Negada a ex-frentista de posto de gasolina devolução de valores supostamente descontados do salário
Valores corresponderiam a cheques sem fundos recebidos pelo reclamante,
que, no entanto, não conseguiu comprovar o desconto alegado
Por Ademar Lopes Junior
A função do trabalhador no posto de gasolina de Cruzeiro era de frentista, e o contrato teve início em 1º de novembro de 2006. Quase um ano depois, em 30 de setembro de 2007, passou a frentista caixa, com acréscimo no salário. O empregador, no entanto, conforme alegou o reclamante, aos poucos aumentou as atribuições do empregado, que, insatisfeito por ter de cumprir trabalhos estranhos à sua função, inclusive superiores à sua força física, um dia se negou a transportar um monte de terra próximo a um jardim e decidiu deixar o trabalho a partir do dia 20 de novembro de 2009, dando por rescindido indiretamente o contrato de trabalho (nos termos do artigo 483, incisos “a” e “d”, da CLT).
Na Justiça do Trabalho, o trabalhador procurou os seus direitos, pedindo, entre outros, a condenação da empresa em multa por atraso de pagamento, horas extras e de intervalo com adicional de 60%, com base em documentos juntados aos autos. Além desses, o trabalhador acusou a empresa de descontar do salário, ao longo do contrato, o equivalente a R$ 2.900, relativos “a cheques recebidos e devolvidos por falta de provisão de fundos, juntando as cártulas”. A empresa negou os descontos, mas as testemunhas confirmaram que a empresa “tinha por hábito descontar de seus funcionários os cheques sem provisão de fundos por eles recebidos”.
A reclamada ainda sustentou que o reclamante deu causa para a ruptura contratual, já que, desde 20 de novembro de 2009, não comparece ao serviço, configurando, no entendimento da reclamada, “abandono de emprego”.
A sentença da Vara do Trabalho (VT) de Cruzeiro entendeu que o ato do trabalhador não caracterizou o abandono de emprego alegado pelo dono do posto de gasolina, uma vez que é “necessário que a ausência do empregado ao serviço seja voluntária e devidamente comprovada, o que não ocorreu no presente caso”. Além disso, a empresa “nada apresentou como prova do abandono de emprego”, julgou o juízo da VT.
Bem que o empregador tentou alegar que houve o envio de telegrama ao autor, em data de 10 de dezembro de 2009, “determinando o seu retorno ao trabalho”, porém, o juízo considerou que o documento é “imprestável para tanto”. Já quanto ao telegrama enviado em 2 de fevereiro de 2010, a sentença afirmou que “se trata de correspondência posterior ao ajuizamento da presente ação, o que corrobora o alegado pelo autor em seu depoimento, ao afirmar que, quando recebeu o telegrama, já havia ido ‘procurar seus direitos’”.
As testemunhas foram unânimes em afirmar que o autor deixou de comparecer ao trabalho em razão das exigências de prática de serviços não compatíveis à sua função e superiores à sua força.
A sentença julgou procedentes em parte os pedidos do trabalhador, condenando a empresa nas obrigações de fazer e pagar, e, quanto aos cheques, entendeu que o reclamante tinha razão em seus pedidos, menos com relação a um cheque específico, de R$ 500, nominal a terceiro. Os R$ 2.400 restantes foram restituídos ao trabalhador.
A empresa recorreu. Primeiro, alegando que o abandono de emprego foi devidamente comprovado. Depois, para que fosse excluída a condenação ao pagamento do intervalo intrajornada, já que, em seu entendimento, o frentista tinha, sim, garantido o intervalo de uma hora para almoço, ainda feito no local. As duas testemunhas do reclamante confirmaram o intervalo de uma hora, porém disseram que “se houvesse movimento nesse período tinham que parar para atender os clientes” e que “havia proibição de sair do local de trabalho no horário de intervalo, mesmo porque o local ficava longe de qualquer coisa”.
O relator do acórdão da 3ª Câmara do TRT, desembargador Edmundo Fraga Lopes, afirmou que, no que tange ao intervalo, “não merece reparo a decisão de origem”, e que, da prova oral, se conclui que, “formalmente, havia uma hora de intervalo intrajornada, mas que o reclamante poderia, a qualquer tempo, ser interrompido para atender clientes; ou seja, não havia gozo regular desse intervalo”.
Já com relação aos descontos no salário feitos pela empresa, o acórdão entendeu que a sentença merecia reforma e justificou a medida porque, “embora as testemunhas do obreiro tenham admitido que era praxe da reclamada descontar do pagamento dos empregados o valor do cheque de cliente, quando devolvido por insuficiência de fundos, entende-se que não ficou comprovada a lesão ocorrida especificamente com o reclamante”. Além do mais, o reclamante arrolou apenas os quatro cheques e valores que diz ter havido desconto, mas “não informa quando estes ocorreram”, salientou o acórdão, e “não há desconto de valores em nenhum dos recibos de pagamento juntados aos autos”. A decisão colegiada observou também que nenhuma das testemunhas narrou ter presenciado “o reclamante devolvendo parte de seu salário por cobrança da reclamada nesse sentido”.
Em conclusão, o acórdão deu parcial provimento ao recurso da empresa e excluiu da condenação a restituição dos valores dos cheques devolvidos. (Processo 0000017-25.2010.5.15.0040)
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