Desembargadora Tereza Asta palestrou no TRT-2 sobre combate ao trabalho infantil

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 Além da desembargadora Tereza Asta, participou do evento o juiz José
   Roberto Dantas Oliva, titular da 1ª Vara do Trabalho de Presidente Prudente

Com informações da Seção de Redação e Conteúdo do TRT-2

Aconteceu na manhã da última sexta-feira (30/05) o seminário "Justiça do Trabalho e o Combate ao Trabalho Infantil", no auditório principal do Fórum Trabalhista Ruy Barbosa. O evento contou com a participação de magistrados e especialistas, que falaram para uma plateia diversificada.

A mesa de abertura do seminário contava com diversos convidados e também com alguns dos palestrantes. Ela foi presidida pela desembargadora Silvia Devonald, vice-presidente administrativa do TRT-2, que comentou: "ambiente de trabalho para criança é a escola, e seu instrumento de trabalho, livros e brinquedos". Após breves palavras do diretor da Escola Judicial do TRT-2 (Ejud-2), desembargador Carlos Roberto Husek, a desembargadora Tereza Aparecida Asta Gemignani, vice-diretora da Ejud do TRT-15 (Ejud-15), pronunciou-se: "esta luta contra o trabalho infantil atinge uma proporção considerável, porque às vezes há uma resistência, da família do menor e até do próprio menor".

Também se manifestaram a presidente da Amatra-2, juíza Patrícia Almeida Ramos, e a desembargadora Ivani Contini Bramante, coordenadora da Comissão de Erradicação do Trabalho Infantil e de Proteção ao Trabalho Decente do Adolescente do TRT-2, que, ao final de seu discurso, anunciou o início das exposições.

As palestras

Foi possível perceber uma linha comum em todas as palestras proferidas: elas chamaram a atenção para a necessidade de ações efetivas de combate e também para consciência do quanto o problema é arraigado na sociedade, a ponto de algumas de suas variações e modalidades passarem como relativamente inofensivas.

A ministra do TST Kátia Magalhães Arruda, em sua palestra, expôs a dicotomia com a qual o problema é lidado: o que está no papel – as muitas leis e fundamentos jurídicos de proteção: convenções internacionais, tratados, a própria Constituição Federal, o ECA (Estatuto da criança e do adolescente) e a CLT – e o que efetivamente existe no mundo real: cerca de 3,6 milhões de crianças no trabalho infantil, muitas delas em regime análogo à escravidão.

A ministra disse também que, ao contrário do senso comum, é um mito achar que quanto mais cedo a criança começar a trabalhar, melhor; na verdade, é exatamente o contrário: quanto mais cedo a criança for inserida no mercado de trabalho, menor é a chance de ela se tornar um adulto com um trabalho digno. A relação para esse fato é bastante óbvia, e a palestrante trouxe dados: 90% das crianças que trabalham têm defasagem escolar.

Outras falácias foram demolidas nessa palestra: "é melhor a criança trabalhar do que roubar" – ambas as atividades são ilícitas, e não se trata de optar pela menos danosa: a criança precisa ser educada; "só cresce na vida quem trabalha cedo" – além de ser infundado, traz mais um agravante: é duas vezes maior a chance de uma criança se envolver num acidente de trabalho do que um adulto, e causar danos irreversíveis e até mesmo óbito.

A palestra do juiz do trabalho José Roberto Dantas Oliva, da 15ª Região, acrescentou à discussão alguns argumentos e exemplos ao falar sobre a competência para apreciar pedidos de autorização para o trabalho antes da idade mínima – que, na opinião dele, e em conformidade com convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT), deveria subir gradualmente, e passar dos atuais 16 anos (e 14 anos para aprendizes) para 18 anos.

Como a competência dessa apreciação é da Justiça do Trabalho, o palestrante falou sobre algumas excepcionalidades, como a autorização para o artista infanto-juvenil – que deve ser individual e cuidadosamente clausulada, antecipando todos os cuidados especiais da situação.

Já o palestrante Marcelo Pato Papaterra Limongi, professor e ator, deu outra perspectiva: a do profissional das artes cênicas, que luta pela "proibição total e imediata do trabalho artístico infantil", conforme citou. Seus argumentos versaram sobre o desgaste desnecessário e traumático aos quais as crianças são expostas em atividades artísticas. Ilustrou essa posição com cena emblemática do filme "Cidade de Deus", do cineasta Fernando Meirelles, no qual uma criança escolhe qual outra criança assassinará, numa espécie de "ritual de passagem".

O professor embasou essa posição com sua larga experiência nas artes cênicas, e retomou fala da ministra Kátia Arruda, que havia dito que "no nosso caso, para nossos filhos, nós atrasamos o ingresso deles ao mercado de trabalho, preferindo que estudem e se capacitem antes": ele perguntou qual pai exporia seu filho a encenar algo como aquela cena.

Complementou o seminário a fala da procuradora do trabalho Margaret Matos de Carvalho, da 9ª Região (PR), que apresentou diversos casos de atuação contra o trabalho infantil naquela jurisdição e também em âmbito nacional. A procuradora, na esteira do dito pelo professor Marcelo Papaterra, disse que "ainda se vê o trabalho como um mal menor", mas do qual se desconhece os bastidores: atores mirins explorados, crianças em sobrejornada, mesmo fazendo algo que aparentemente gostam, dentre outros.

A procuradora pugnou pela "busca ativa" – uma abordagem social que tenta solucionar o grave problema indo aos locais onde ele costuma eclodir, e solicitou que todos os que pudessem baixassem o aplicativo "Proteja Brasil" para smartphones, criado para facilitar denúncias e informar sobre violência contra crianças e adolescentes. Esse pedido retomou outra fala da palestra da ministra Kátia Arruda – que disse que a exploração infantil cresce em eventos esportivos de grande porte.

A procuradora Margaret Carvalho encerrou sua participação falando sobre o caso "ACP Sapé", de exploração sexual infantil, e o cuidadoso levantamento da rede de exploração, cujo destinatário final (que não pode ser chamado de "cliente", já que pessoas não são mercadorias) eram parlamentares, policiais, e homens da elite – todos exploradores e coniventes na mesma conduta vergonhosa.

O último ato do seminário foi a leitura, feita pela juíza Sandra Miguel Abou Assali Bertelli, de quatro enunciados assumidos como compromissos pelo TRT-2, que versavam sobre maneiras efetivas de se combater o trabalho infantil.

Interligações e linha comum

Assim, a linha comum de todo o exposto no seminário ficou bastante evidente: talvez seja necessário uma mudança cultural na sociedade, que ainda aceita modalidades de trabalho infantil, como uma alternativa a outras práticas ilegais. O argumento econômico para crianças trabalharem também não merece prosperar – a ministra Kátia Arruda disse que "o crescimento econômico não é um fim em si mesmo; é necessário um objetivo", e este deve passar pela educação de qualidade para todas as crianças, e sua preparação para que se tornem, no devido tempo, trabalhadores e cidadãos dignos.

E a ministra indicou um caminho possível para se conseguir esse intento: "evoluir da enunciação dos direitos para a efetiva concretização deles", porque "o trabalho infantil destrói o tecido social, viola a dignidade humana e agrava, junto com o trabalho escravo, a precarização do trabalho".

A programação da Ejud-2 sempre disponibiliza eventos como esse, em geral abertos a todos os interessados, bastando que se inscrevam e compareçam. Eventuais parcerias com as comissões do TRT-2, com a Ejud-15 e com a Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região (Amatra-2) ampliam a gama e a abrangência dos temas.

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