Em Jacareí, servidores da JT conciliam o trabalho com a música, a literatura e a defesa dos animais

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Por Luiz Manoel Guimarães

Jacareí, no Vale do Paraíba, conta hoje com 225 mil habitantes aproximadamente, segundo o IBGE. A jurisdição da Justiça do Trabalho local abrange também os municípios de Santa Branca e Igaratá, totalizando cerca de 247 mil pessoas atendidas pelo Fórum Trabalhista, que fica no nº 9 da Rua 3 de Abril e inclui duas varas do trabalho (VTs), além da Central de Mandados, onde militam os oficiais de justiça, e da Coordenadoria de Distribuição de Feitos (CDF). O Grupo Móvel da Presidência de Atenção às Unidades de Primeira Instância (GMP) visitou o Fórum e se reuniu com os servidores de todas essas áreas. Criado pelo presidente do TRT da 15ª Região, desembargador Flavio Allegretti de Campos Cooper, como um canal direto de comunicação entre o 1º grau da Justiça do Trabalho da 15ª e a Presidência do Tribunal, o GMP é coordenado pelo juiz Flávio Landi. O Grupo visitará, até o próximo mês de dezembro, quando termina a gestão do desembargador Cooper, todas as VTs, CDFs, postos avançados, centrais de mandados e ambulatórios médicos do Regional, identificando demandas e criando oportunidades de aprimoramento.

Energia de menina

Maria Ilda de Andrade Pires, 30 anos de Justiça do Trabalho, é servidora da 1ª VT de Jacareí. Nascida em Santa Branca, lá mesmo no Vale do Paraíba, formada em direito e orgulhosa de seus 64 anos, ela não faz por menos quando o assunto são os planos para o futuro. "Quero viver 92 anos e vou acontecer no artesanato", vaticina Maria Ilda, cujas habilidades manuais já foram testadas inclusive no curioso emprego de "consertadora" de guarda-chuvas, quando tinha apenas 16 anos, numa loja que vendia e reformava o nosso velho companheiro de dias chuvosos. A servidora ainda lembra de como conquistou a vaga. Ante a famosa pergunta "quando você pode começar?", vinda do futuro patrão, ela não titubeou e emendou um "agora!" num tom firme de quem tem por lema "ver a vida de maneira positiva", como assegura Maria Ilda.

Foi para contar um pouco dessa trajetória encarada de maneira afirmativa que ela escreveu A Caminho da Luz, livro que reúne uma coletânea de textos que "passam a limpo" a história da autora, como ela mesma diz. A obra foi lançada de forma independente em 2003. "Tudo em minha vida vem como um desafio, para eu ir além", sublinha Maria Ilda, que, depois de encerrar sua carreira na JT – a aposentadoria deve ocorrer ainda este ano –, pretende retomar o ofício de escritora.

Ilda resolveu emprestar sua positividade também ao Centro de Valorização da Vida, o CVV, que, em 20 de dezembro passado, completou 40 anos como entidade de utilidade pública federal (Decreto-Lei nº 73.348). A entidade atua na prevenção do suicídio, graças ao trabalho de milhares de voluntários, e, durante um ano e meio, aproximadamente, enquanto a correria do dia a dia permitiu, Ilda foi um deles. "O mais bonito de tudo nesse trabalho é o respeito", enfatiza a servidora. "O CVV adota a linha de Carl Rogers [psicólogo norte-americano], atuando de forma a tentar orientar a pessoa que o procura, e nunca no sentido de direcioná-la a fazer isso ou aquilo. Agir de outra maneira seria menosprezar a capacidade que cada um tem de decidir sua própria vida."

Segundo a servidora, o trabalho do voluntário do CVV é essencialmente um "ouvir participativo", em que há interação com a pessoa que recorre ao Centro. "À medida que ela se sente acolhida, começa a rever o seu interior e, no final, percebe que a solução está nela mesma", afirma. Além disso, o sigilo é absoluto, garante ela. "Não falamos sobre quem nos liga nem para os nossos familiares."

Criada na música

Mineira de Itajubá, Maria do Carmo Noronha Serpa, da CDF de Jacareí, completou 10 anos na JT da 15ª em junho passado. Nesse período, cursou pedagogia, investindo numa antiga vocação: lecionar. Formada também em piano e em educação musical pelo Conservatório Estadual de Música Juscelino Kubitschek de Oliveira, de Pouso Alegre, MG, ela começou a ensinar em sua casa, em 1974, num piano Brasil do tipo "armário", a arte de dominar o instrumento que se tornou companheiro inseparável de nomes como os americanos Burt Bacharach, Ray Charles, Duke Ellington, Jerry Lee Lewis, Liberace e Little Richard, e os brasileiros João Carlos Martins, Arthur Moreira Lima, Nelson Freire e Pedrinho Mattar, para ficar apenas em

alguns dos mais populares. O rol de alunos de Maria do Carmo incluía pessoas dos cinco anos à meia-idade e, além do piano clássico, ela ensinava violão e teclado no estilo popular. Beethoven, Villa Lobos, Ernesto Nazareth e Tom Jobim estão entre os seus músicos favoritos, mas ela também não dispensa Caetano e Chico, "tanto na música quanto na poesia".

A atividade musical, aliás, que Maria do Carmo iniciou muito cedo, aos seis anos, em seus primeiros acordes como aluna de piano, rendeu-lhe características que ultrapassaram as fronteiras da música, repercutindo inclusive em sua rotina na Justiça do Trabalho. "A disciplina necessária ao estudo da música eu trouxe aqui para a JT. Graças a isso eu consigo me organizar para trabalhar de maneira mais eficiente", assegura Maria do Carmo, para quem a música concretiza de forma robusta o conceito de "unir o útil ao agradável".

O ingresso no serviço público, no entanto, privou a servidora de tempo para se dedicar ao ensino do piano e companhia, paixão que, com a aposentadoria que já se avizinha, Maria do Carmo pretende retomar. "Muita gente me procura", garante ela, orgulhosa. Por outro lado, a servidora, que já concluiu, inclusive, uma pós-graduação em direito do trabalho e processo do trabalho, encontrou na JT outra fonte de satisfação. "Sinto-me realizada trabalhando aqui."

Outra de suas grandes aspirações, ser mãe, também foi realizada plenamente. Eduardo, Rodrigo e Bruno, seus três filhos "lindos e maravilhosos", como a servidora sublinha, são, respectivamente, servidor do TRT da 4ª Região (RS), engenheiro agrônomo e médico veterinário. "É uma delícia ser mãe", derrete-se Maria do Carmo.

Perita em empatia

Outra que veio das Minas Gerais, mas de Lambari, também no sul do estado, Elani Ribeiro de Aquino chegou a Jacareí aos sete anos. Em 1987, ingressou no quadro de servidores da Prefeitura do município e foi lotada no protocolo-geral. "Gol de placa": a vocação de Elani parece ser, justamente, lidar com o público. Cedida à Justiça do Trabalho da 15ª, passou a trabalhar no balcão da secretaria da 2ª VT local, no atendimento a partes, advogados, estagiários, testemunhas e peritos.

"O início foi difícil", observa a servidora. "Depois de 21 anos de experiência na Prefeitura, tive de aprender tudo do zero. Foi preciso ser persistente, mas eu gosto que me desafiem, e a forma como os colegas da VT me receberam ajudou muito", pondera ela. "Houve muito apoio. Sempre que eu tinha uma dúvida, recorria a um dos colegas, e eles nunca me negaram auxílio."

Elani (à esq. na foto) contou também com a experiência de sete anos de trabalho como secretária num escritório de advocacia, anteriores ao ingresso no serviço público, mas sua habilidade natural em cativar as pessoas é o ingrediente principal de seu sucesso na VT, garante a colega Simara Kinupe de Moraes (à dir. na foto). "Ela é uma ‘encantadora' de advogados, é muito querida por eles, e uma inspiração para a gente, colegas da VT", afirma Simara, que, contudo, ressalva que Elani sabe ser firme sempre que necessário. "Se preciso, ela ‘chama as pessoas à realidade'."

"Descobri que gosto de trabalhar com o público. Não sei se eu ficaria feliz atrás de uma mesa, sem lidar com gente" conclui Elani, para quem um dos segredos do êxito nesse tipo de atividade "é respeitar o jeito de ser de cada um". Nesse sentido, sensibilidade é um fator essencial, leciona a servidora, mas todo o processo começa, defende Elani, com o que ela chama de "administrar a si mesmo". "Primeiro é preciso cuidar de si, fortalecer-se, estar bem consigo mesmo, para poder passar bons sentimentos para as outras pessoas", explica.

Discípula de Francisco de Assis

Já que a mencionamos, vale a pena falar um pouco mais de Simara Kinupe de Moraes. Nascida em Volta Redonda, no sul do Estado do Rio de Janeiro, ela está na JT da 15ª desde maio de 2005, sempre em Jacareí. Na época, o município possuía apenas uma vara do trabalho. Hoje, Simara é a mais antiga da equipe de servidores da 2ª VT da cidade e exerce a função de assistente de cálculos.

Formada em direito (2001) pela Fundação Educacional D. André Arcoverde, de Valença (RJ), Simara tentou inicialmente a advocacia. "Mas não gostei e passei a fazer concursos para a Justiça do Trabalho e para a Justiça Federal", lembra ela. "Na JT, no entanto, Simara garante ter se adaptado muito bem. "Gosto muito de trabalhar aqui", afirma ela, cujos planos futuros incluem pelo menos mais um concurso, mas seguindo na área. "Quero tentar o cargo de auditor fiscal do trabalho."

Em 2011, dois cachorrinhos deixados na casa onde funciona a CDF do Fórum Trabalhista deram origem a um trabalho que Simara não largou mais. Desde então, ela é voluntária no Clube Amigo Vira-Lata (CAV) de São José dos Campos (cidade onde Simara reside). A entidade resgata cães e gatos abandonados e os encaminha para adoção. De 2006 a 2013, foram adotados, graças ao trabalho do CAV, cerca de 3.600 animais.

O trabalho dos voluntários é cuidar dos bichos resgatados até que eles estejam em condição de serem adotados. Os candidatos a fazer parte de uma família são levados aos Centros de Adoção (confira os endereços em clubeamigoviralata.com.br) tratados de qualquer doença de pele, comuns em casos de abandono, bem como vermifugados e não sem antes tomar um belo banho, para ficarem devidamente "apresentáveis" aos seus futuros "mamães, papais e irmãos". Os que têm mais de quatro meses já vão para os Centros castrados e vacinados, inclusive. Abaixo dessa idade, a castração pode ser feita pelos próprios adotantes numa das clínicas conveniadas ao CAV, nas quais o serviço é feito a preços acessíveis.

Simara calcula já ter salvo pessoalmente do abandono mais de 20 cachorros. Dois deles, Negão e Lara, ambos com 7 anos atualmente, simplesmente "se recusaram a me deixar", brinca ela, e se juntaram a Emma, 11 anos, como parte da família da servidora, que sofre com a forma como o bicho-homem não raramente trata outras espécies. "A posse irresponsável é o problema", denuncia.

"A vida inteira tive cachorros", observa Simara. Ela se lembra especialmente de Perebas, que lhe surgiu um dia muito doente e totalmente estressado. "Nem dava para ver que era um poodle, de tanta sarna", recorda ela. Mas o sortudo Perebas se recuperou e, até falecer, seis anos mais tarde, foi mais um dos inseparáveis companheiros de Simara.

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