Exposição no Fórum Trabalhista de Presidente Prudente denuncia as mazelas do trabalho infantil e propõe sua erradicação

Conteúdo da Notícia

A imprensa dos Estados Unidos consagrou a técnica do lead, na qual, em tese, pelo menos, as informações mais importantes a respeito de um fato são inseridas logo no início da matéria jornalística. A técnica, que ganhou o mundo, consiste basicamente em esclarecer quem fez o que, quando e onde. Alguns acrescentam mais uma indagação: por quê.

No entanto, a sensação que muito possivelmente vai desabar sobre quem ingressar no espaço em que está montada a exposição "Um Mundo sem Trabalho Infantil", no Fórum Trabalhista de Presidente Prudente, cidade do oeste paulista, é que todas essas perguntas ficam sem resposta. Principalmente a última.

Afinal, por que cerca de 170 milhões de crianças ainda trabalham no mundo, metade delas em atividades que colocam diretamente em risco sua saúde, sua segurança e seu desenvolvimento? Por que no Brasil ainda se explora irregularmente a mão de obra de 3,3 milhões de crianças e adolescentes dos 5 aos 17 anos, 500 mil deles com apenas 12 anos ou menos? Por que o maior percentual de pessoas nessa faixa de idade ainda ilegalmente exploradas no Brasil, 10,2%, não é "privilégio" do Norte do País, e muito menos do estigmatizado Nordeste, mas da rica Região Sul? Por que, em 2014, depois de sucessivas quedas, o trabalho infantil voltou a crescer em nosso país (+4,5%), na comparação com o ano anterior? Será que só a crise econômica explica esse aumento?

Mais do que responder, a mostra em Prudente, aberta nesta sexta-feira, 22 de julho, quer justamente provocar esse tipo de indagação, para, aí sim, fazer surgir uma única convicção: é preciso erradicar o trabalho infantil, fazendo prevalecer, ao menos no Brasil, os direitos que esses pequenos grandes seres humanos tão duramente conquistaram, conforme estabelecem o celebrado Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA, e a própria Constituição Federal. Conscientizar a sociedade disso é, em síntese, portanto, o propósito da mostra, que, em última instância, preconiza a erradicação do trabalho infantil.

Com apoio da Procuradoria do Trabalho no Município (PTM), a exposição segue até o próximo dia 29 de agosto no andar térreo do Fórum Trabalhista de Presidente Prudente - Avenida 14 de Setembro, 1.080 -, com visitação aberta das 11 às 17h30. Depois desse período, ela permanece na cidade, no Centro Cultural Matarazzo – Rua Quintino Bocaiúva, 749 –, onde fica de 6 de setembro a 2 de outubro, como parte das festividades pelo aniversário do município, que completa 99 anos em 14 de setembro. Iniciativa do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem, instituído pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) e pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), a mostra tem caráter itinerante e já foi vista em Brasília – no próprio TST – e Curitiba, onde foi exibida simultaneamente na sede do TRT da 9ª Região (PR) e no Fórum Trabalhista do município.

Visualmente, a exposição é dominada por 21 painéis, com destaque para o maior deles, de 10 m X 1,8 m e que traça uma "linha do tempo" do trabalho infantil no País. Completam o acervo dois painéis de 2,1 m X 2,1 m e dezoito de 2,1 m X 0,9 m, além de pequenas instalações que, de forma contundente, juntam bonecas, carrinhos e bichos de pelúcia às piores formas do trabalho infantil, como as que ocorrem em carvoarias, lixões e no trabalho doméstico, por exemplo. O problema, entretanto, vai muito além da lida em longos, perigosos e insalubres expedientes. Inclui, também, atividades ainda mais criminosas, como escravidão, abuso sexual e prostituição infantil, conforme a exposição também revela. Nela o público pode, ainda, conhecer o que está sendo feito para erradicar essa página vergonhosa da experiência humana.

Foi o que ressaltou o presidente do TRT da 15ª Região e do Colégio de Presidentes e Corregedores de Tribunais Regionais do Trabalho (Coleprecor), desembargador Lorival Ferreira dos Santos, em seu pronunciamento na abertura do evento. Já o presidente da OAB de Presidente Prudente, Rodrigo Lemos Arteiro, garantiu o total comprometimento da entidade com a causa. "A conquista do estado de bem-estar social é fruto de uma evolução histórica", sublinhou ele. A procuradora do trabalho Renata Aparecida Crema Botasso, que falou em nome do Ministério Público do Trabalho, destacou, por sua vez, que, no que diz respeito ao trabalho infantil, o MPT "participa de toda e qualquer iniciativa que vise, por um lado, prevenir e, por outro, erradicar essa mazela social". Renata enfatizou ainda que a instituição a que pertence tem atuado de forma que, na hipótese de haver condenação judicial estabelecendo indenização em dinheiro, em ação proposta pelo MPT contra explorador ilegal de mão de obra infantil, a quantia fixada seja transformada em medida compensatória, revertendo para a própria comunidade em que o dano ocorreu.


O diretor do Fórum Trabalhista e coordenador do Juizado Especial da Infância e Adolescência (JEIA) da circunscrição de Presidente Prudente, juiz José Roberto Dantas Oliva, concluindo os pronunciamentos, enfatizou que, se o Brasil não extinguir o trabalho infantil, não estará excluindo do mercado de trabalho digno e das oportunidades de ascensão social as crianças e adolescentes explorados. "Nós, todos nós, toda a população brasileira é que estará excluída de uma competição que é global", insistiu Oliva. "Combater o trabalho infantil, já está provado, como tanto tem dito a Organização Internacional do Trabalho, é fator de desenvolvimento econômico."

O juiz esclareceu que, no comando do JEIA de Presidente Prudente, seguindo o exemplo da colega Eliana dos Santos Alves Nogueira, coordenadora da unidade de Franca, tem procurado encaminhar para programas de aprendizagem os adolescentes menores de 16 anos cujos pais ingressam com pedido de autorização para o filho trabalhar. "Como a própria Constituição veda o trabalho para pessoas dessa faixa de idade, eu poderia simplesmente rejeitar liminarmente o pedido, por sua impossibilidade jurídica. Mas, inspirados no trabalho que vem sendo feito em escala até muito maior em Franca, estamos encaminhando esses adolescentes, desde que tenham pelo menos 14 anos, para a atividade de aprendiz, forma legal e segura de proporcionar a esses jovens uma formação profissional."

O magistrado antecipou que estão sendo negociadas com os Poderes Executivo e Legislativo de Presidente Prudente a proposição e a aprovação de uma lei que vincule a concessão de alvará de funcionamento a empresas do município ao compromisso, por parte do empresário, com a não utilização de mão de obra infantil. "E, caso seja detectado que o empregador não respeitou a norma, a autorização para funcionamento da empresa será cassada. Estamos lutando pela criação dessa lei, por intermédio do Fórum de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil de Presidente Prudente e Região", informou Oliva.

A entidade planeja também realizar uma pesquisa que incluiria cerca de 35 mil estudantes dos 5 aos 17 anos, do ensino infantil ao médio das redes públicas municipal e estadual da cidade, para tentar identificar e combater diretamente possíveis casos de trabalho infantil. "O levantamento abrangeria também áreas de grande vulnerabilidade, para não deixar de fora as crianças e adolescentes que nem sequer estudando estão", acrescentou o juiz. Inspirada num levantamento feito em Belém do Pará, a iniciativa quer fazer de Presidente Prudente uma cidade livre do trabalho infantil. "O município tem nas mãos uma oportunidade de fazer história, de ser um exemplo não só para o Estado de São Paulo, e nem mesmo apenas para todo o Brasil, mas para o mundo inteiro."

Membro do Comitê Regional de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem da 15ª, Oliva revelou ainda que vários sindicatos do município já assumiram o compromisso de incluir nos acordos e convenções coletivas cláusulas de combate ao trabalho infantil.

Sobre a audiência pública realizada na cidade em abril, para estimular a adesão dos empresários da região aos programas de aprendizagem, o juiz celebrou a repercussão da iniciativa. "As empresas que até então não o faziam estão, de fato, começando a cumprir a cota fixada pela Lei de Aprendizagem. Uma delas contratou, sozinha, 50 aprendizes", comemorou Oliva.

A cerimônia de abertura da exposição contou com a presença dos juízes do trabalho Kátia Liriam Pasquini Braiani, Mari Angela Pelegrini, Mouzart Luís Silva Brenes, Nelma Pedrosa Godoy Sant'Anna Ferreira, Régis Antônio Bersanin Niedo, Rogério José Perrud e Vanessa Maria Sampaio Villanova Matos, do juiz de direito da Infância e Juventude de Presidente Prudente, José Wagner Parrão Molina, das secretárias municipais de Assuntos Jurídicos e Legislativos, Amadis de Oliveira Sá - que representou o prefeito Milton Carlos de Mello "Tupã" -, de Assistência Social, Maria Helena Veiga Silvestre, e de Cultura, Sueli Pereira de Castro, e da gerente regional do Trabalho de Presidente Prudente, Silvana Vianna Passarello, entre outras autoridades.

Unidade Responsável:
Comunicação Social