Seminário sobre segurança no trabalho: procurador critica sobrecarga imposta aos trabalhadores

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Por Luiz Manoel Guimarães

O procurador do trabalho na 12ª Região (SC) Sandro Eduardo Sardá encerrou o seminário "A Saúde do Trabalhador e a Prevenção de Acidentes de Trabalho", realizado na última sexta-feira, 10, no Instituto Agronômico de Campinas (IAC). Gerente nacional do Projeto de Adequação das Condições de Trabalho em Frigoríficos, Sardá falou sobre "Direito à Saúde: Intensificação do Trabalho e Remuneração por Produção".

Dirigido a magistrados, procuradores e auditores fiscais do trabalho, advogados, servidores do Judiciário, sindicalistas, empresários e peritos judiciais, o seminário celebrou o Dia Mundial da Segurança e Saúde no Trabalho, comemorado em 28 de abril, e os 70 anos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), completados no 1º de Maio. O evento foi coordenado pelo desembargador Edmundo Fraga Lopes, presidente da 3ª Câmara do TRT-15, e pelo juiz titular da 2ª Vara do Trabalho de Araraquara, José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva, com apoio da Escola Judicial do TRT da 15ª Região. Os magistrados são os gestores, na 15ª Região, do "Trabalho Seguro – Programa Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho", lançado em 2012 pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) e pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT).

"Financeirização"

O procurador iniciou sua palestra exibindo um trecho do premiado documentário "Carne e Osso", de Caio Cavechini e Carlos Juliano Barros. O filme mostra a dura realidade dos trabalhadores de frigoríficos.

Sardá criticou o fenômeno que tem sido chamado de "financeirização do mundo do trabalho", em que o modelo de bancos de investimento é transposto para outros setores. "E nesse modelo é expressiva a forma como se dá a intensificação, as horas extras excessivas e a degradação do meio ambiente do trabalho."

Em vez de falar em doenças, apenas, o procurador propôs um debate centrado no conceito mais amplo de "agravo à saúde". Segundo o artigo 2º, parágrafo único, da Instrução Normativa (IN) nº 31 do INSS, considera-se agravo "a lesão, a doença, o transtorno de saúde, o distúrbio, a disfunção ou a síndrome de evolução aguda, subaguda ou crônica, de natureza clínica ou subclínica, inclusive morte, independentemente do tempo de latência". No entendimento de Sardá, "o modelo de saúde e doença é muito limitado. O distúrbio do sono, por exemplo, muito anterior a um quadro de depressão, é um agravo à saúde, e não uma doença. Os distúrbios alimentares são outro exemplo".

"Por que as pessoas adoecem?", questionou o palestrante. "Porque a organização do trabalho é inadequada às características psicofisiológicas dos trabalhadores. Quando o trabalho vem organizado de maneira opressora, gera adoecimento." Nesse contexto, Sardá recomenda o estudo cuidadoso, pelos que militam na Justiça do Trabalho, e em particular pelos advogados, das normas regulamentadoras (NRs) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). "Eu fui assistente de juiz do trabalho durante 14 anos, e há seis sou procurador, e nunca vi um advogado ajuizar uma ação trabalhista sobre NR", comentou.

Em especial, Sardá falou da NR 17, que estabelece parâmetros no sentido de permitir "a adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores, de modo a proporcionar um máximo de conforto e segurança e desempenho eficiente". No item 17.6.2, a NR preconiza que a organização do trabalho "deve observar as normas de produção, o modo operatório, a exigência de tempo, a determinação do conteúdo de tempo, o ritmo de trabalho e o conteúdo das tarefas", detalhou o procurador. "E nós estamos limitados à ginástica laboral e ao rodízio."

O palestrante recomendou também o estudo da IN nº 98 do INSS. "É a norma técnica sobre distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho no Brasil", enfatizou. Entre outras questões, a Instrução estabelece que, "para ser significativo como causa, o fator não-ocupacional precisa ter intensidade e frequência similares àquelas dos fatores ocupacionais conhecidos", explica Sardá. A propósito disso, ele lembra de uma história que o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores nas Indústrias da Alimentação, Agroindústria, Cooperativas de Cereais e Assalariados Rurais (Contac), Siderlei Silva de Oliveira, lhe contou. "Na tentativa de justificar os problemas apresentados pelas empregadas dos frigoríficos, os empresários argumentavam que a causa era o fato de elas lavarem roupa em casa. Mas é claro que o fator ocupacional contribuía de forma muito superior para o surgimento das lesões", ponderou Sardá.

Outro documento importante, advoga o procurador, é a Resolução 1488/1988 do Conselho Federal de Medicina (CFM). Segundo ela, para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e dos exames complementares quando necessários, o perito deve considerar fatores como a história clínica e ocupacional do empregado – que o próprio documento classifica como "decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal" –, o estudo do local e da organização do trabalho, a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos e estressantes, entre outros, e o depoimento e a experiência dos trabalhadores.

Setores de maior incidência

O procurador apresentou números do Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho, elaborado pelo INSS e relativos a 2011 (dados mais recentes). De acordo com o documento, o atendimento hospitalar é o setor campeão em ocorrências no País, com 51.417 casos registrados naquele ano. "A hipótese que eu levanto para explicar esse dado é que se trata de uma área em que há um percentual mais expressivo de notificações dos acidentes. Outra explicação é o regime de trabalho, de 12 X 12 horas. Porque trabalhar no regime de 12 X 36 é isso. O indivíduo trabalha 12 horas e, no dia seguinte, trabalha mais 12, porque tem outro emprego. Então, trabalhar 12 horas por dia vendo as pessoas morrendo não é coisa que faça bem à saúde", argumenta Sardá.

Em segundo lugar vem o setor de supermercados, com 22.517 casos. "Acredito que seja porque muitos empregados do ramo estão se transformando, na verdade, em trabalhadores de frigoríficos, uma vez que os mercados compram peças inteiras de carne, porque é mais barato, e aí são seus próprios empregados que têm de fatiar as peças", observou o procurador. Logo atrás vem, curiosamente, a administração pública, com 21.846. "Dizem que o servidor público é marajá, que ele não trabalha. Vai lá numa vara do trabalho para ver se ele trabalha ou não", provoca Sardá. Seguem a indústria da construção (21.700), os frigoríficos (19.453), o transporte de cargas (16.824) e a fabricação de açúcar (15.211). Fechando a lista dos setores com maior incidência de acidentes de trabalho aparecem os Correios, com 11.292. "Como uma única empresa consegue gerar tanto adoecimento?", critica o procurador. Apesar dos números elevados, ele adverte que, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a subnotificação (casos não comunicados) é da ordem de 90%. Além disso, o problema consome anualmente cerca de 4% do PIB do País.

"A notícia boa, se é que existe alguma, é que temos um número muito grande de casos concentrados em poucos setores. Se trabalharmos intensamente nessas áreas, podemos avançar bastante na solução do problema", defende Sardá, que invoca o chamado "dever de proteção". "Se é grande a incidência de acidentes, doenças e agravos à saúde, de maneira geral, numa determinada empresa ou setor da economia, o dever de proteção do empregador aumenta. Ele tem de tomar todas as medidas possíveis no sentido de prevenir essas ocorrências. É o caso, por exemplo, das plataformas de petróleo, onde o índice de alcoolismo é 600% maior do que a média geral."

Sobre a remuneração por produção, Sardá foi taxativo: "Não é possível implementar nenhuma medida de saúde e de segurança no trabalho enquanto não acabar o pagamento por produção. O salário por produção é o suprassumo da exploração humana".

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Comunicação Social