Conferência de encerramento do Congresso Rural aborda a constituição e o direito do trabalho

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Por Ademar Lopes Junior

Com o tema "A Constituição e o Direito do Trabalho", última conferência do XVIII Congresso Brasileiro de Direito do Trabalho Rural, ministrada pelo professor gaúcho Ipojucan Demétrius Vecchi, encerrou o ciclo de palestras que promoveram, em dois dias de evento em São José do Rio Preto, reflexões, críticas e busca de soluções jurídicas para os problemas que atingem principalmente a realidade do trabalhador no campo.

O presidente do Regional, desembargador Fernando da Silva Borges, na apresentação do conferencista, lembrou que o tema a ser abordado seria uma homenagem à Constituição Federal, que no dia anterior, 5/10, havia completado 29 anos. "Quase três décadas e ainda com tantos dispositivos a serem regulamentados", lamentou o presidente, que não escondeu o tom de "desabafo" pelo "inconformismo" por existirem ainda tantos artigos de "eficácia contida" na Carta Magna, como o que trata das demissões sem justa causa do empregado, muitas vezes por motivos de discriminação. Para o magistrado, essa realidade, uma verdadeira "falta de dignidade", reflete um sofrimento para o trabalhador, que tem sua "sobrevivência nas mãos do empregador".

O professor Ipojucan confessou sua preocupação e dificuldade na abordagem do tema, especialmente no atual momento que vive o País, em que a Constituição Federal sofre tantos ataques ao trabalho por motivos políticos, inclusive pelo seu guardião, o Supremo Tribunal Federal. Essa realidade, segundo o palestrante, faz lembrar os versos da canção "Que país é esse", da banda Legião Urbana, que dizem: "ninguém respeita a Constituição, mas todos acreditam no futuro da nação".

Ao mesmo tempo, porém, o professor afirmou que, até por tudo isso, "é nesse momento que precisamos falar mais da Constituição". E por quê? Porque "é a melhor que o país já conseguiu fazer em sua história, com todos os defeitos e virtudes, e conseguiu fazer o povo ser ouvido", disse o professor, que completou "não é à toa que a elite empresarial e jurídica atacam tanto a Constituição" para quem a Carta Magna é, na verdade um entrave para o desenvolvimento econômico.

O palestrante não poupou críticas ao modelo neoliberal adotado no País, que visa ao fortalecimento do capital (financeiro) e que, segundo Ipojucan, "anda na contramão" e atravessa uma crise estrutural.

Dentre as reflexões do professor Ipojucan, os ataques à Constituição pela classe empresarial se explicam em parte porque os direitos dos trabalhadores passaram a ser considerados formal e materialmente como fundamentais, "verdadeiros trunfos frente ao poder público e privado, para garantir os direitos básicos de vida para todos", afirmou.

Garantias como a dignidade da pessoa humana (Art. 1º), políticas públicas de inclusão (Art. 3º) e prevalência dos direitos humanos para reger as relações do país (Art. 4º), além dos direitos de primeira dimensão (honra, liberdade política, religiosa, de pensamento, entre outros) não deveriam, segundo o palestrante, ser atacados, muito menos limitados por um legislador, sem uma prévia análise do déficit que essa limitação pudesse proporcionar.

Essas e outras críticas do palestrante prepararam o terreno para a sua análise mais dura, referente à Lei 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) e que para ele não vai alterar simplesmente as relações de trabalho, mas também a situação social do País, a que o professor chamou de "mexicanização do Brasil".

De acordo com Ipojucan Vecchi, o direito do trabalho se sustenta em três eixos, que são o "salário", o "limite da jornada de trabalho" e a "saúde no ambiente de trabalho", e coincidência ou não, a reforma aprovada conseguiu atacar os três. Como exemplos, o professor citou o negociado sobre o legislado (Art. 611-A), verdadeiro "cheque em branco" para o empregador, uma vez que confirma a intenção de privilegiar o capital em detrimento do trabalhador, pois reflete um "entendimento restritivo para ampliar direitos e amplo para restringi-los", salientou.

Outro ponto citado pelo professor gaúcho foi sobre o dano extrapatrimonial (moral). Além do estranhamento do palestrante pela previsão de uma empresa (pessoa jurídica) ser titular do direito à reparação, a nova lei prevê que apenas a vítima (pessoa física) seja a detentora do direito, não se estendendo a outros familiares, no caso de morte da vítima (Artigo 223-B). Outra crítica, essa com base no texto do Art. 223-C, se deve à exclusão da liberdade de expressão dos trabalhadores do rol dos direitos indenizáveis à pessoa física. Para o professor, isso é o mesmo que a "revogação do Art. 5º da CF". Por fim, ainda nesse tema, a banalização da dor do empregado ficou evidente quando a lei tenta dimensionar a dignidade pessoal pelo ganho do trabalhador (Art. 223-G, § 1º).

O professor ressaltou que essas e outras afrontas da reforma trabalhista aos direitos dos trabalhadores, antes alçados pela CF como fundamentais, se aplicam igualmente aos trabalhadores rurais, com o agravante agora de que esses poderão receber pagamento com "casa e comida", o que segundo o palestrante não diferencia os trabalhadores rurais modernos dos escravos de antigamente. "É um retrocesso", desabafou, mas não deixou de ressaltar que, com todas essas alterações da lei, "a verdade nua e crua é que qualquer regulamentação que não vise a lucro é vista como uma afronta".

O presidente do TRT-15, desembargador Fernando Borges, no final da palestra do professor Ipojucan, elogiou o expositor e como ele conduziu o tema, galgando pelos direitos fundamentais até o topo (Carta Magna), de onde se pode enxergar com mais amplidão e clareza, e permite se fazer uma reflexão. Para o magistrado, não se pode perder de vista que as novas regras, que integram o ordenamento jurídico, vieram de um poder legitimado, mas que serão julgadas por outro poder também legitimado.

Concluindo a conferência, o professor Ipojucan e o desembargador Fernando Borges foram presenteados, respectivamente, pelas desembargadoras Ana Amarylis Vivacqua de Oliveira Gulla, ouvidora da 15ª Região, e Gisela Rodrigues Magalhães de Araujo e Moraes, vice-presidente judicial do TRT-15 no biênio 2014-2016, com lembranças de sua participação no Congresso.

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