De volta à instrução: município detecta erro a tempo, ajuíza rescisória e consegue cancelar acordo
Por Ademar Lopes Junior
A 3ª Seção Especializada em Dissídios Individuais do TRT-15 julgou procedente uma ação rescisória movida pelo Município de Mogi Guaçu, que pediu a desconstituição de acordo celebrado no juízo da Vara do Trabalho da cidade. A decisão do colegiado determinou que fosse reaberta a instrução processual para que "se prossiga na marcha daquele feito com a intimação das partes a que se manifestem sobre a intenção de produção de prova em audiência, tendo-se em conta que na solenidade inaugural o feito foi sobrestado ante a disposição das partes em entabular acordo".
De acordo com a tese de defesa do município, houve erro substancial de sua parte na concepção do acordo firmado com o reclamante. Segundo afirmou, "para alcançar o alvitramento do valor ali entabulado foram por ele consideradas as verbas trabalhistas respeitantes aos últimos cinco anos do contrato de trabalho, não tendo, pois, se atentado ao fato de que na ação trabalhista foram tão somente deduzidos pelo obreiro pedidos referentes aos últimos oito meses do liame, único interregno no qual o contrato esteve sujeito ao regime celetista".
O município ressaltou que só "tardiamente" percebeu o erro, mais precisamente "após ter sido citado na ação de cobrança cível que tramita perante a 2ª Vara Cível de Mogi Guaçu", movida pelo reclamante, que pretendia a condenação do município a pagar também "as parcelas não açambarcadas na reclamação trabalhista". Assim que percebeu o equívoco, e ainda antes da homologação do acordo, tentou se retratar, requerendo que "não restasse aperfeiçoado o ato judicial homologatório". O requerimento, no entanto, não foi acolhido pelo juízo de origem, e por isso o município ajuizou a ação rescisória pedindo a desconstituição da decisão de homologação e a reabertura da instrução processual.
O reclamante alegou o não cabimento da ação rescisória, dizendo "não existir fundamento bastante a malferir a validade do acordo entabulado com o autor, mormente por entender que a adução exordial não caracteriza erro substancial a viciar a declaração de vontade do município". Ele alegou ainda que não é possível "subsumir os fatos em que se ampara o pleito rescisório a qualquer das hipóteses legais capituladas pelo artigo 485 do Código de Processo Civil".
A relatora do acórdão, desembargadora Maria Cecília Fernandes Álvares Leite, afirmou que "a falta de exatidão quanto à subsunção dos fatos à norma não configura hipótese de extinção do feito, mas, eventualmente, de improcedência da ação". A magistrada destacou que o município não apontou "a hipótese legal em que se apoia o pedido de corte rescisório, omissão que não causa, contudo, embaraço ao exame meritório da pretensão por ele deduzida". Acrescentou ainda que o caso atrai a incidência da Súmula 408 do Tribunal Superior do Trabalho, concluindo que, "diante dos elementos constitutivos dos autos, a situação versada diz respeito à hipótese prevista no inciso VIII do artigo 485 do CPC, a saber a existência de fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação em que se baseou a decisão rescindenda".
O acórdão ressaltou que, "não obstante o autor tenha dedicado suas razões à tentativa de convencer pela incorrência em erro substancial quanto ao valor do acordo entabulado", é "imprescindível que se perpasse a análise prévia dos elementos essenciais componentes de tal negócio jurídico, já que a constatação da ausência de um daqueles importará a decretação de inexistência deste".
O acórdão salientou que o acordo firmado se deu em 22 de maio de 2009, mas só foi protocolizado em 28 de maio, noticiando a autocomposição do conflito por transação. Antes mesmo de que fosse levado à homologação pelo juízo de origem, o município apresentou, por petição protocolada em 5 de junho de 2009, a sua retratação, alegando o erro quanto ao cálculo do valor acordado e, por isso, pedindo a anulação do ajuste. O juízo de origem indeferiu o requerimento e proferiu a decisão homologatória do acordo.
O acórdão afirmou que "a transação caracteriza-se pela concessão recíproca das partes, por meio de um acordo, prestante a prevenir ou extinguir um litígio" e tem sentido jurídico específico, designando "um determinado negócio jurídico de cunho contratual". Extrai-se dos autos, contudo, que, "antes mesmo de ser proferida a sentença homologatória da avença, o município manifestou expressa retratação do que fora anteriormente pactuado, tornando vazio o acordo por ter deixado de expressar a convergência de vontades das partes", decidiu a 3ª SDI. A decisão colegiada afirmou também que "não havendo mais consentimento entre os transatores, faz-se inviável a prolação de sentença homologatória daquilo com que a parte não mais concorda". Ainda mais porque "a retratação do município foi externada tempestivamente, antes da homologação do acordo", completou.
O colegiado concluiu, assim, que "a decisão homologatória do acordo merece ser desconstituída", uma vez que sequer chegou a existir no plano jurídico. (Processo 0000128-95.2011.5.15.0000)
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