Conferência de encerramento do Congresso do TRT discute a representação sindical do condutor rural

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Por Patrícia Campos de Sousa

As atividades do XVI Congresso Brasileiro de Direito do Trabalho Rural, promovido pelo TRT da 15ª Região em Arararaquara (SP), foram encerradas na manhã desta sexta-feira (18/10) com a conferência "A representação sindical do condutor rural: o princípio da especificidade e seus limites", proferida pelo desembargador Davi Furtado Meirelles, do TRT da 2ª Região (Grande São Paulo e parte da Baixada Santista).

O conferencista foi apresentado pelo desembargador Luiz Antonio Lazarim, presidente da 1ª Câmara do TRT-15, que salientou a experiência do colega no trabalho sindical. Davi Meirelles foi coordenador-geral do Departamento Jurídico do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e assessor jurídico da bancada dos trabalhadores no Fórum Nacional do Trabalho, antes de ser  nomeado para representar a Advocacia no Regional Trabalhista sediado em São Paulo.

Lazarim destacou também a sólida carreira acadêmica do palestrante. Mestre em Direito do Trabalho pela PUC de São Paulo, professor titular de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo e professor colaborador da Escola Paulista de Direito, Meirelles é autor do livro "Negociação coletiva no local de trabalho: a experiência dos metalúrgicos do ABC" (2008, Editora LTr).

Meirelles iniciou sua conferência traçando um breve panorama do modelo sindical brasileiro, avaliado como um sistema bastante "confuso", em que a contribuição sindical obrigatória dos trabalhadores convive com uma liberdade sindical controlada e com o instituto da unicidade sindical, amparado em um conceito de categoria que chamou de "engessado". No Brasil, lecionou o palestrante, a regra é o enquadramento sindical do empregado seguir a atividade preponderante de seu empregador, uma vez que, nos termos do artigo 511 da CLT, a categoria profissional constitui-se a partir da "similitude de condições de vida oriunda da profissão ou trabalho em comum, em situação de emprego na mesma atividade econômica ou em atividades econômicas similares ou conexas". Uma exceção a essa regra, esclareceu Meirelles, são as chamadas categorias profissionais diferenciadas, definidas no parágrafo 3º do mesmo artigo como as formadas por empregados que exercem profissões ou funções regidas por estatuto especial ou que têm condições de vida singulares. Nesse caso, o trabalhador não é representado pelo sindicato da categoria preponderante da empresa, mas sim pelo sindicato específico.

Na avaliação do desembargador, os princípios da unicidade sindical e da especificidade são os grandes responsáveis pelo processo de desmembramento sindical verificado no País. Segundo informou Meirelles, com base em dados do Ministério do Trabalho e Emprego, contamos hoje com mais de 14 mil sindicatos, número que não chegava a 4 mil em 1988. "Isso num país onde vigora a unicidade sindical! Na Alemanha, onde há efetiva liberdade sindical, existem apenas 28 sindicatos. É que lá não há imposto sindical. Os sindicatos têm de justificar a sua existência. No Brasil não precisa. Aqui o dinheiro é fácil", lamentou.

Outra consequência de tomar o município como base mínima para a criação de sindicatos, segundo Meirelles, é a proliferação de ações na Justiça do Trabalho para a disputa da representatividade sindical de várias categorias, assim como o registro de inúmeros sindicatos artificiais, criados apenas para resguardar o sindicato já constituído de qualquer iniciativa de desmembramento em sua base territorial. São os chamados sindicatos de gaveta. "Abrir sindicatos no Brasil virou um grande negócio. O Ministério do Trabalho recebe hoje de 20 a 30 pedidos diários de registro de novos sindicatos. Estamos produzindo quadrilhas especializadas em formar sindicatos para ganhar dinheiro, e a culpa disso é a manutenção da obrigatoriedade da contribuição sindical. Ela é o bandido da história, a causa da pulverização das categorias. O sistema sindical brasileiro alimenta isso."

O palestrante chamou a atenção, também, para o fato de o desmembramento de sindicatos pelo critério da especificidade muitas vezes ser estimulado pelo próprio empregador. "Eventualmente, o desmembramento por especificidade pode até melhorar a representação de alguns trabalhadores, mas, na maioria dos casos, seus proponentes estão de olho é no imposto sindical, ou em reduzir direitos já consolidados da categoria. É o caso da criação do Sindicato de Trabalhadores de Fast-Food, o Sindifast. Obviamente, os benefícios que esse sindicato poderá obter para seus afiliados serão menores." No entendimento do desembargador, condições de vida singulares, por si sós, não justificam o enquadramento do trabalhador em categoria diferenciada. "Qual o sentido, por exemplo, de as secretárias de uma metalúrgica serem representadas por um sindicato de secretárias. Sem dúvida elas estarão mais bem representadas pelo sindicato dos metalúrgicos." Na mesma direção, ele lembrou que o Tribunal Superior do Trabalho (TST) já decidiu que a enfermeira de UTI aérea integra a categoria aeroviária, ou seja, segue a atividade preponderante da empresa, ainda que a profissão de enfermeira seja regulamentada.

Já entrando no tema central da conferência, a representação sindical do condutor rural, Meirelles disse não haver muito consenso sobre o enquadramento desse trabalhador, sobretudo após a aprovação da Lei 12.619/2012, que dispõe sobre o exercício da profissão de motorista. Para o desembargador, a confusão existe porque, embora a atividade de motorista seja exercida em condições singulares e tenha sido recentemente regulamentada, a Orientação Jurisprudencial (OJ) 315 da SBDI-I do TST já definiu que o condutor rural é trabalhador rural, posição que, segundo ele, teve como objetivo garantir que o direito de ação desse profissional fosse imprescritível, e não limitado à prescrição quinquenal dos trabalhadores urbanos.

Na avaliação do palestrante, a regulamentação dos motoristas profissionais vem reforçar o argumento daqueles que entendem que o condutor rural deve ser enquadrado nessa categoria. "Alguns TRTs, como o de Goiás, o do Rio Grande do Sul e a própria 15ª Região têm mudado o seu entendimento para integrar o condutor rural à categoria diferenciada dos motoristas, mas o TST se mantém irredutível na ideia de que o condutor rural é trabalhador rural." Pessoalmente, Meirelles disse não ter dúvidas de que aquele que transporta trabalhadores para a frente de trabalho deva ser enquadrado na categoria dos motoristas profissionais. Já no caso do operador de colheitadeira, o desembargador entende tratar-se de trabalhador rural, e não de motorista. "Tem de ver caso a caso. Eu não tenho tanta certeza sobre qual sindicato deve representar o tratorista, por exemplo. Afinal, quem opera empilhadeira numa metalúrgica é metalúrgico e não motorista. A decisão tem de ser sensata. O trabalhador tem de se sentir representado, confiar no sindicato. É preciso decidir com bom senso e sensibilidade."

Encerramento

Após a conferência, os desembargadores Henrique Damiano, vice-presidente judicial do Tribunal, e Samuel Hugo Lima, diretor da Escola Judicial da Corte e presidente da Comissão Organizadora do Congresso, foram chamados para compor a mesa de encerramento do evento. Damiano, que acabara de retornar de uma reunião do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em Brasília, comentou sobre a repercussão nacional do encontro. "Que os pontos controvertidos aqui abordados sejam objeto de reflexão de todos nós", conclamou o magistrado.

Samuel Hugo Lima, por sua vez, ressaltou as "lições colhidas nesses dois dias", destacando a viabilidade de um debate profícuo entre os palestrantes, "mesmo quando defendendo posições opostas". Para o desembargador, o segredo do sucesso do Congresso deve ser atribuído aos próprios congressistas e, em especial, à Comissão Organizadora do evento, composta pela desembargadora Tereza Aparecida Asta Gemignani e por pessoas da própria região, como a desembargadora Antonia Regina Tancini Pestana, os juízes Sérgio Milito Barêa, José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva e Tânia Aparecida Claro e os advogados Wlademir Flávio Bonora e Ivo Dall'Acqua Junior. "Araraquara é uma cidade de primeira linha. Até o XVII Congresso."

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