Ciclo de palestras marca as comemorações dos 50 anos da Justiça do Trabalho em Araraquara

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Por Ana Claudia de Siqueira

 

Exatamente meio século depois da inauguração da chamada Junta de Conciliação e Julgamento de Araraquara, grandes nomes do pensamento jurídico se reuniram diante de uma platéia de mais de 700 pessoas – entre universitários, servidores e operadores do Direito – para disseminar conhecimento. O 9º Ciclo Regional de Palestras de Direito do Trabalho, promovido pela organização não governamental BemDireito com apoio da Escola Judicial do TRT da 15ª Região, teve início na noite de sexta-feira, dia 9 de novembro, data de aniversário da instalação da Justiça do Trabalho no município. Prestigiada pelo prefeito Marcelo Barbieri, pelo presidente da Câmara, Aluísio Augusto Braz, e com participação da Banda da Polícia Militar de Araraquara e de cadetes do Exército, a cerimônia de abertura do evento, no Centro Internacional de Convenção "Dr. Nelson Barbieri", configurou-se em um marco comemorativo e histórico.

 

Como nos demais ciclos já realizados ao longo do ano, a edição de Araraquara objetivou arrecadar fundos para duas instituições de reconhecida utilidade pública, a Associação de Atendimento Educacional Especializado (AAEE) e a Casa Mater. Seguindo também a tradição dos ciclos, esta edição teve como presidente de honra e homenageado, o corregedor regional do TRT da 15ª Região, desembargador Luiz Antonio Lazarim, natural do município.

 

Em seu pronunciamento inaugural, o presidente do TRT, desembargador Renato Buratto, elogiou a iniciativa capitaneada pela Ong BemDireito, que busca difundir o conhecimento aliado à filantropia, desejando sucesso às instituições beneficiadas. Dirigindo-se ao homenageado, Buratto destacou a sua contribuição à frente da Corregedoria Regional do TRT nos últimos dois anos, sendo um importante referencial na desmistificação de rotinas e apresentação de soluções para as tarefas cotidianas nas unidades judiciárias trabalhistas. "Parabenizo publicamente o desembargador Lazarim por sua trajetória profissional e por seu incansável espírito inovador", salientou.

 

Incumbida de prestar homenagem ao corregedor, a desembargadora Antonia Regina Tancini Pestana, da 6ª Câmara da Corte, saudou Lazarim como "o nosso médico", dono de rara sensibilidade, que sempre passou a receita certa a cada litígio. "Brilhante como sempre, sua posologia é na medida certa, afinadíssimas com o Direito". Lazarim nasceu em 1946 na antiga Usina Tamoio, na qual, ainda menino, começou a trabalhar como cortador de cana. "Posso compará-lo a uma flor do campo, a qual nasce na adversidade, e contrariando todos os prognósticos, floresce bela e forte, e ali, vive e resiste ao tempo, à chuva, ao sol, que lhe arde em cada verão, mas mesmo assim, não desiste". A desembargadora Antonia esmiuçou a história de vida de Lazarim, do garoto que gostava de futebol e era apelidado de Pelé, dos estudos do Direito na Universidade Metodista de Piracicaba até chegar ao posto de desembargador e corregedor da 15ª.

 

Extremamente emocionado, Lazarim agradeceu a todos pela homenagem e lembrou com carinho da Usina Tamoio, "uma cidade dentro de Araraquara". Recordou-se também de sua primeira atuação como advogado no município, em 1975, e fez um agradecimento especial aos servidores que trabalham com ele, citando Maria Helena Tonon, que, com muita sabedoria, o auxilia nas contendas diárias. Ao resgatar a história dos 50 anos de Justiça do Trabalho em Araraquara, o juiz titular da 2ª Vara do Trabalho e diretor do Fórum Trabalhista, José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva, também enfatizou a dedicação e o comprometimento de Lazarim com a efetividade da Justiça.

 

Palestra de Abertura: "Dignidade humana no contexto das relações trabalhistas"

 

 

Quais as leis que regiam o trabalho há 130 anos, ali exatamente naquela província do interior de São Paulo, que ora comemora 50 anos da Justiça do Trabalho? A cor da pele, referindo-se as condições do negro diante da aristocracia branca e ao regime de escravidão, em que um pedaço de papel – a carta de alforria – concedia-lhe o direito de ir e vir. Com estas indagações, o professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) Alysson Leandro Mascaro, livre-docente em Filosofia e Teoria-Geral do Direito, contextualizou historicamente as relações de trabalho e a dignidade humana, instigando os participantes à reflexão sobre o tema. Apresentado à platéia pelo diretor da Escola Judicial do TRT, desembargador Samuel Hugo Lima, Mascaro citou o princípio do justopositivismo, em que a dignidade humana está na lei posta. "Mas a dignidade humana não se esgota na lei. É muito maior do que isso. É preciso ser existencialmente vivida". Para Mascaro, a construção de uma sociedade digna é tão possível quanto não é necessário gastar hum bilhão de dólares com armamento, quantia que poderia pôr fim à fome no mundo.

 

Audiência é o ato mais importante do processo

 

 

No sábado, dia 10, a programação teve sequência com a palestra do advogado e professor universitário Gerson Shiguemori que discorreu sobre os "Aspectos práticos da advocacia trabalhista". De forma descontraída e divertida, Shiguemori expôs algumas situações vivenciadas em seu dia a dia de trabalho, fornecendo diversas dicas profissionais aos futuros bacharéis de Direito. "A audiência é o ato mais importante do processo trabalhista em que uma única palavra proferida pode resolver o caso", sentenciou com o exemplo de uma ação, cuja natureza envolvia vínculo empregatício, que foi julgada improcedente após o reclamante dizer ao juiz que era autônomo. Shiguemori finalizou a explanação, reforçando que o segredo do sucesso está em lançar mão de estratégias e proceder sempre dentro da ética, da lei e da moral.

 

Saúde do Trabalhador

 

 

Ao dar início ao Painel "Saúde do Trabalhador" o desembargador Flavio Allegretti de Campos Cooper, eleito presidente do TRT da 15ª para os próximos dois anos, fez questão de deixar uma mensagem aos participantes. "Sonhem e sonhem alto porque os sonhos são realizáveis. Nosso homenageado, desembargador Lazarim é um grande exemplo disso", verbalizou. Com a participação do procurador do trabalho Rafael de Araújo Gomes, o fisiologista Turíbio Leite Barros Neto e do juiz José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva, os participantes do ciclo puderam visualizar um amplo panorama, abrangendo três óticas diferentes, sobre a saúde do trabalhador.

 

Gomes discorreu sobre "A fiscalização das relações do trabalho e a saúde do trabalhador". Segundo ele, o Brasil possui normas excelentes e avançadas de saúde e segurança no trabalho, elaboradas de forma tripartite, com colaboração do setor patronal, sindicatos e governo. Porém, os índices de acidentes de trabalho, inclusive com casos fatais, aumentaram em 2011. Para o procurador, este cenário deve-se a três fatores: falta de investimento no cumprimento de normas de saúde e segurança, que é alto; não há cumprimento sem fiscalização constante e a inspeção está sucateada. "Há uma tendência de que estas profissões especializadas na área de saúde e segurança do trabalho desapareçam nos próximos anos", assinalou.

 

Turíbio Leite Barros Neto, graduado em Biomedicina pela Universidade Federal de São Paulo, apresentou o primeiro trabalho experimental com uso da chamada ergoespirometria, para aferir "in loco" a intensidade do exercício praticado pelos cortadores e plantadores de cana de açúcar. A palestra intitulada, "Esforços físicos na atividade laboral – aspectos físicos e metabólicos", demonstrou os parâmetros analisados, com a medição do metabolismo energético através de trocas gasosas respiratórias e monitoramento da frequência cardíaca. O estudo, envolvendo 15 cortadores de faixa etária entre 19 e 53 anos de sexo masculino, e 15 plantadores entre 21 e 42 anos, de ambos os sexos, concluiu que todos apresentaram uma boa tolerância, sem acúmulo de ácido lático (causador de desconforto e ofegância, a partir do esforço intenso dos músculos).

 

O juiz José Antônio, mestre em Direito Obrigatorial Público e Privado pela Faculdade de Direito da Universidade Estadual Paulista (UNESP) e doutor em Direito Social pela Universidad Castilla-La Mancha (UCLM) da Espanha, abordou a saúde do trabalhador como direito humano. Com o tema "Os reflexos das jornadas de trabalho extensas na saúde do trabalhador", José Antônio propôs uma viagem no tempo, até 1919, quando foi criada a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e estipulada a jornada de 8 horas diárias, após a Primeira Guerra Mundial. O juiz estabeleceu uma co-relação entre jornadas intensas e a fadiga, em momentos históricos diferentes vivenciados pelo mundo do trabalho, da queda do muro de Berlim à flexibilização adotada pela Espanha na década de 1990 e a reprodução deste sistema no Brasil, posteriormente. Em ambos os países, há registro significativo de aumento do número de acidentes de trabalho. José Antônio encerrou sua palestra com uma reflexão acerca do trabalho. "Devemos trabalhar para viver ou viver para o trabalho?".

 

Cooper finalizou os trabalhos evidenciando as três visões erguidas em defesa da saúde do trabalhador e resumiu o painel no que chamou de 4S: Saúde, Segurança, Salário e Satisfação.

 

BemDireito

 

O evento foi prestigiado pelos desembargadores da 15ª, Olga Aida Joaquim Gomieri, Fernando da Silva Borges (eleito vice-presidente administrativo da Corte para o biênio 2012-2014), Claudinei Zapata Marques, Roberto Nobrega de Almeida Filho e Helcio Dantas Lobo Junior, além de diversos juizes de 1ª instância. No encerramento das atividades, o juiz titular da Vara do Trabalho de Taquaritinga, Sérgio Milito Barea, organizador do evento em Araraquara e o juiz titular da 1ª Vara do Trabalho de Catanduva, Wagner Ramos Quadros, criador da Ong BemDireito, apresentaram um balanço dos ciclos realizados no ano, demonstrando o sucesso da iniciativa. Foram nove edições, com a participação de mais de 5.000 pessoas e arrecadação de cerca de R$ 200 mil, destinados a diversas instituições sociais especializadas.

 

 

 

 

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Comunicação Social