Mantida condenação contra empresa acusada de ter submetido supervisora demitida a cárcere privado
Por Ademar Lopes Junior
A notícia da dispensa por justa causa veio no dia que a supervisora de departamento da locadora de carros retornou de férias, em 3 de março de 2004. Surpreendida com o fato logo ao adentrar na empresa, às 8 horas, recebeu ordem para aguardar em uma sala, sentada em uma cadeira, onde ficou até o horário de almoço. A ordem de espera veio acompanhada da expressa determinação para que “não mexesse em nada”, e na sua saída, para que “não mais retornasse”.
O tratamento vexatório dispensado à supervisora, que ganhava R$ 675 por mês, não foi contestado pela empresa no processo que a trabalhadora moveu na Justiça do Trabalho. Ela afirmou ter sido vítima de uma “armação”. Ela salientou que a empresa a expôs na presença dos funcionários, “ferindo sua honra e dignidade, expondo-a ao ridículo, manchando sua imagem, culminando por impedi-la de conseguir outro emprego”. Afirmou que com esse procedimento a reclamada atingiu sua honra, causando-lhe danos morais, além de danos materiais decorrentes da perda da renda proporcionada pelo emprego, o que implicou dificuldades financeiras e inadimplência.
Admitida em 13 de maio de 2002, como auxiliar administrativa, a autora exerceu essa função por quase um ano (até 1º de maio de 2003), e foi dispensada em 3 de março de 2004, já como supervisora de departamento.
O motivo da justa causa foi, segundo os autos, a locação pela trabalhadora de um veículo para uma empresa concorrente. A trabalhadora alegou “armação” da reclamada. O Juízo da 3ª Vara do Trabalho de Araraquara entendeu que a dispensa foi abusiva, “porquanto a ‘armação’ alegada na petição inicial restou comprovada”, e por isso julgou procedente em parte a ação, condenando a empresa a pagar as indenizações decorrentes de danos morais, no valor de R$ 37.750 (valor que representa 50 vezes o salário da trabalhadora na época da dispensa), e também danos materiais, no valor de R$ 572,93.
Em recurso, a locadora de carros alegou “não ter sido demonstrada nos autos a prática de ato ilícito ofensivo à honra e à intimidade da reclamante, capaz de ensejar a reparação deferida na origem”.
O relator do acórdão da 10ª Câmara do TRT, desembargador Fernando da Silva Borges, salientou que “o que se discute é o procedimento adotado pela empregadora para apurar a alegada falta grave cometida pela reclamante”. O acórdão ressaltou que “no âmbito das relações de trabalho a tutela da dignidade moral do trabalhador tem por finalidade impedir que os atos empresariais possam entrar em conflito com os direitos personalíssimos e com a esfera moral do empregado” e que a “existência ou não do dano moral nas relações de trabalho deve estar vinculada diretamente às situações relativas ao exercício do poder diretivo do empregador, em face dos limites da subordinação ao quais está sujeito o trabalhador”.
No caso, o acórdão reconheceu que ficou “devidamente comprovado (CPC, artigo 334, III) que a reclamante sofreu tratamento vexatório por ocasião de sua dispensa, sendo segregada em uma sala no estabelecimento da empresa, constituindo um autêntico cárcere privado, além de ter sido acusada de conduta desonrosa na presença de outros empregados”. E por ser inegável que “o procedimento praticado pela empregadora em relação à empregada ultrapassou os limites de seu poder diretivo”, causando evidente abuso e ocasionando constrangimento e sofrimento de ordem moral à reclamante, a decisão colegiada entendeu que deveria manter a condenação, porém, reduziu o valor da indenização fixado na origem em R$ 37.500 para R$ 20 mil, importância que guarda, segundo o acórdão, “prudente correspondência” com os critérios da “razoabilidade e do bom-senso, em observância à gravidade da lesão, ao grau de culpa do ofensor, à condição econômica das partes e à função pedagógica da cominação, cuja finalidade é coibir a repetição de tais procedimentos por parte do empregador, sem provocar, com isso, enriquecimento sem causa do trabalhador, mas garantindo uma compensação ao ofendido pelo sofrimento decorrente do dano causado”. (Processo 0066100-20.2006.5.15.0151)
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