GMP: em Ourinhos, servidores se mantêm “em ordem” graças ao esporte e ao contato com a natureza
Com aproximadamente 110 mil habitantes, Ourinhos, no sudoeste paulista, já na divisa com o Paraná, conquistou sua autonomia em 20 de março de 1919. A cidade recebeu o Grupo Móvel da Presidência de Atenção às Unidades de Primeira Instância (GMP), criado pelo presidente do TRT da 15ª Região, desembargador Flavio Allegretti de Campos Cooper, para ser um canal direto de comunicação entre o 1º grau e a Presidência da Corte. Coordenado pelo juiz Flávio Landi, o GMP desenvolve atividades que incluem uma reflexão conjunta acerca da qualidade de vida pessoal e profissional. Os servidores de cada unidade visitada são convidados a responder um questionário com temas como relações interpessoais no trabalho e sintomas e fontes de estresse. Posteriormente, recebem um feedback com as conclusões das especialistas do Grupo no tema, a psicóloga Juliana Barros de Oliveira e a assistente social Maria Angela Caparroz Arelano Cordeiro.
O GMP também registra demandas de caráter estrutural ou administrativo, por intermédio da servidora Maria Auxiliadora Ortiz Winkel, assistente da Presidência do Regional. Já os problemas relativos à área de segurança são analisados pelos agentes Luís Cláudio da Silva e Jenner Eduardo dos Santos, que também integram a equipe. Outra missão do Grupo é traçar um perfil dos servidores da 15ª. A proposta é mostrar quem são e como vivem esses profissionais, ou pelo menos uma parte deles, que, espalhados por unidades instaladas em cerca de 110 cidades paulistas, são mais de quatro mil, somando os do próprio quadro do Regional com os cedidos por outros órgãos públicos.
Ourinhense por opção
É o caso, por exemplo, de Santiago Angulo Jaime, diretor da secretaria da VT de Ourinhos e um dos mais antigos servidores da 15ª Região, com 33 anos de carreira recém-completados. Paranaense de Nova Esperança, município do norte do estado, ele morou em Maringá e em Arapongas, antes de chegar ao Estado de São Paulo. Por aqui, morou primeiro em Assis, mas aos 17 anos já estava em Ourinhos, onde, aos 18, conseguiu seu primeiro emprego, como contínuo no extinto Banco Mercantil de São Paulo. "Uma das coisas que eu fazia era sair à rua de bicicleta devolvendo cheque sem fundo. Depois, passei a escriturário e, com um ano e meio de trabalho, ia ser promovido a chefe de seção, quando recebi o telegrama do TRT."
Por TRT entenda-se o da 2ª Região, o único que existia no Estado de São Paulo em 1981, quando Santiago recebeu o tão esperado telegrama, o e-mail da época. Em 19 de outubro daquele ano ele assumiu seu posto na então 2ª Junta de Conciliação e Julgamento (JCJ) – denominação dada naqueles tempos às atuais varas do trabalho – de São Paulo. Sorte que havia por perto a tia Irene, em cuja casa, na Avenida D. Pedro I, perto do Museu do Ipiranga, o a essa altura servidor público moraria em sua passagem pela capital. Mas foram apenas dois meses lá – em dezembro Santiago já estava de volta à sua Ourinhos, na JCJ da cidade, então com apenas dois anos de existência.
Hoje com 25 – a inauguração foi em 28 de abril de 1979 –, a VT está instalada na Rua Paulo Sá, 565, e atende também outras sete cidades da região: Campos Novos Paulista, Canitar, Chavantes, Ibirarema, Ribeirão do Sul, Salto Grande e São Pedro do Turvo. São cerca de 160 mil pessoas jurisdicionadas no total.
Em 2013, a unidade experimentou um expressivo crescimento na demanda, segundo a Coordenadoria de Estatística e Pesquisa do TRT-15. De 1.396 processos recebidos em 2012, houve um salto para 2.106 no último ano. Em termos percentuais, o aumento foi de 50,86%.
Jogo de cintura
Santiago se formou em direito em Jacarezinho, cidade paranaense separada de Ourinhos pelo Rio Paranapanema. Sua primeira experiência na direção de secretaria foi em Andradina, onde ele assumiu a função em 29 de outubro de 1990. Pesou a favor de sua nomeação a recomendação de duas pessoas que conheciam bem o seu trabalho em Ourinhos, o então juiz presidente da JCJ, Voldir Franco de Oliveira, que se aposentou em 1995, e o diretor da secretaria à época, Juliano Aguiar de Carvalho, um colega que ensinou muito a Santiago, como nosso entrevistado enfatiza, e que acabou falecendo aos 35 anos, vítima de um câncer de estômago.
E lá se foi Santiago para Andradina. Venceu os 370 quilômetros de casa até a cidade em sua Honda ML 125 cc, solitariamente. A família, à época restrita à esposa, a dentista Ivone, e ao primogênito, Rafael, hoje com 24 anos, mudaria logo depois, em janeiro de 1991. Mas, com a aposentadoria precoce de Juliano dois anos depois, causada pela doença, Santiago foi nomeado diretor em Ourinhos, assumindo o posto em 2 de agosto de 1993.
A caminho de completar 25 anos como diretor de secretaria, o servidor adverte que a tarefa não é fácil. "É preciso ter muito ‘jogo de cintura' e ser um pouco ‘psicólogo' também. Além disso, tecnicamente falando, o diretor deve estar sempre atualizado a respeito da legislação com que trabalha. Não só ele, aliás, mas a equipe como um todo." É igualmente fundamental, defende Santiago, o bom relacionamento com o juiz, com as partes e com os advogados. Estes últimos, diz ele, "são parceiros da Justiça". "A busca é a mesma: a solução do processo." Já no contato com trabalhadores e empregadores, o servidor preconiza cuidado na comunicação, sobretudo no que diz respeito ao uso de termos técnicos. Ele entende ainda que eleger prioridades, concluindo primeiro o que é mais urgente, é outro elemento de importância capital para o bom funcionamento da secretaria.
À beira do rio
A exemplo de vários outros diretores de secretaria entrevistados por ocasião da visita do GMP, Santiago não ignora a importância de investir na saúde e no condicionamento físico para fazer frente ao volume e à complexidade de seu trabalho. Fora do expediente, ele pratica natação duas vezes por semana há mais de 20 anos, e há 10 faz academia, com a mesma frequência com que nada.
Se nem só do físico vive o homem, para manter a cabeça em ordem Santiago conta com um refúgio que lhe é muito especial, uma chácara às margens do Paranapanema, seu pequeno e bem cuidado éden, com direito a quadra de basquete e casa avarandada. E está "logo ali". "Do Centro de Ourinhos ao rio são só cinco quilômetros", diz ele.
Curiosamente, o diretor afirma que não gosta de pescar. No Paranapanema, o que Santiago aprecia mesmo é andar de barco, rebocando os filhos no esqui – além de Rafael, o casal também tem agora Laura, 20 anos, e Arthur, 17. "Eles adoram esqui aquático." Mas o mais prazeroso na chácara para Santiago é algo bem menos movimentado. "Gosto mesmo é de sentar na varanda e ver o rio passar, observando os pássaros com um binóculo." Entre as aves que costuma avistar no local estão o tucano e a maracanã, também conhecida como ararinha ou arara-pequena, entre outros nomes. Um dos habitats favoritos da espécie, segundo especialistas, é justamente as proximidades de rios. Da mesma família dos papagaios, de plumagem também predominantemente verde, com algumas manchas vermelhas e azuis, ela se diferencia principalmente pela cauda longa e pontuda e também pode ser vista na Mata Atlântica, no Cerrado e na Caatinga. É mais uma espécie cuja existência está ameaçada pela progressiva redução de seus habitats e pelo comércio ilegal de animais silvestres.
Atenção às pessoas também
Santiago também se dedica ao Grupo de Incentivo e Apoio à Adoção da Região de Ourinhos (Giaaro), entidade da qual sua esposa é fundadora e presidente. Desde 1994, o Grupo divulga e estimula a prática da adoção, oferece orientação para futuros pais adotantes e acompanha quem já constituiu uma nova família dessa forma. "No Brasil há muitas crianças que não são adotadas porque fogem ao padrão pretendido pela maioria dos casais", sublinha Santiago.
O Giaaro gerencia a Casa Abrigo Arco-Íris, para crianças e adolescentes de até 18 anos em situação de risco. "A primeira tentativa", explica o servidor, "é reconstruir os laços familiares. A criança só fica disponível para a adoção em último caso, se realmente não for possível o seu retorno à família".
Entidade reconhecida como de utilidade pública nos níveis municipal, estadual e federal, a Casa abriga atualmente de 15 a 25 crianças e, além dos subsídios governamentais, conta com doações para completar seu orçamento. Mas, segundo Santiago, conquistou status de modelo na área. "Vêm pessoas de outras cidades e até de outros estados para ver como ela funciona", garante ele, que, uma vez por ano, participa junto com a esposa e outros membros do Giaaro de um encontro nacional de grupos de apoio à adoção.
Santiago, a propósito, no que diz respeito ao trabalho em prol de crianças e adolescentes carentes, afirma ser apenas um aplicado coadjuvante. A protagonista, no caso, é Ivone. "Ela faz palestras a respeito, é uma referência no assunto", garante o orgulhoso marido. "Participou, inclusive, da elaboração da Lei 12.010, de 2009, que dispõe sobre a adoção, prestando consulta aos parlamentares, e foi uma das 10 finalistas do ‘Prêmio Claudia' em 2000." Promovido por uma revista feminina de grande circulação no País, com tiragem mensal de mais de 400 mil exemplares, o prêmio é concedido desde 1996 "a mulheres competentes, talentosas, inovadoras e empenhadas em construir um Brasil melhor", segundo seus organizadores.
Corrida para a saúde
Natural de Lupércio, município da região de Marília, Angelo Pereira mora em Ourinhos desde os quatro anos. Seu primeiro emprego foi numa fábrica de tacos, em 1971, quando tinha 16. Prestou o serviço militar, foi metalúrgico e operário da construção civil e ainda trabalhou nos Correios, como auxiliar de serviços postais, até ingressar no quadro de servidores da Prefeitura da cidade, em 1977. Com a inauguração da então JCJ local, dois anos depois, foi cedido pela primeira vez à Justiça do Trabalho, mas voltou à Prefeitura em 1982. Só em abril de 1987 retornaria à Justiça do Trabalho, na qual permanece até hoje.
Sua contribuição à JT não se resume à condição de servidor, aliás. Um dos fundadores do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais e Autárquicos de Ourinhos, Angelo foi juiz classista na JCJ por cinco anos, de 1992 a 1997 (o cargo foi extinto pela Emenda Constitucional 24, de 1999). Atualmente, ele é o responsável pelo atendimento ao público no balcão da VT e assegura ter "um relacionamento muito bom com os advogados e as partes".
Ex-atleta – foi fundista e maratonista –, Angelo começou a correr aos 18 anos. Um mês depois, já estava em sua primeira corrida, de oito quilômetros, na própria Ourinhos. Nos 5 mil e 10 mil metros, representou a cidade por mais de 10 anos, em competições no Estado de São Paulo. "Fiquei muitas vezes entre os 10 primeiros." Também disputou a Maratona do Rio. Em 1983, com o tempo de 2h37min36, foi o 76º colocado, entre aproximadamente oito mil participantes. No ano seguinte, já cursando educação física na Universidade de Marília (Unimar) – formou-se em 1986 – e sem treinar adequadamente, não ficou "nem entre os 300 primeiros", como lembra ele, que, no entanto, afirma jamais ter deixado de completar uma prova.
Hoje, aos 59 anos, com peso e pressão em ordem, conforme ele garante, Angelo corre de 30 a 40 minutos diários. "É só para manter a forma. Correr me desestressa e me dá uma grande sensação de bem-estar. Eu me mantenho saudável graças ao esporte." Angelo também nunca fumou e só bebe "socialmente".
Para quem estiver pretendendo começar a correr, o servidor reforça as recomendações que médicos e outros profissionais de saúde costumam fazer. "É preciso se aquecer antes de iniciar e fazer alongamento ao final. Além disso, é importante ir aos poucos – 10, 15 minutos por dia no início, o quanto a pessoa suportar sem um esforço exagerado. O primordial, no entanto, é fazer todos os exames médicos necessários antes de começar."
Também na Unimar, Angelo se formou em direito, em 2000, e neste domingo, 16 de novembro, fará a prova da primeira fase do exame da OAB. Os planos pós-aposentadoria incluem "pular" para o outro lado do balcão, passando de servidor a advogado. (Com informações da Prefeitura de Ourinhos, do Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal – Cepam – e do IBGE)
Por Luiz Manoel Guimarães
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