Usina é condenada a pagar R$ 65 mil por danos morais à mãe e ao irmão de empregado morto em serviço
Por Ademar Lopes Junior
A 11ª Câmara do TRT-15 negou provimento ao recurso da reclamada, uma conceituada usina de açúcar e álcool, e manteve a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara do Trabalho de Catanduva, que condenou a usina a pagar R$ 65 mil por danos morais à mãe e ao irmão de um funcionário da empresa, morto em serviço, além de pensão mensal vitalícia à mãe da vítima (como danos materiais).
Inconformada com a sentença, a empresa recorreu, negando sua responsabilidade na morte do funcionário, um trabalhador de 25 anos, vítima de descarga elétrica durante o trabalho. A usina também insistiu na tese de que não tem o dever de indenizar a família do trabalhador nem por dano moral, nem por dano material. Alegou ainda que a sentença guarda vício (decisão "ultra petita"), uma vez que extrapolou o pedido original de pensão vitalícia no valor de 1/3 do salário mínimo feito pelos reclamados (mãe e irmão da vítima). A sentença fixou o valor da pensão (dano material) em 2/3 do salário bruto do obreiro.
O relator do acórdão, desembargador Eder Sivers, ressaltou que em caso de decisão "ultra petita", "o juiz decide o pedido, mas vai além dele sendo certo que esta nulidade é parcial, de sorte que ao julgar o recurso da parte prejudicada, o tribunal apenas adequará aquilo que ultrapassou o pedido".
Na usina, o trabalhador morreu ao receber uma descarga elétrica enquanto instalava um conjunto de lâmpadas fluorescentes no compartimento do painel gerador. Amparado no laudo de exame de corpo de delito, o Juízo de primeira instância afirmou que "o resultado óbito ocorreu em decorrência de choque elétrico" e registrou "a falta de equipamentos de segurança e a necessária ausência de energia elétrica para o desenvolvimento da atividade".
O acidente com o trabalhador foi descrito pelo laudo do Instituto de Criminalística da Superintendência da Polícia Técnico-Científica, elaborado em 7 de junho de 2004 (quatro dias após o acidente). Pelo laudo, a vítima tinha entrado em serviço por volta das 15 horas e, junto com outro funcionário (informante na perícia), foi colocar um conjunto de lâmpadas fluorescentes no compartimento do painel do gerador. "Como o teto desse compartimento era de perfis de pvc, fraco para aguentar o peso, o informante pediu à vítima, que era mais leve que ele, que subisse no teto e instalasse a luminária. A vítima subiu no teto enquanto o informante fazia apoio com as costas na parte de baixo do teto, junto ao ponto onde seria instalada a luminária e, em determinado momento, o teto começou a afundar, tendo o informante visto por uma brecha que a vítima viera a tombar, vindo a pedir socorro".
A vítima era funcionário da usina há aproximadamente dois anos e trabalhava como auxiliar de eletricista há cerca de cinco meses. Antes, tinha a função de analista de laboratório. Recebia salário mensal de R$ 522,37. O laudo da polícia esclareceu ainda que "a rede principal era constituída por 220 volts, cujo disjuntor achava-se em um painel elétrico localizado em outro compartimento, situado no piso inferior e distante do sítio examinado". Por ocasião da perícia, "a fiação achava-se desenergizada, entretanto não fora observado qualquer cartaz ou aviso no painel junto ao disjuntor específico dessa rede, informando haver pessoas trabalhando nela", afirmou o laudo, acrescentando a informação de que "essa rede também é responsável pela alimentação de energia dos portões elétricos que possibilitam a entrada ao prédio". O laudo registrou ainda que, dias depois, visando à continuidade dos exames, a perícia retornou ao local para exames complementares, e, mesmo diante da informação de que o local se achava desenergizado, "pôde-se constatar que havia eletricidade nessa fiação, uma vez que o sistema era religado para liberar os portões, daí a necessidade da existência de cartazes ou avisos de que estavam trabalhando na rede".
O acórdão afirmou que a "matéria é tratada na Norma Regulamentadora 10 (NR-10) – Segurança em Instalações e Serviços em Eletricidade –, conforme Portaria nº 598 de 7 de dezembro de 2004, e que os documentos juntados pela empresa no sentido de demonstrar que o trabalhador tinha feito curso (de 2 a 10 de 2003), assistido a palestra sobre segurança no trabalho, participado de treinamento teórico – CPFL 2004 –, bem como de inclusão de ficha de controle de EPI e uniformes, datadas de janeiro e março de 2003, evidenciam o descumprimento da Norma Regulamentadora (NR) 10 – 10.2.9.2. quanto às vestimentas de trabalho, que devem ser adequadas às atividades, devendo contemplar a condutibilidade, inflamabilidade e influências eletromagnéticas". O acórdão concluiu também que a reclamada, apesar de alegar que concedia os equipamentos de segurança, "não providenciou a prova (artigos 818 da CLT e 333, II do CPC) da eficaz imposição de uso de equipamentos de segurança", e destacou que a atividade desenvolvida pelo trabalhador "era de risco acentuado, nos termos do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil que reelaborou a teoria da responsabilidade civil, no sentido de se reconhecer a obrigação de reparar o dano, independentemente da existência de culpa, nos casos em que a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem, de modo que é desnecessária a prova da existência de culpa do empregador".
A Câmara salientou que "a responsabilidade civil evoluiu sobremaneira no ordenamento jurídico e, não obstante suas diversas matizes, certo é que está adstrita a uma responsabilidade social condicionada a padrões éticos". De acordo com o colegiado, a responsabilidade, no caso dos autos, "é entendida como um mecanismo de imposição de comportamento dos atores sociais e sua ideia central é a de que quem infringe um dever jurídico, causando danos a outrem, responde pelo ressarcimento do prejuízo".
Quanto ao dano moral, a decisão colegiada afirmou não haver dúvida de que "o infortúnio gera sofrimento aos familiares que perderam o ente querido", e que, segundo o próprio relator do acórdão, "dor maior não pode existir que a perda de um ente querido, notadamente quando se trata de um filho".
Em conclusão, a Câmara entendeu que "deve ser mantido o pedido de indenização por dano moral", e manteve a condenação arbitrada pela primeira instância, até mesmo pela "ausência de recurso dos autores", de R$ 50 mil (a ser pago à mãe da vítima), e R$ 15 mil (a ser pago ao irmão). O acórdão confirmou igualmente a condenação por danos materiais, fundamentado no mesmo entendimento do Juízo de primeira instância, que destacou: "o endereço que consta da certidão de óbito é o mesmo da primeira autora, fazendo presumir que a vítima vivia com sua genitora e presumivelmente contribuía com as despesas da casa; como não há nos autos notícia – ou alegação – de que a sra. J. [a mãe] exercesse atividade profissional ou econômica, é de se presumir que ela apenas cuidava da casa, tendo portanto sua necessidades providas pelo ‘de cujus'".
A Câmara, na mesma linha da decisão original, interpretou que 1/3 da renda da vítima era utilizada para suas necessidades pessoais", e, por isso, entendeu que os outros 2/3 deveriam ser pagos à mãe da vítima, em forma de pensão mensal vitalícia, com base no último salário bruto do trabalhador morto. O acórdão destacou que é "inequívoca a dependência da mãe, nos moldes estabelecidos pela legislação previdenciária conforme art. 16 da Lei 8.213/91". (Processo 0000787-83.2012.5.15.0028)
- 34 visualizações