Congressistas debatem os desafios à efetividade das ações coletivas trabalhistas

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 Por Patrícia Campos de Sousa

"Ações coletivas trabalhistas – class action" foi o tema do segundo painel do Congresso do TRT da 15ª Região, que reuniu no palco do Theatro Municipal de Paulínia, no dia 5 de junho, o desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) José Roberto dos Santos Bedaque e o jurista Antonio Gidi, professor visitante da Syracuse University College of Law, em Nova Iorque, EUA. Os palestrantes foram apresentados pelo desembargador Lorival Ferreira dos Santos, membro da 5ª Câmara do TRT-15.

Mestre e doutor em Direito pela PUC-SP e doutor pela University of Pennsylvania Law School, na Filadélfia, EUA, Antonio Gidi foi o primeiro a palestrar. Especialista no assunto, há mais de uma década ele ensina processo civil e ações coletivas como professor visitante de várias universidades norte-americanas e de importantes universidades da Europa. Autor de um Código de Processo Civil Coletivo Modelo, foi correlator do projeto do Ibero-American Institute of Civil Procedure para criação do Código Modelo de Processos Coletivos para a Ibero-América. Entre os livros publicados destacam-se "A class action como instrumento de tutela coletiva dos direitos. As ações coletivas em uma perspectiva comparada" (Revista dos Tribunais, 2007) e "Rumo a um Código de Processo Civil Coletivo. A codificação das ações coletivas no Brasil" (Forense, 2008).

O palestrante abordou, inicialmente, os benefícios do processo coletivo e as inovações que considera essenciais para que as ações coletivas promovam a efetivação dos direitos materiais com maior celeridade e economia processuais. Entre elas, destacou a necessidade de se controlar a qualidade da representação da ação coletiva. "Tanto o juiz como o Ministério Público devem atentar para a adequação da representação, podendo, eventualmente, destituir o representante e nomear outro", defendeu. Outra medida fundamental, segundo Gidi, é assegurar a notificação do grupo com relação à ação proposta. "Não basta publicar no Diário Oficial, tampouco precisa ser notificação individual, a cada membro do grupo. Mas deve haver a notificação ao sindicato, à associação, no caso do Direito do Trabalho."

O professor também entende que o processo coletivo, ao regular o acordo entre as partes, permite fazer concessões mútuas, sujeitas, sempre, ao controle judicial. "Essa é uma grande vantagem dos processos coletivos. As concessões mútuas não são possíveis, por exemplo, nos Termos de Ajusta de Conduta do Ministério Público, os chamados TACs, que tratam apenas de ajustar o réu à lei", argumentou.

Gidi destacou ainda as dificuldades probatórias do processo coletivo e, por fim, focou no tema da coisa julgada coletiva. Segundo o professor, não é verdade que a sentença coletiva brasileira faça coisa julgada "secundum eventum litis" (conforme o resultado da lide), ocorrendo apenas na hipótese de decisão coletiva favorável, para beneficiar o grupo, nunca para prejudicá-lo. "No Brasil, a sentença coletiva desfavorável faz coisa julgada pró e contra o grupo", defendeu o professor. "Dizer que o processo coletivo faz coisa julgada coletiva ‘secundum eventum litis' é uma farsa, que cria uma falsa sensação de segurança. As sentenças coletivas podem, sim, prejudicar seus autores", concluiu o palestrante.

Adequação processual ao objeto

O segundo palestrante, José Roberto dos Santos Bedaque, integrou o Ministério Público antes de ser nomeado juiz do Tribunal de Alçada de São Paulo e, mais tarde, desembargador do TJSP, pelo quinto constitucional. Aposentando-se desta Corte em 2011, passou a exercer a advocacia, destacando-se, ainda, por sua atuação acadêmica. Doutor e livre-docente em Direito Processual pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), é professor titular do Departamento de Direito Processual dessa Faculdade e coordenador e professor do Curso de Especialização em Direito Processual Civil da Escola Paulista da Magistratura, tendo integrado a Comissão de Juristas nomeada pelo Senado Federal para a elaboração do projeto do novo Código do Processo Civil (CPC). Além de vários artigos publicados em periódicos especializados, é autor dos livros "Poderes instrutórios do juiz" (5ª ed., Editora Revista dos Tribunais, 2011 [1ª ed.1991]), "Direito e processo: influência do direito material sobre o processo" (6ª ed., Malheiros Editores, 2011 [1ª ed. 1995]), e "Efetividade do processo e técnica processual" (3ª ed., Malheiros Editores, 2010 [1ª ed. 2006]).

Bedaque iniciou sua exposição alertando que tem defendido ideias não muito simpáticas aos processualistas em geral. "Entendo ser o processo um método de trabalho conduzido pelo juiz de forma a que os interessados possam participar dos seus resultados. Ele será tão adequado quanto corresponder ao que o direito material exige dele", afirmou o palestrante, para quem os processualistas estão ainda tão preocupados em demonstrar sua autonomia com relação ao direito material que se esquecem de manter a aproximação entre método e objeto. "Ficamos tão preocupados com a sofisticação do direito processual que o tornamos ininteligível. Demonstração disso é que, num processo, as principais questões são processuais, evidenciando uma inversão de valores, uma preocupação maior com o instrumento do que com o resultado", lamentou. "A verdade é que os processualistas vivem em função dos problemas criados pelos processualistas. Talvez um meio de termos processos mais simples e mais ágeis seja eliminar 70% dos processualistas", brincou Bedaque.

Dessa perspectiva, o professor ressaltou a importância de se conceber um processo que atenda aos objetivos dos direitos coletivos. "A coisa julgada no processo coletivo, por exemplo, deve alcançar não só o pedido – por exemplo, o fechamento de uma fábrica poluidora –, mas também a própria causa de pedir – o reconhecimento de que a fábrica polui -, com as devidas implicações." Ele posicionou-se também contra o formalismo exagerado, defendendo a validade de sentenças coletivas "extra petita" – ou seja, que concedam aos autores coisa diversa da que foi requerida na petição inicial – caso o direito ao contraditório tenha sido preservado. "A defesa é um fim e não um meio", observou Bedaque.

O palestrante avaliou, por fim, que ainda há muito a avançar para que o processo coletivo cumpra sua função constitucional e se apresente como mecanismo efetivo de defesa das partes, garantidos os princípios da igualdade processual, do contraditório, da ampla defesa e do tempo razoável do processo, e de garantia do acesso à Justiça.

A pedido do desembargador Lorival, coordenador do painel, Bedaque finalizou sua participação no Congresso com uma avaliação do projeto de CPC que deverá ser votado pelo Senado Federal no próximo dia 16 de julho, após as modificações introduzidas no anteprojeto pela Câmara dos Deputados. Entre outros pontos positivos, o palestrante, que participou da formatação do anteprojeto do novo Código, destacou a eliminação da duplicidade na arguição da incompetência do juiz, possível, atualmente, via contestação ou exceção, dependendo do caso, assim como da distinção entre tutela cautelar e tutela antecipada. "Afinal, nem mesmo nós, processualistas, sabemos a diferença entre elas. É tudo tutela provisória." Ele contou também que o anteprojeto autorizava o magistrado a adequar o procedimento às peculiaridades do direito material, mas que a proposta acabou vetada pela Câmara, sob o argumento de que colocaria muito poder na mão do juiz.

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