Trabalho infantil: tragédia

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 Os jovens representam de 30% a 40% dos acidentes de trabalho, na contramão da luta pela erradicação do trabalho infantil

Inúmeras situações lamentáveis e tragédias são relatadas frequentemente ao MPT

Por SheilaVieira DA AGENCIA ANHANGUERA/ sheila@rac.com.br

Apesar dos avanços no combate ao trabalho infantil—redução de 9 milhões de casos para 3,7 milhões em um intervalo de doze anos—o cenário ainda é preocupante. Inúmeras situações lamentáveis e tragédias são relatadas frequentemente ao Ministério Público do Trabalho e a outros órgãos fiscalizadores. O desembargador João Batista Martins César, do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, relata que casos tristes envolvendo desrespeito à criança e ao adolescente são comuns e muitas vezes com traumas físicos e psicológicos que marcarão para sempre a vida daquele indivíduo.

Recentemente em Sorocaba, o magistrado se recorda do caso de uma jovem aprendiz de 15 anos, que cumpriu um expediente muito além das quatro horas previstas e devido ao cansado deixou cair uma garrafa e ficou cega com o caco. Terá de conviver com uma prótese pelo resto da vida. "O que mais preocupa são os acidentes de trabalho com jovens. Eles acabam se envolvendo nessas ocorrências por não ter domínio das proporções do físico e nem a visão completamente desenvolvida, principalmente a panorâmica.",diz o magistrado.

Pesquisas apontam que os jovens representam de 30% a 40% dos acidentes de trabalho no País e, na contramão da luta pela erradicação do trabalho infantil, as autoridades enfrentam também uma sociedade que traz enraizada em sua cultura o conceito equivocado de que o trabalho é bom para o jovem e adolescente.

A cada dia, mais de cinco crianças e adolescentes são vítimas de acidentes de trabalho no Brasil. A cada mês, pelo menos uma criança ou adolescente morre no trabalho no país. Levantamento do Ministério da Saúde, com base nas notificações de unidades de saúde, lista 13.370 acidentes de 2007 a outubro de 2013 com trabalhadores de até 17 anos. Deste total, 504 foram intoxicações, principalmente com agrotóxicos. E 119 morreram trabalhando. "O trabalho não é bom. O melhor seria termos uma sociedade que cobrasse escolas em tempo integral e atividades no contraturno como alternativa à permanência na rua", defende.

A classe média tem consciência de que a escola melhora a chance de êxito e sucesso profissional

Em várias situações exercer uma atividade no mercado aumenta os riscos e a vulnerabilidade da criança. "Uma dissertação de mestrado realizada com detentos do Carandiru revelou que 80% começaram a trabalhar cedo, o que significa que a inserção precoce no mercado não evita a criminalidade", reforça.

Estar nas ruas ou em atividades com contato com o público deixa a criança e o jovem mais vulneráveis aos abusos, drogas e má influência. Há ainda o impacto no aproveitamento escolar e na gravidez precoce.

Outro dado interessante, lembra, é de um estudo da Fundação Itaú Social que aponta que quanto mais cedo o jovem começa a trabalhar menor é a remuneração que irá receber durante toda sua vida profissional, prejudicando uma digna inserção no mercado de trabalho. "Cada ano a mais na escola representa maior ganho de rendimento e salário", diz.

De acordo com César, que atua na área há 15 anos, e antes do Tribunal passou pelo Ministério Público do Trabalho, a classe média tem consciência de que a escola melhora a chance de êxito e sucesso na vida profissional.

A Lei do Aprendiz não visa a mão de obra barata e estabelece regras para que o jovem que precisa trabalhar esteja resguardado e atue no mercado, desde que a atividade ocorra em um processo metódico que o auxilie no desenvolvimento de uma profissão.

O Brasil comprometeu-se internacionalmente a erradicar o trabalho infantil até 2020, e as piores formas dessa atividade até 2015. A contradição é que apontamentos no Estado de São Paulo, com base no Programa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), dão conta de que o trabalho com crianças entre 10 e 13 anos aumentou 50% nos últimos anos.

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Comunicação Social