Campanha Coração Azul: TRT-15 participa de Simpósio sobre Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas

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Presidente do Tribunal, desembargador Lorival Ferreira dos Santos, destaca mobilização da sociedade no combate ao problema

Por Ana Claudia de Siqueira,
com informações da Secretaria de Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo

"É muito importante que a sociedade esteja compreendendo a relevância desse tema, para que seja lançado um novo olhar sobre essa situação tão perversa. A sociedade, através dos vários Comitês, está presente e atenta para o problema", afirmou o presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, desembargador Lorival Ferreira dos Santos, na abertura do I Simpósio Estadual de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, promovido na última sexta-feira (29/07), no auditório cedido pela Associação dos Advogados de São Paulo- AASP.

Lorival destacou a atuação do Comitê Regional de Erradicação do Trabalho Escravo, Tráfico de Pessoas e Discriminação do TRT-15, presidido pelo desembargador Eduardo Benedito de Oliveira Zanella (também membro da Comissão Estadual para Erradicação do Trabalho Escravo - Coetrae/SP) e composto pelas desembargadoras Helena Rosa Mônaco da Silva Lins Coelho e Susana Graciela Santiso (presente no evento), além dos juízes do trabalho Marcus Menezes Barberino Mendes (titular da VT de São Roque e um dos palestrantes) e Renato César Trevisani (titular da VT de Ituverava). Criado em 2014, o comitê promove, com o apoio da Escola Judicial do TRT-15, seminários no âmbito da jurisdição do Tribunal, e elabora estudos e projetos para o enfrentamento da exploração de trabalhadores em condições análogas às de escravo ou de trabalho degradante, assim como o tráfico de pessoas e a discriminação.

Promovido pela Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo com o objetivo de sensibilizar e informar a sociedade sobre a importância do enfrentamento ao tráfico de pessoas, que tem o Dia Mundial celebrado em 30 de julho, o simpósio debateu os avanços, perspectivas e desafios no combate a esse problema no país, integrando o rol de atividades da Campanha Coração Azul.

Além do presidente Lorival, compuseram a mesa de abertura o secretário nacional de Justiça e Cidadania, Gustavo Marrone; o secretário estadual da Justiça e da Defesa da Cidadania, Márcio Fernando Elias Rosa; a desembargadora do Tribunal de Justiça de São Paulo e presidente da Comissão Judiciária Interdisciplinar sobre Tráfico de Pessoas, Maria de Lourdes Rachid Vaz de Almeida; o vice-presidente judicial do TRT-2 (SP), desembargador Wilson Fernandes; o procurador do Ministério Público do Trabalho de São Paulo (MPT-2) Luiz Carlos Michele Fabre; o deputado estadual Carlos Alberto Bezerra e o conselheiro da Associação dos Advogados de São Paulo (AASP) Ricardo Pereira de Freitas Guimarães.

Segundo o secretário estadual da Justiça e da Defesa da Cidadania, Márcio Fernando Elias Rosa, o Estado tem dado passos importantes para "o enfrentamento desse triste fato que fustiga gravemente a dignidade da pessoa humana, alertando para a necessidade de esclarecimento e conscientização do cidadão". O Governo do Estado criou e mantém o Núcleo de Enfrentamento e atua em rede com outros 15 núcleos sediados nas regiões administrativas do Estado. "Precisamos criar um ‘selo de consciência': não consumir nenhum produto cuja produção envolva o trabalho escravo. Esse fenômeno precisa encontrar na sociedade civil uma repulsa a este crime contra a humanidade", enfatizou o secretário da Justiça, destacando que o tráfico de pessoas também se refere à exploração sexual, infantil, dentre outras formas.

Dividido em quatro painéis, o simpósio - que contou com a coordenação de Flávio Antas Corrêa, responsável pelo Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (NEPT) e pela Comissão Estadual para Erradicação do Trabalho Escravo (COETRAE/SP) -, reuniu magistrados, membros de consulados, da Defensoria Pública, da OAB, de instituições especializadas e demais representantes da sociedade civil, totalizando cerca de 150 pessoas.

Avanços Legislativos

O desembargador Eduardo Zanella coordenou o painel sobre os "Avanços Legislativos para o Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Erradicação do Trabalho Escravo - Lei Bezerra (Lei Estadual nº 14.946/2013)", que contou com explanações do deputado Carlos Alberto Bezerra Jr., da promotora de justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) Eliana Faleiros Vendramini Carneiro e da assistente social do Centro de Apoio e Pastoral do Migrante (CAMI) Carla Aparecida Silva Aguilar.

Ao introduzir o tema, o desembargador Zanella listou, de forma cronológica, fatos normativos, sobretudo após a Segunda Guerra Mundial, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), o Pacto Internacional dos Direitos Civis, Políticos, Econômicos e Culturais (1966) e o Pacto de San José da Costa Rica (1969), "que tinham, todos, um objetivo comum: impedir que o ser humano sofresse dominação de seus pares". Zanella também apresentou os avanços normativos ocorridos no Brasil, culminando com a Lei Estadual nº 14.946/2013, que dispõe sobre a cassação da inscrição no cadastro de contribuintes do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) de qualquer empresa que faça uso direto ou indireto de trabalho escravo ou em condições análogas.

Autor da lei, o deputado Carlos Bezerra propôs uma reflexão sobre a escravidão contemporânea. Por meio da exibição de fortes imagens de exploração de mão de obra barata, de trabalho infantil, de acidentes de trabalho e até de assassinato de trabalhador no país, o deputado alertou sobre a mudança de metodologia da escravidão, não extinta com a famosa Lei Áurea, de 1888. "Trouxe essas histórias para a gente jamais esquecer que, por trás das estatísticas e das leis, temos dramas e tragédias reais de seres humanos. Mas a pergunta é: a escravidão não foi erradicada? A resposta é não. Mudou-se a forma de explorar, a metodologia modernizou-se. São necessários novos mecanismos legais e, por isso, propusemos, no Estado de São Paulo, a Lei 14.946, que determina o fechamento de empresas flagradas explorando trabalho escravo."

Bezerra contou casos de exploração de mão de obra boliviana na cadeia de produção de roupas de grife em São Paulo e classificou o trabalho escravo como sintoma e não doença. "A doença é o sistema econômico perverso e devastador", assinalou. Citando a frase da educadora e escritora norte-americana Anna Lappé - "Toda vez em que você gasta dinheiro você está votando no tipo de mundo que você quer" -, o deputado conclamou os participantes a baixarem em seus celulares o aplicativo APP Moda Livre, desenvolvido pela Ong Repórter Brasil e que monitora as principais marcas e varejistas de roupa do país e apresenta as medidas tomadas para evitar que as peças vendidas a seus clientes sejam produzidas por trabalho escravo.

A promotora Eliane Carneiro chamou a atenção para a ausência de percepção da sociedade no que diz respeito ao tráfico de pessoas. "O acolhimento social não tem acontecido por conta do não reconhecimento da vulnerabilidade como fato. A sociedade é preconceituosa com a vítima, e os traficantes atuam", afirmou.

De acordo com Eliane, a Promotoria é cobrada diuturnamente, mas não há leis específicas para combater o tráfico de pessoas ou de órgãos, a adoção ilegal e outros tipos de servidão. "Em 2004 [Decreto 5.017, da Presidência da República], definimos bem o que é o tráfico de pessoas, mas não estabelecemos uma pena." A promotora comentou sobre a contribuição do Ministério Público do Trabalho e o amparo das leis trabalhistas, mencionando também a existência de um projeto de lei sobre o tema, que tramita há um longo tempo no Congresso Nacional. Por fim, Eliane defendeu o acolhimento digno das vítimas, com abrigamento, respeito e retorno à atividade laboral.

A assistente social Carla Aguilar narrou experiências vivenciadas pelo CAMI, instituição fundada em 2005 e que busca acolher e mobilizar os imigrantes na luta por direitos, cidadania e empoderamento social e político, além de combater o trabalho escravo, a xenofobia e o tráfico de pessoas e promover o reconhecimento da identidade e da diversidade cultural e religiosa. "Estas situações de exploração estão mais próximas do que a gente imagina. Recebemos, certa vez, uma denúncia de que duas pessoas estavam sendo leiloadas por R$ 1.000 na Rua Coimbra, em pleno Centro de São Paulo."

Carla apresentou também as técnicas de prevenção adotadas pela instituição, que são amparadas no diálogo, no comprometimento das escolas e universidades, na realização de campanhas, na preparação de funcionários públicos e no constante mapeamento dos locais aonde chegam as vítimas, para combater in loco a rede de tráfico.

Outros temas

O "Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas no Brasil: desafios e perspectivas" foi o tema abordado no segundo painel, com palestra da psicóloga Anália Belisa Ribeiro Pinto, pesquisadora do Núcleo Diversitas/USP e coordenadora de programas de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas, tráfico de pessoas, direitos humanos e prevenção da violência. Comandado pelo coordenador do NEPT, Flávio Antas Corrêa, o painel contou também com a participação da procuradora do Ministério Público do Trabalho da 15ª Região (MPT15) Catarina Von Zuben, que enfatizou a importância do trabalho em rede.

Na sequência, o juiz do TRT15 Marcus Menezes Barberino e o procurador do MPT-2/SP Rodrigo Barbosa de Castilho palestraram sobre "A Experiência do Poder Judiciário nos casos do Crime de Tráfico de Pessoas", abordando o trabalho escravo e sua tipicidade. O painel foi coordenado por Larissa Leite, do Departamento de Proteção do Centro de Referência para Refugiados da Cáritas Arquidiocesana de São Paulo.

Com coordenação do desembargador Wilson Fernandes (TRT2), o último painel tratou da "Responsabilidade em Cadeia", tema discorrido pelo procurador do MPT2 (SP) Luiz Carlos Michele Fabre; pelo inspetor José Marcelo Alves Gondim, da Comissão Regional de Direitos Humanos da Polícia Rodoviária Federal; e pelo juiz do TJ de São Paulo Edison Tetsuzo Namba (autor do Manual de Bioética e Biodireito).

Sobre a Campanha Coração Azul

A campanha foi criada pela ONU e é articulada em todo o mundo pelo Escritório de Drogas e Crimes da Organização das Nações Unidas (ONU – UNODC), tendo como objetivos no Brasil ampliar o conhecimento sobre o tema, mobilizar instituições e também divulgar as ações da Rede de Núcleos e Postos de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas.

O dia 30 de julho foi escolhido pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 2014, como a data de mobilização mundial sobre o tema e, no mesmo ano, em debate realizado pela Assembleia Geral da Organização Mundial do Trabalho (OIT), o tráfico de pessoas para fim de exploração sexual passou a integrar o Tratado Internacional de Combate ao Trabalho Forçado, uma vez que essa forma de exploração, assim como o trabalho escravo, é uma das três atividades econômicas mais lucrativas em todo o mundo.

Unidade Responsável:
Comunicação Social