Palestra na Escola Judicial do TRT põe em pauta a participação feminina nas organizações sindicais
Por Ademar Lopes Junior
A palestra "O princípio da igualdade em gênero e a participação das mulheres nas organizações sindicais de trabalhadores", ministrada pela juíza do trabalho substituta Candy Florencio Thome a 44 magistrados e 17 servidores, foi a segunda do programa da manhã desta sexta-feira, 26/10, na Escola Judicial do TRT-15, na VIII Semana Temática de Formação Inicial Continuada do Magistrado até o Vitaliciamento. O evento foi aberto pela vice-diretora da Escola, desembargadora Tereza Aparecida Asta Gemignani.
A palestra teve início com a apresentação em vídeo de um trecho do filme "Carmen", de Carlos Saura, inspirado na ópera homônima. A história, ambientada no século XIX, retrata o trabalho de mulheres numa fábrica, onde Carmen, cigana e também uma das trabalhadoras, se envolve num crime e passa a ser perseguida até a sua morte. Carmen, segundo a palestrante, destaca muitos pontos da discriminação que as mulheres ainda sofrem nos dias de hoje. No conto, a personagem é considerada imoral, prostituta (por se associar a um homem para fugir) e assassina, porém a juíza Candy salientou que essa visão depreciativa da mulher, tipicamente masculina, existe até os dias de hoje, mantendo o preconceito contra a mulher pobre, trabalhadora. Atualmente, "Carmen seria um típico caso de ‘Maria da Penha'", concluiu.
A palestra reforçou que os direitos sociais das mulheres já são reconhecidos como direitos humanos, e, como tais, indivisíveis e universais, mas destacou que, em períodos de "flexibilização dos direitos", as mulheres sempre são as primeiras a perder os seus direitos. Segundo a juíza palestrante, "já existem normas suficientes para a proteção dos direitos da mulher". Convenções da ONU e da OIT (apesar de muitas delas ainda não terem sido ratificadas pelo Brasil), mesmo resoluções do Mercosul e até a Constituição Federal de 1988 garantem proteção à mulher, prevendo igualdade entre os sexos, esclareceu a magistrada. Apesar disso, ainda remanescem, por exemplo, as desigualdades salariais, lamentou ela. Segundo a palestrante, as brasileiras chegam a ganhar 30% menos que os homens, "isso sem levar em conta outros fatores, como a questão racial e de escolaridade". A juíza afirmou que, apesar de as brasileiras apresentarem índice de escolaridade superior ao dos homens do País, elas ainda recebem salários menores que estes.
Outro fator importante destacado foi a discriminação horizontal (as mulheres sempre são maioria na base das pirâmides, mas poucas chegam a cargos de chefia, mesmo quando as atividades são predominantemente femininas, como no caso das costureiras, cozinheiras e até operadoras de telemarketing). A palestrante destacou também outros fatores agravantes, como a precarização do trabalho feminino e o trabalho doméstico (setor no qual 95% das vagas são ocupadas por mulheres, em sua grande maioria sem carteira assinada).
As mulheres e as organizações sindicais
A participação feminina nas organizações sindicais começou na década de 1970, afirmou a palestrante. Nessa época, surgiram as primeiras discussões e greves. Já na década de 1980, formaram-se as primeiras comissões ou secretarias de mulheres das centrais sindicais, e, uma década depois, surgiram as cotas femininas nas centrais sindicais. A palestrante afirmou ainda que, em 1992, "6% dos sindicatos já eram presididos por mulheres, e, em 2001, esse índice chegava a 10%".
Quanto à participação das mulheres nas diretorias dos sindicatos, em 2001, "de um total de 15.961 sindicatos, 5.667 não tinham nenhuma mulher em sua diretoria, 5.579 tinham até 25% de mulheres em sua diretoria, 3.280 tinham de 26% a 50% de mulheres em sua diretoria, 912 tinham de 51% a 75% de mulheres em sua diretoria, 499 tinham de 76% a 100% de mulheres em sua diretoria e 24 sindicatos não declararam. Desses 15.961 sindicatos, em 2001 apenas 1.618 tinham uma mulher no cargo de presidente, 3.907 tinham uma mulher no cargo de 1ª secretária, e 2.558 tinham uma mulher no cargo de 1ª tesoureira". A juíza Candy ressaltou que, apesar de antigos, os dados são os mais recentes registrados no País.
Segundo a palestrante, a participação sindical de trabalhadoras proporciona às mulheres "maior possibilidade de exercer poder e cidadania no espaço público em que é construída a democracia", além de uma "maior participação nos processos de tomada de decisão" e respectivo "aumento do capital político".
Por causa dos preconceitos e adversidades ainda vividos pelas mulheres no Brasil, a juíza Candy defende que "são necessárias medidas de discriminação positiva de inclusão das mulheres". Dentre essas, a magistrada elencou: "ações para o aumento do número de sindicalizadas em setores informais; fomento de sindicalização de trabalhadores sem vínculo empregatício; maior abertura por parte dos sindicatos para a criação de mecanismos voltados à ampliação da associação sindical das mulheres, mediante a organização de estrutura adequada para que as militantes sindicais possam participar das atividades das organizações sindicais; criação de alianças estratégicas com outros tipos de associações; formação de comissões, comitês ou secretarias femininas, principalmente nas federações, confederações e centrais sindicais", entre outros.
No encerramento do evento, a desembargadora Tereza Asta lembrou que "tradicionalmente o sistema político tem respondido ao pleito das mulheres", porém ressaltou que essa resposta sempre vem em forma de medidas assistenciais. Para a desembargadora, o desafio agora "é conseguir emancipação, preservando o feminismo".
A desembargadora Asta afirmou que homens e mulheres são diferentes e que as mulheres não podem deixar de ser mulheres ao lutar por seus direitos. Ela ressaltou que "a igualdade não significa nivelamento das diferenças" e que, na Justiça do Trabalho, a própria CLT, desde 1943, destinou um capítulo às mulheres, preservando os seus direitos. A desembargadora Tereza Asta concluiu afirmando que "a igualdade não pode ser usada para limitar a liberdade".
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