 2006, sem ter ciência do motivo que ensejou a demissão motivada. Alega apenas que “nunca cometeu qualquer ato que a desabonasse, todavia, supõe que tenha sido demitida em razão de uma diferença de caixa que lhe fora atribuída”. Por conta disso, acredita, “foi coagida a assinar um Termo de Confissão de Dívida, sob a ameaça de que, se não o fizesse, poderia perder o emprego”. Mesmo tendo assinado o documento, foi surpreendida com a demissão por justa causa.
O banco contou história diferente. Segundo sua versão, a reclamante foi demitida por justa causa por ter cometido falta grave por ela mesma confessada, ou seja, a subtração da importância de R$ 2 mil da agência onde trabalhava, ato detectado após regular auditoria interna. Informou ainda que “a reclamante não sofreu qualquer coação para assinar o Termo de Confissão de Dívida, tanto que devolveu integralmente o valor ao reclamado”. Quanto à alegação do contrato “disfarçado”, o banco ratificou que a reclamante trabalhou, durante o período indicado, como estagiária e que “não há exigência legal de que as atividades desenvolvidas pelo estagiário sejam vinculadas às disciplinas da grade curricular da faculdade”. Sustentou também que “o estágio da autora era supervisionado”. Apesar de ter negado a relação de emprego no período indicado, o banco admitiu a prestação de serviços sob outras características.
A sentença da Vara do Trabalho de Presidente Venceslau concluiu que “o contrato de estágio que existiu entre as partes perdeu seu valor, já que o reclamado não se desincumbiu do ônus de provar que as funções desenvolvidas pela reclamante eram típicas de estagiária”. E acrescentou que “longe disso, o que restou claro foi que a autora atuava como empregada do reclamado, no caso como uma autêntica escriturária, conforme afirmaram as testemunhas” e “tendo em conta que restou efetivamente comprovado nos autos que a reclamante desempenhava atividades que excediam em muito àquelas indicadas como compatíveis com os objetivos educacionais e de aprendizagem do estágio”.
Quanto à justa causa, o juízo de primeiro grau entendeu que “a reclamante não conseguiu provar a ocorrência de algum vício de consentimento quando da formalização e assinatura do Termo de Confissão de Dívida” e ressaltou o fato incontroverso de que “desapareceu” numerário de propriedade do banco, que se encontrava sob a guarda da autora, o que, no seu entendimento, “por si só já bastaria para a responsabilização da obreira”. Em conclusão, julgou parcialmente procedentes os pedidos da trabalhadora, reconhecendo apenas o vínculo de emprego entre as partes no período de 1º de março de 2002 a 7 de abril de 2004 e condenando o banco ao pagamento de verbas.
Da sentença, contudo, ambas as partes recorreram. O banco, sob o argumento de falha na sentença, na qual foi reconhecido o vínculo empregatício. A reclamante pediu a reversão da justa causa, lembrando que “a apuração do fato justificador da dispensa decorreu de modo arbitrário, sem o devido processo legal, com cerceio da defesa e do contraditório”. Ela também ressaltou que “não foi provada a apropriação indébita” e que “o Termo de Confissão de Dívida não é confissão da falta imputada, pois o documento foi emitido pelo banco, tendo sido assinado pela reclamante sob a ameaça da perda do emprego e ação criminal”.
O relator do acórdão da 8ª Câmara do TRT, desembargador Flavio Allegretti de Campos Cooper, considerou que, diante da “clareza da prova oral, pela qual foi suficientemente demonstrada a desvirtuação do termo de compromisso de estágio, correto o reconhecimento do vínculo empregatício”. Quanto ao pedido da trabalhadora sobre a reversão da justa causa, o acórdão lembrou que a sentença de primeiro grau validou a confissão da autora de que ela teria se apropriado da importância de R$ 2 mil, ficando o banco credor de tal importância, sendo instaurado inquérito policial. Também ressaltou que a absolvição no Juízo Criminal por falta de provas (sentença superveniente), significa que “na esfera criminal a reclamante foi absolvida do crime de apropriação indébita, mas os fatos que ensejaram a perda da confiança do empregador permanecem (CCB, artigo 935; CPP, artigo 66), em face da prova produzida na instrução trabalhista”. Com isso, o acórdão reconheceu que ficou mantida a justa causa e concluiu em negar provimento ao recurso do reclamado e dar parcial provimento ao recurso adesivo da reclamante, apenas “para acrescer à condenação o pagamento de horas extras e reflexos no período de 8 de abril de 2005 a 13 de setembro de 2006”. (Processo 0088100-05.2006.5.15.0057)
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