Município de Pirassununga é condenado a indenizar por dano moral trabalhadora que sofre do coração
Por Ademar Lopes Junior
A 8ª Câmara do TRT negou provimento a recurso do Município de Pirassununga e, quanto ao pedido da trabalhadora, que sofria com uma cardiopatia grave e afirmou ter sido vítima de assédio moral, não só manteve a indenização decretada pela decisão de primeira instância, como também majorou de R$ 15 mil para R$ 30 mil, por entender que "o assédio moral no serviço público enseja a tríplice responsabilidade do assediador (civil, penal e administrativa)".
A sentença do juízo da Vara do Trabalho de Pirassununga, que julgou parcialmente procedentes os pedidos, não agradou a nenhuma das partes, que por isso recorreram. O Município insistiu na modificação do julgado quanto à indenização por danos morais, pois, segundo entendeu, "não houve prova do dano moral consubstanciado em perseguição por membros da administração municipal". Alegou também que "o exame admissional comprovou que a autora já era hipertensa por ocasião da admissão e que as transferências ocorreram em espaços de tempo superiores a um ano, não podendo caracterizar perseguição, nem ato ilícito".
A trabalhadora, por sua vez, insistiu que a decisão deixou de reconhecer fatos que "agravaram por demais o histórico do assédio moral praticado pelos representantes do reclamado". Afirmou também que a tutela jurisdicional "não foi atendida" e reiterou a tese inicial, para que seu pedido fosse integralmente acatado, com a majoração do valor da condenação.
A reclamante foi admitida pelo Município de Pirassununga em 21 de julho de 1993, como ajudante de serviços diversos. Segundo ela afirmou na Justiça do Trabalho, o assédio moral começou com a posse dos atuais representantes da administração municipal, mais precisamente com a nomeação do chefe da Central de Ambulância. Segundo a trabalhadora, depois que um jornal da cidade publicou informações sobre o comportamento desse funcionário, ela passou a ser transferida compulsoriamente de um setor a outro da Prefeitura, o que, segundo a autora, culminou com o agravamento de seu estado de saúde. A situação se agravou ainda mais quando ela foi transferida para a Secretaria Municipal de Cultura e Turismo, em março de 2010, quando foi designada para prestar serviços no distrito de Cachoeira das Emas, distante 9 quilômetros do centro da cidade, em "um prédio abandonado (antigo Ecomuseu), convivendo com situações de horror e de isolamento".
A trabalhadora afirmou ainda que o local não contava com água potável, e seu "deplorável banheiro público" não possuía porta. A reclamante enfatizou que o local era degradante e insalubre. Quando retornou de suas férias, em junho de 2011, foi realocada para atender telefone na Secretaria de Cultura.
A relatora do acórdão, desembargadora Erodite Ribeiro dos Santos De Biasi, ressaltou que em 19 de fevereiro de 2009 a trabalhadora solicitou mudança do local de trabalho, juntando declaração médica no sentido de que é "portadora de cardiopatia grave, com diminuição da função sistólica e com disfunção diastólica, havendo a informação de dois episódios recentes de edema agudo no pulmão! (deste modo no original), com orientação no sentido de que a paciente não pode se submeter a esforços físicos, nem stress emocional, que precipitariam novas descompensações cardíacas graves". O acórdão salientou que "em 22 de janeiro de 2009, pouco menos de um mês antes do pedido, a autora havia sido transferida para a Secretaria Municipal de Saúde, para prestar serviços no Centro de Atendimento Psicossocial (CAPS), o que lhe afligia, dado o declarado medo que ela sentia dos pacientes doentes mentais".
O médico do trabalho que solicitou informações detalhadas das atividades desempenhadas pela autora concluiu que "a servidora não poderia carregar pesos, efetuar longas caminhadas e outros esforços considerados intensos". Num segundo momento, o médico do trabalho noticiou novo relatório médico e resultados de exames, indicando o agravo da condição de saúde da postulante e atestando condições físicas para "trabalhos sentada, atender telefone e outros de mínimo esforço". Por isso, o secretário de Saúde, em 2 de junho de 2009, "no intuito de resolver o problema de forma mais ágil, sugeriu a transferência da servidora para o almoxarifado do Centro de Especialidade Médica, o que teria sido supostamente resolvido em 4 de junho de 2009".
A trabalhadora foi ainda transferida mais uma vez, agora por determinação verbal, para o Posto de Saúde Santa Fé, o que, segundo o acórdão, "se revelava incompatível com o estado de saúde da reclamante, haja vista a distância da unidade, o que retardaria eventual atendimento médico de urgência".
O acórdão ressaltou que a última transferência ocorrida, "em total discordância com as determinações médicas, revela o ápice do assédio moral empreendido, que sequer cessou com a propositura da presente ação, na qual, em defesa, o Município alega que os argumentos iniciais chegam às ‘raias do absurdo'". Segundo a defesa do Município, a própria servidora se contradiz, ao afirmar, ao mesmo tempo, que "a sua transferência ao Ecomuseu para exercer atividades não eram necessárias" e que "naquele local imperava um grande acúmulo de pó e sujeira, além do convívio com fezes de animais". O Município afirmou que "não precisa esforço de raciocínio para entender que o encaminhamento da obreira para aquele local foi justamente para que a mesma providenciasse a limpeza, aliás, sendo o seu mister dentro da Administração".
Para a 8ª Câmara, não demanda maiores raciocínios a conclusão de que "uma servidora acometida de cardiopatia grave, com dois episódios de edema agudo no pulmão e com recomendação médica de proibição de esforços físicos e estresse emocional que possam precipitar descompensações cardíacas graves, não poderia ser encaminhada para efetuar a limpeza de local desativado (exigindo atividades incompatíveis com seu estado e saúde), em área de preservação ambiental, ainda mais em local que dificultaria o socorro médico, caso este fosse necessário".
O acórdão destacou que o juízo de origem "entregou plenamente a prestação jurisdicional e para isso nem precisou analisar todos os fatos alegados na inicial, nem a gênese da perseguição empreendida". A decisão colegiada ressaltou que a precariedade das condições do local foi comprovada pelas fotos anexadas e também pelo depoimento do preposto do réu, que reconheceu que "a reclamante ficou no Ecomuseu por aproximadamente um ano; que logo após a transferência da reclamante para lá houve um problema decorrente de vendaval, e o museu foi fechado para reforma, sendo que neste meio tempo a empresa elétrica iniciou estudos de viabilidade para voltar a operar a usina hidrelétrica do local, e por isso o museu não foi reaberto ainda; que a reclamante teria como tarefas limpar o local e atender telefonemas e prestar informações; (...) que a reclamante e outra funcionária deveriam revezar-se na limpeza do banheiro".
O Município reconheceu que o museu fica em área de preservação permanente, o que prova a "rusticidade de suas instalações sanitárias e refeitórios, bem como a presença de animais", mas insistiu em afirmar que a transferência foi "totalmente impertinente" .
Por tudo isso, o acórdão reconheceu, ao contrário dos argumentos recursais do Município, que "restou patente a intencional exposição da reclamante a situação vexatória, humilhante e indigna", e chamou o fato de "desrespeito perpetrado por agentes políticos da Administração". Em conclusão, o acórdão entendeu que "o valor da indenização por danos morais deve não apenas subsistir, mas ser majorado de R$ 15 mil para R$ 30 mil". Também considerou "irrelevantes" as informações alegadas pelo Município sobre o estado de saúde da servidora quando da admissão, especialmente porque "a descrição destas somente corrobora o inegável fato de que o empregador estava totalmente ciente de que o tratamento dispensado agravaria tais condições de saúde". No entendimento da Câmara, essas informações "não permitem conceber as transferências ocorridas (não só entre secretarias, mas internamente) como exercício regular de direito da administração, pois as condições de trabalho se tornavam mais difíceis a cada alteração". (Processo 0000982-69.2011.5.15.0136)
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