Ex-executiva de empresa que atua com vendas de cosméticos em domicílio consegue vínculo empregatício
Por Ademar Lopes Junior
A 11ª Câmara do TRT-15 reconheceu o vínculo de emprego de uma executiva de uma empresa que atua em vendas de cosméticos, em domicílio, dando assim provimento ao recurso da trabalhadora, que teve sua ação julgada improcedente, em primeira instância, pelo Juízo da Vara do Trabalho de Capivari. O acórdão, que teve como relator o desembargador João Batista Martins César, determinou ainda o retorno dos autos à origem para que todos os pedidos correlatos fossem apreciados.
Durante quase quatro anos, a reclamante trabalhou para a empresa como executiva de vendas, sem que o contrato de trabalho fosse anotado em sua CTPS. A trabalhadora afirmou em seu recurso que "sempre estiveram presentes todos os requisitos necessários para a configuração de uma relação empregatícia". Ao ser imotivadamente demitida, não recebeu as verbas rescisórias. Afirmou também que durante o tempo que esteve à disposição da reclamada, sempre usou o próprio veículo, sem nenhum reembolso pelas despesas com o carro nem com o combustível.
A reclamada, por seu turno, esquivou-se pontualmente das razões apresentadas pela reclamante, apresentando contrarrazões de recurso ordinário, e afirmou apenas, em sua defesa, que "a reclamante exercia a função de executiva de vendas, trabalho caracterizado pela autonomia".
O acórdão afirmou, inicialmente, que "nos casos em que se discute o vínculo existente entre os chamados vendedores 'porta a porta' e as empresas fabricantes de cosméticos, a análise dos requisitos da relação de emprego deve ser diferenciada, apta para atender as peculiaridades fáticas do caso". Também salientou que a reclamante é "pessoa protegida pelo Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/2003)", o que vale dizer que ela "desfruta de proteção integral (art. 2º) e que tem absoluta prioridade no que toca à efetivação de seu direito fundamental ao trabalho (art. 3º, caput)".
O colegiado partiu da análise dos requisitos da pessoalidade e da pessoa física, habitualidade, subordinação e onerosidade, necessários para o reconhecimento do vínculo empregatício. Segundo a Câmara, todos esses pressupostos estariam presentes na relação de trabalho entre a executiva de vendas e a empresa. A pessoalidade, segundo o acórdão, fica "evidente, pelo fato de a reclamante ser pessoa física, isso porque foi ela quem "assumiu os encargos da função de ‘executiva de vendas' e ‘revendedora', inclusive formando sua equipe de vendedoras e ajudantes, sujeitando-se, ainda, ao cumprimento das normas impostas pela reclamada". A própria preposta da reclamada afirmou, nos autos, que para passar um pedido a revendedora tinha que "ter vendido pelo menos R$ 80". Trata-se, assim, "de meta imposta pela reclamada à reclamante". O colegiado ressaltou, para esclarecer qualquer dúvida a respeito, que um dos documentos dos autos, em uma de suas linhas, apresenta a seguinte indagação: "Atingiu requisitos? Sim", o que comprova, segundo afirmou o colegiado, uma "situação de pessoalidade e de subordinação".
Quanto à onerosidade, a Câmara ressaltou que a forma como era constituída a remuneração da reclamante, exclusivamente com base em comissões incidentes sobre os valores das vendas, "além de confirmar a onerosidade, realça o atendimento aos demais pressupostos".
Por fim, sobre a subordinação, o acórdão entendeu que "o fato de a reclamante exercer suas atividades na rua, fora da sede da reclamada, não leva à conclusão de que seu trabalho era autônomo". Pelo contrário, "no caso dos vendedores 'porta a porta' de cosméticos, a necessidade de atingir metas faz com que grande parte da rotina seja realizada ao ar livre", afirmou, acrescentando também que "decorrência lógica dessa constatação fática diz respeito à possibilidade, inerente à função, de a reclamante organizar seu horário de trabalho da maneira que melhor lhe convier", o que se coaduna com a previsão contida no art. 62, inc. I, da CLT, "afastando a alegação de que a falta de controle de horários por parte da reclamada afasta a subordinação necessária à relação de emprego", concluiu. Além disso, também "a subordinação estruturante encontra-se presente no caso", até porque, "se a reclamante era executiva de vendas e revendedora e se a reclamada possui como objeto social o ‘comércio, distribuição, importação e exportação de cosméticos', não há dúvida de que a reclamante se inseria na estrutura de funcionamento da Avon Cosméticos Ltda.".
O acórdão ressaltou ainda que "a própria reclamada admitiu a prestação de serviço, negando, apenas, sua natureza empregatícia". Por tudo isso, o acórdão reconheceu como caracterizada a relação de emprego, salientando que a reclamada "adota uma estrutura de funcionamento bastante capciosa e exclusivamente baseada em subterfúgios de ordem formal para afastar a possibilidade de caracterização de eventuais vínculos de emprego".
Nesse sentido, o acórdão concluiu que, a exemplo de outras empresas do mesmo segmento, "que tanto se vangloriam por propagar o desenvolvimento de uma atividade supostamente sustentável, a Avon se esquece que a sustentabilidade também inclui o aspecto social". O acórdão acrescentou que "toda sustentabilidade que se baseia unicamente em questões ambientais peca pela falsidade da falácia" e afirmou que "não existe sustentabilidade que não inclua a valorização do trabalho humano, além da preservação do meio ambiente, para sua caracterização". Segundo a Câmara, "infelizmente, não é o que faz Avon, haja vista a evidente precarização das relações de trabalho levada a cabo pelo seu sistema nefasto de fixação de ‘parceria' com as revendedoras", concluiu (Processo 0000602-12.2012.5.15.0039).
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