Ipojucan Demétrius Vecchi aborda o tema “A Constituição e o Direito do Trabalho” em evento na Escola Judicial

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"A Constituição e o Direito do Trabalho" foi o tema da palestra ministrada pelo professor gaúcho Ipojucan Demétrius Vecchi, na Escola Judicial do TRT-15, nesta sexta-feira, 30/1. A palestra integrou a programação do XXV e do XXVI Cursos de Formação Inicial para juízes do trabalho substitutos. Ao todo participaram 19 novos magistrados de ambos os cursos, além de outros juízes titulares, servidores e estagiários, somando um público de 70 pessoas que lotaram o auditório da escola. Dentre os desembargadores, prestigiaram o evento o presidente da Corte, desembargador Lorival Ferreira dos Santos, e o diretor da Escola, o desembargador Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani. Participaram ainda o ex-diretor da Escola, desembargador Samuel Hugo Lima, e os desembargadores Ana Paula Pellegrina Lockmann e Helcio Dantas Lobo Junior.

O diretor Giordani abriu o evento ressaltando a importância do tema escolhido, lembrando do estreito relacionamento entre o Direito do Trabalho e a Constituição, "garantidora e protetora dos direitos trabalhistas". O presidente Lorival Ferreira dos Santos salientou o enorme potencial da Constituição e lembrou, especialmente aos magistrados presentes, que "não se pode perder de vista os fundamentos pelos quais nasceu o Direito do Trabalho", e que aos juízes cabe o papel de "proteger os direitos trabalhistas".

O professor Ipojucan Demétrius, que também é professor de Direito do Trabalho na Universidade de Passo Fundo (RS) e mestre em Direito Público, abriu sua exposição afirmando que a Constituição Federal, fundamentada em princípios, desde o seu preâmbulo destaca o "déficit de direitos sociais" existentes no ordenamento jurídico do país. Numa exposição ágil, marcada por questionamentos e exemplos de casos concretos, o palestrante traçou um painel histórico da discussão jurídica sobre os princípios. Nos primórdios da doutrina, eram meras exortações, mas na prática, na dúvida, aplicava-se a lei. Num segundo momento, os princípios ganham normatividade e se tornam uma fonte subsidiária, sendo aplicados em casos de omissão da lei.

Atualmente, com a Constituição de 1988, porém, os princípios foram alçados à ordem mais alta, e devem, segundo defende o professor Ipojucan, fundamentar uma visão diferente do próprio Direito.

Dentre os principais pontos abordados na palestra, a dignidade da pessoa humana, garantida no artigo 1º, inciso III da CF, é fonte primordial dos direitos fundamentais, que servem não só como limite infranqueável e indisponível desses direitos como também estabelecem uma restrição ao próprio direito. Para os operadores do direito, particularmente, esse novo "status" dos princípios "é o reconhecimento de que a ordem jurídica existe para promover o livre desenvolvimento da pessoa humana, tornando-se um fim em si mesmo". Essa nova visão dos princípios, segundo o palestrante, deve ser "resgatada especialmente pela Justiça do Trabalho", que apesar de não ser capaz de dirimir todas as diferenças e conflitos, deve fortalecer os princípios. Como exemplo, o palestrante citou o caso do TRT-4 (RS), que tem decidido sobre "dano existencial", baseado no princípio da dignidade da pessoa humana, em casos de trabalho exaustivo, com longas jornadas que chegam a 15 horas diárias. Segundo o professor, nesses casos, a aplicação do princípio nas decisões se justifica porque o abuso "impede o desenvolvimento pessoal".

A igualdade foi outro ponto abordado na palestra. Segundo o professor Ipojucan, "trata-se de uma igualdade normativa", responsável para promover o bem de todos sem preconceito. O professor ressaltou, ainda, que as diferenças devem ser valorizadas, nunca porém com preconceito, e cabe ao Direito do Trabalho, segundo o palestrante, ser protetivo dos valores sociais. O professor lembrou que tanto o trabalho quanto a iniciativa econômica privada têm como base constitucional os valores sociais e a autonomia privada "não pode mais significar que o trabalho seja imune à dignidade humana".

Segundo o palestrante, o Direito do Trabalho apresenta hoje duas diretrizes hermenêuticas, que se resumem basicamente no princípio da norma mais favorável conjugado com o impedimento do retrocesso social; e, também, do novo "status" dos direitos dos trabalhadores, que deixaram de ser meramente trabalhistas para serem alçados à esfera dos direitos fundamentais.

Com toda essa nova visão do Direito do Trabalho, o palestrante alertou para o perigo da flexibilização dos direitos trabalhistas (fundamentais) que, vez por outra, volta à discussão. Ipojucan lembrou que apesar de prevista na própria Constituição, a flexibilização só se sustenta em alguns casos específicos, como nos de salário, horários e turnos ininterruptos, e até por isso mesmo "não significa um cheque em branco", e "deve sempre ser analisada de forma restritiva, como uma exceção", concluiu o palestrante.

Apesar de fundamentais, em seu sentido mais amplo, os princípios, que servem para "arejar o direito", podem também, segundo o professor Ipojucan, permitir "certa manipulação". Por isso, na prática, "é preciso que se apliquem os princípios com coerência e integridade", afirmou. O equilíbrio defendido pelo professor se justifica pela necessidade, de um lado, de avançar nas conquistas sociais e, de outro, limitar-se a interpretação pessoal sobre os princípios.

Ipojucan também reforçou o papel dos direitos fundamentais como "trunfo diante do Poder", e como "poder", segundo o professor, entende-se toda relação entre os indivíduos ou destes com o Estado. Por fim, o palestrante falou da eficácia dos direitos fundamentais de primeira geração nas relações privadas, e defendeu que estes devem ser aplicados nas relações trabalhistas. Segundo o professor, não se pode entender a garantia de integralidade de direitos na sociedade (nas relações de consumo e nas eleições, por exemplo) e, no ambiente de trabalho, o cerceamento desses direitos (como o de livre expressão, por exemplo). O palestrante alertou para o perigo de se podarem os trabalhadores em seus direitos fundamentais, principalmente na liberdade de expressão, e lembrou que, para que haja uma restrição nesses direitos, primeiro ela deve ser legítima e legal, além de ser do conhecimento prévio do interessado.

O professor concluiu sua explanação exortando os novos magistrados e os operadores do direito, de modo geral, a "levarem a sério a Constituição como uma norma e no que ela constitui".

Por Ademar Lopes Junior

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