Com auditório lotado, painel sobre transtornos mentais no trabalho abre seminário na Escola Judicial do TRT-15
Por Roberto Machini
Inserido no âmbito do Programa Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho, conhecido como Trabalho Seguro, iniciativa do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) que elegeu a temática dos transtornos mentais relacionados ao trabalho para o biênio 2016-2017, o seminário "A saúde do trabalhador e os transtornos mentais à luz das recentes reformas trabalhistas" trouxe nesta sexta-feira, 15 de setembro, centenas de pessoas às dependências da Escola Judicial (Ejud) do TRT-15. O 1º painel do evento foi protagonizado pela psicóloga Miryan Cristina Mazieiro Vergueiro da Silva, que é mestre em Medicina Preventiva pela USP. Ela falou sobre os "Transtornos mentais decorrentes do ambiente de trabalho".
A mesa de honra do evento foi composta pelos desembargadores Fernando da Silva Borges, presidente do TRT da 15ª Região, Helena Rosa Mônaco da Silva Lins Coelho, vice-presidente administrativo do Tribunal, Manoel Carlos Toledo Filho, diretor da Ejud, e Lorival Ferreira dos Santos, gestor regional no 2º grau de jurisdição do Programa Trabalho Seguro, além do procurador-chefe em exercício do Ministério Público do Trabalho da 15ª Região, Claude Henri Appy.
Para dar a dimensão da questão no Brasil, o presidente Fernando Borges citou que, em 2015, houve mais de 600 mil casos de afastamento do trabalho em razão de transtornos mentais. O magistrado advertiu que há um crescimento exponencial desse tipo de doença, visto que dados do INSS mostram que, no período de 2004 a 2013, ocorreu uma elevação da ordem de incríveis 1964% na concessão de auxílio-doença previdenciário relacionado à saúde mental. "O tema deste encontro é de grande importância para todos nós e despertou tanto interesse nos nossos magistrados e servidores que as inscrições se esgotaram rapidamente", concluiu Fernando Borges, parabenizando os colegas Manoel Carlos e Lorival pela excelência do evento.
O diretor da Ejud-15 disse que "o seminário é mais uma etapa do nosso estudo contínuo das implicações trazidas pela nova legislação". O desembargador criticou a reforma trabalhista, afirmando que a reformulação da CLT foi feita de maneira "apressada e lacunosa, o que seguramente nos obrigará a estudar muito para cumprir o nosso papel de apreender, de maneira técnica consistente e efetiva, aquilo que mudou".
Já Lorival Ferreira dos Santos assinalou que o TRT-15, alinhado com a política do TST no que diz respeito ao trabalho seguro, decidiu "realizar este seminário que conta com a participação de extraordinários professores e que, em todos os temas, está enfocando a Lei 13.467/2017, que instituiu a chamada reforma trabalhista". Ele registrou ainda que, nas atividades anteriores do Programa de Trabalho Seguro, o foco era no operário e nas mutilações e doenças laborais correspondentes, mas que hoje tem se constatado que as doenças relacionadas aos transtornos mentais, e por consequência as demandas judiciais, aumentaram significativamente.
1º painel
A palestrante Miryan Mazieiro é psicóloga do trabalho no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP e coordenadora do curso "Transtornos mentais relacionados ao trabalho e saúde mental no trabalho", além de especialista em Psiquiatria Social pela Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz do Rio de Janeiro e em Saúde Coletiva pela Universidade Federal de Uberlândia (MG). Atua também na área de perícias psicológicas trabalhistas.
Segundo Miryan, a Organização Mundial da Saúde (OMS) projeta que, em 2020, as doenças relacionadas à saúde mental serão a maior causa de afastamento dos trabalhadores, colocação atualmente ocupada pelas Lesões por Esforços Repetitivos (LERs) e pelos Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (Dorts). Ainda assim, a palestrante observou que as LERs/Dorts estão fortemente associadas a transtornos mentais, mas que "o estigma de tais doenças é tão presente na sociedade que os próprios trabalhadores optam por assumir apenas os problemas físicos, porque são mais facilmente detectados por exames". Além disso, os trabalhadores também rejeitam o diagnóstico de transtorno mental, afirmou a palestrante.
A psicóloga lecionou que o campo da saúde mental estuda as inter-relações entre o trabalho e os processos de adoecimento psíquico e o impacto do trabalho na saúde mental dos indivíduos. Diante de tal complexidade, ponderou Miryan – que apresentou os pressupostos teóricos de duas teorias: a Teoria do estresse e a Psicodinâmica do Trabalho –, é necessária a interdisciplinaridade com outros campos, como o das ciências sociais, da medicina, da psicologia e da ergonomia, dentre outros.
A professora disse que, além da retribuição financeira, o trabalho traz ao ser humano o sentimento de pertencimento, ajudando a moldar a subjetividade do indivíduo. Ela apontou que o trabalho pode ser fator tanto de doença como de saúde mental, sendo que a organização do trabalho é determinante nesse resultado.
Outro fator de risco do transtorno mental anotado pela professora é a quebra do sentimento de coletividade dos trabalhadores. Exemplo disso, afirmou ela, é o fim dos laços de solidariedade nos casos de assédio moral. "Esse tipo de assédio sempre existiu, mas antes os colegas amparavam o trabalhador assediado. Hoje isso não ocorre mais", sustentou Miryan, que classificou o fenômeno como um tipo de "patologia da solidão".
A palestrante também destacou a necessidade de se observar o adoecimento psíquico "para além de uma fragilidade individual", sendo necessário afastar a "culpabilidade" imposta ao trabalhador adoecido.
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