Transtornos mentais decorrentes do trabalho são tema de palestra no TRT-15
Por Willians Fausto
Antes tratados como empregados, muitos trabalhadores assalariados foram rebatizados "colaboradores" ou "clientes internos". A pressão outrora exercida por chefes, deu lugar, agora, a "metas", "visões" e "valores". As novas formas de submissão e de organização do trabalho foram o tema das palestras dos professores Renata Paparelli e José Roberto Montes Heloani, em painel sobre transtornos mentais, no seminário "A perícia na Justiça do Trabalho", realizado na sexta-feira, 11/11, na sede do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região.
Em mesa coordenada pelo diretor da Escola Judicial do TRT-15, desembargador Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani, ambos os palestrantes afirmaram que o aumento do número de casos de depressão, estresse pós-traumático, ansiedade e outros transtornos relacionados à vida profissional tem como causa direta as novas formas de organização do trabalho.
"A obediência e a ameaça deram lugar à sedução, que se constituiu como nova forma de submissão", afirmou Renata Paparelli, que leciona na Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Na lista de trabalhadores mais atingidos por transtornos mentais decorrentes dessas novas formas de trabalho, a professora citou os bancários, os motoristas de ônibus e os operadores de telemarketing.
De acordo com a professora, os transtornos mentais ocorrem quando os limites subjetivos do trabalhador são desrespeitados. "As pessoas possuem limites diferentes, que são mutáveis com o tempo. O problema é que muitas empresas tratam os empregados como se fossem atletas de alto desempenho, desrespeitando sistemática e continuamente as diferenças", explicou.
Outra peculiaridade dos sofrimentos psíquicos é o fato de que eles não podem ser medidos por aparelhos. "É só a partir do discurso do trabalhador que o perito pode mensurar o dano", disse Renata Paparelli.
Assédio organizacional
Incumbido da tarefa de falar sobre as relações entre assédios e transtornos, o professor da Faculdade de Educação da Unicamp e professor conveniado à Université de Nanterre – Paris X , José Roberto Montes Heloani, defendeu a tese de que todo assédio é organizacional. "Infelizmente, vivemos em um mundo em que o que menos conta é a saúde mental das pessoas", afirmou.
Heloani explicou que as moléstias ou perseguições aos trabalhadores ocorrem, predominantemente, em ambientes onde se toleram preconceitos raciais e discriminações políticas, sexuais ou religiosas. "O assédio é uma questão sistêmica, que ocorre onde há conivência das empresas. Não é um problema relacionado a questões individuais ou de personalidade", ressaltou.
Um dos exemplos citados pelo professor foi o caso de um trabalhador negro que passou meses sendo ofendido pelos colegas. Periodicamente, ele recebia, às escondidas, uma banana com um bilhetinho desrespeitoso. Passados seis meses de assédio, esse empregado agrediu um colega que ria da ofensa. "Durante a audiência na vara do trabalho, ouvi do advogado da empresa que o funcionário havia tido um ‘ataque de loucura', consequência de uma personalidade difícil. Isso não tem nada a ver com personalidade. Sem a conivência da empresa, nada teria ocorrido", destacou.
No final da palestra, o professor Heloani defendeu o papel da Justiça do Trabalho na punição dos abusadores. "Hoje, no Brasil, vivemos um embate entre os que defendem um Estado liberal, à mercê do capital financeiro, e os que querem preservar um Estado interventor, que coíbe os abusos. É justamente o primeiro grupo que quer acabar com a Justiça do Trabalho", declarou.
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