Recurso de trabalhadores do setor de reciclagem não é provido
Por Ademar Lopes Junior
Eram nove colegas de trabalho, todos contratados por um senhor italiano, de quem eles mal sabiam o nome inteiro, para laborar na reciclagem de lixo. Sem registro na carteira, os reclamantes afirmaram que as horas extras eram constantes e que trabalhavam nos feriados, mas não recebiam salário desde outubro de 2007, e essa situação teria permanecido até a dispensa de todos, em 18 de dezembro de 2007. Os nove ajuizaram juntos ação na Justiça do Trabalho para tentar garantir o que entendiam ser os seus direitos, dentre os quais o do "recebimento de verbas rescisórias devidas em razão de dispensa injusta, além de indenização por danos morais".
Na primeira audiência, o primeiro reclamado, ausente, foi declarado revel. Compareceram, porém, a segunda e o terceiro reclamados, também apontados pelos reclamantes como empregadores.
A prova oral deixou evidente para o juízo de primeira instância que a segunda e o terceiro reclamados "não mantiveram nenhuma relação jurídica com os reclamantes ou com o primeiro reclamado" e que eventual relação "foi apenas de cunho pessoal". A sentença do juízo da Vara do Trabalho de Barretos ainda ressaltou que "ficou sobejamente demonstrado que a contratação dos trabalhadores foi efetivada pelo primeiro reclamado, a quem também os reclamantes estavam subordinados". Por isso, o juízo da VT julgou improcedentes todos os pedidos formulados em relação aos outros dois reclamados, "pelo que ficam absolvidos de qualquer condenação".
A sentença da Vara do Trabalho de Barretos, tendo declarado a revelia do primeiro reclamado, reputou verdadeiros em relação a ele "todos os fatos articulados na inicial", reconhecendo o vínculo de emprego de todos os reclamantes e salientando que o reclamado deveria "proceder a anotação das carteiras de trabalho, sob pena de fazê-lo a Secretaria da Vara". Também entendeu que houve o labor em sobrejornada, sem o respectivo pagamento, pelo que julgou "procedente o pedido de pagamento de horas extras". Além disso, julgou procedentes os pedidos de pagamento de indenização equivalente ao vale-transporte e de outras verbas, mas negou aos trabalhadores o pagamento de cesta básica, por ausência de obrigação legal ou contratual, e a indenização por danos morais, "porque o inadimplemento de obrigações legais, por si só, não é suficiente à caracterização da lesão extrapatrimonial".
Inconformados com a sentença, recorreram os nove reclamantes, sustentando que a decisão de primeira instância "contrariou a prova material da apostila processual, que comprovaria a relação trabalhista entre os obreiros e os reclamados". Eles se referiram a uma cópia de cheque juntada aos autos e sustentaram que "não foi observada a desistência da reclamatória trabalhista com relação ao primeiro reclamado".
A relatora do acórdão da 11ª Câmara do TRT, desembargadora Olga Aida Joaquim Gomieri, ressaltou que os próprios trabalhadores desistiram da ação em relação ao primeiro reclamado, uma vez que este se encontrava na Itália. Em suas contrarrazões, a segunda e o terceiro reclamados asseveraram que a modificação do julgado implicaria "reformatio in pejus", pois, havendo desistência da ação em relação ao primeiro reclamado, e tendo sido esta homologada, não poderia haver condenação em desfavor dele.
O acórdão afirmou que, com a desistência homologada pela magistrada de primeiro grau, "imperiosa seria a exclusão do primeiro reclamado da lide", em consonância com o artigo 460, caput, do Código de Processo Civil: "É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que Ihe foi demandado".
A decisão colegiada ressaltou que a condenação contra o primeiro reclamado foi "evidentemente equivocada", uma vez que constituída "fora dos limites da lide". O acórdão lembrou que a sentença judicial, "em decorrência do princípio da adstrição do juiz ao pedido da parte, deve estabelecer claramente os direitos e as correspondentes obrigações dentro dos limites da pretensão deduzida em juízo". E, apesar do evidenciado julgamento "extra petita", esclareceu que "a ocorrência de julgamento extra ou ultra petita não implica a nulidade da decisão que nele incorreu, uma vez que a Corte Revisora possui autoridade legal para ajustar a condenação aos limites do pedido".
O acórdão salientou também que "não poderia ter havido a condenação do primeiro reclamado, uma vez que, com a homologação da desistência obreira, aquele se tornou terceiro, não figurando mais como parte na relação processual". A decisão colegiada buscou solução em consonância com "o princípio da razoável duração do processo insculpido no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal".
No lugar de decretar a nulidade da sentença e determinar o retorno dos autos à origem, a fim de que fosse proferida nova sentença, com a observância da desistência dos reclamantes da ação com relação ao primeiro reclamado, o acórdão seguiu por outro caminho. Por entender "totalmente desnecessário e contrário à celeridade processual, ainda mais quando ambas as partes reconhecem o nítido equívoco judicial, e o processo se encontra apto para a apreciação meritória", e ainda por não poder se falar em "reformatio in pejus", uma vez que os próprios trabalhadores ventilaram a matéria em sede recursal, "não havendo, assim, agravamento de sua situação e muito menos atentado ao princípio do tantum devolutum quantum appellatum", a decisão da 11ª Câmara reformou a sentença, "a fim de ajustá-la aos limites do pedido, excluindo-se da lide o primeiro reclamado, em razão da desistência devidamente homologada pela Julgadora de primeiro grau". O colegiado revogou, assim, a condenação imputada ao primeiro réu e não deu provimento ao recurso ordinário dos reclamantes, mantendo a absolvição da segunda e do terceiro reclamados. (Processo 0030700-06.2008.5.15.0011)
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