Palestrante aponta caminhos para a prevenção dos acidentes de trabalho em evento na Escola Judicial
Raimundo Simão de Melo abordou também temas como as doenças
ocupacionais e a pressão para cumprimento de metas, entre vários outros
Por Ademar Lopes Junior
A Escola Judicial do TRT da 15ª Região promoveu, na manhã de segunda-feira, 30/1, dando continuidade ao XXI Curso de Formação Inicial Básica para Juízes do Trabalho Substitutos, a palestra “Meio Ambiente do Trabalho e a Responsabilidade Civil”, ministrada pelo procurador regional do trabalho, Raimundo Simão de Melo. Ao todo foram 82 participantes, sendo 21 juízes substitutos mais a juíza Marina de Siqueira Ferreira Zerbinatti, titular da VT de São Roque, e 60 servidores e estagiários. A Mesa de Honra foi composta, além do palestrante, pelo vice-diretor da Escola Judicial, desembargador Samuel Hugo Lima, e pelo desembargador Roberto Nobrega de Almeida Filho.
Em quase duas horas de palestra, Raimundo Simão, que também é mestre e doutor em Direito do Trabalho pela PUC-SP e especialista em Direito do Trabalho (pela USP) e em relações coletivas de trabalho pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), abordou questões históricas sobre a evolução da legislação e do conhecimento sobre o meio ambiente do trabalho, e a sua relação específica com os acidentes de trabalho, que para ele são a “mera consequência do ambiente”.
Raimundo Simão salientou, durante sua explanação, a importância do TRT da 15ª na conquista de novas interpretações da legislação, bem como nos avanços alcançados no âmbito da competência da Justiça do Trabalho como um todo. Simão também lembrou que o TRT da 15ª foi o primeiro tribunal a reconhecer a competência da Justiça do Trabalho nas questões de acidente de trabalho. As mudanças, que começaram a acontecer em meados dos anos 1990, muitas provocadas pela promulgação da nova Constituição Federal, em 1988, segundo o palestrante, “são muito complexas e exigem estudos aprofundados”.
Importância do tema
O palestrante justificou a escolha do tema por sua relevância no âmbito da Justiça do Trabalho e seus reflexos socioeconômicos. Segundo o procurador do trabalho, o País aparece entre o nono e o décimo lugar no “ranking” mundial de produção de acidentes de trabalho (ao todo cerca de 700 mil ao ano) e em quarto lugar, em número de mortes, ficando atrás apenas da China, dos EUA e da Rússia. Para o palestrante, no entanto, “a realidade é bem outra”. Simão lembrou que o Brasil ainda registra condições de trabalho muito precárias, além de flagrantes desrespeitos à legislação, e ressaltou, reproduzindo um pensamento do doutrinador Amauri Mascaro Nascimento, de que “o juiz do trabalho é o médico das feridas sociais” justificando a ideia de que a Justiça do Trabalho é, na verdade, “mais que qualquer outra, a verdadeira justiça social”.
Evolução
Até 1988, o enfoque principal da responsabilidade civil era “monetarista” (paga-se para não prevenir), ao contrário dos países desenvolvidos, em que se procura prevenir e não pagar. Foi a Constituição Federal que inaugurou o novo entendimento sobre a responsabilidade. Para o palestrante, no entanto, “os ambientes de trabalho estão cada vez mais doentes”, e apesar de enaltecer os bons ventos soprados na economia do país, em parte pela atuação da presidente Dilma, Raimundo Simão registrou que ainda são normais os acidentes típicos de trabalho, as doenças ocupacionais, as doenças mentais, os suicídios, as condições degradantes, os assédios moral e sexual e a pressão no trabalho para cumprimento de metas.
O procurador também contou histórias verdadeiras, como a do trabalhador metalúrgico canhoto que, por falta de adaptação à prensa em que trabalhava, perdeu o braço direito. O acidente teve outros desdobramentos, como a perda da família, da casa, só restando o lamento do trabalhador de que “se eu tivesse ainda o braço, poderia fazer mais coisas”. Outro caso contado foi o dos trabalhadores da maior empresa produtora de laranja do país, que eram pulverizados com veneno, tanto quanto as laranjas, antes de iniciarem o trabalho. Simão enfatizou a atuação do Ministério Público e do TRT da 15ª como responsáveis pela solução do caso, depois de muito trabalho e insistência, e alguns laudos assinados por médicos da empresa e até da Unicamp negando os efeitos prejudiciais à saúde do trabalhador. Como ficou provado mais tarde, o produto - que se destina à produção de laranja e deveria ser usado apenas em veículos e equipamentos - é cancerígeno.
A palestra tratou ainda da evolução da legislação de proteção ao trabalhador nas questões acidentárias e do meio de trabalho, bem como de alguns instrumentos de prevenção e até da responsabilidade nos contratos terceirizados. Foram muitos os avanços, mas o professor destacou a mudança dos paradigmas, especialmente da responsabilização cada vez mais incisiva dos empregadores objetivamente, a inversão do ônus da prova e o nexo causal. Neste último, segundo Simão, “deve-se considerar o possível lógico e não o absolutamente certo”.
No campo das novas interpretações, Simão registrou alguns artigos, como o 927 do Código Civil, parágrafo único, que trata da reparação do dano, “independentemente de culpa, quando a atividade desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”. Nesse caso, segundo ele, a grande dificuldade, que na prática cabe ao magistrado, é dizer o que é atividade de risco.
Em sua conclusão, o palestrante lembrou que a proteção do meio ambiente do trabalho e da saúde do trabalhador dependem de uma mudança da cultura monetarista, bem como de uma educação ambiental, além de uma conscientização geral, da valorização da vida e da atuação compartilhada dos sindicatos e órgãos públicos, numa verdadeira campanha nacional de prevenção.
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