Empresa do ramo de açúcar e álcool é condenada a indenizar família de motorista que morreu atropelado
Por Roberto Machini
A 3ª Câmara do TRT-15 negou provimento ao recurso da reclamada, empresa produtora de açúcar e álcool, para manter sua responsabilidade civil pelo acidente de trabalho que vitimou seu ex-empregado. O colegiado também deu parcial provimento ao apelo das autoras para majorar o valor das indenizações por danos morais para R$ 40 mil para cada reclamante e aumentar a indenização por dano material para R$ 168.478,82.
A ação reparatória de acidente de trabalho foi movida pela viúva e pelas duas filhas do trabalhador, atropelado de forma fatal no dia 9 de outubro de 2014, quando contava com 48 anos de idade.
O ex-empregado era motorista de caminhão canavieiro (treminhão) e foi esmagado pelo próprio veículo durante verificação de problemas mecânicos. Constou do boletim de ocorrência que o acidente ocorreu porque "a vítima aparentemente desceu do caminhão para verificar se o veículo estava com algum problema, sendo que o caminhão provavelmente desceu durante este momento em que o condutor estava observando as rodas ou outro detalhe da carreta".
O relator do recurso, desembargador José Carlos Ábile, registrou inicialmente que, nos termos do artigo 186 do Código Civil, a regra é a de que a responsabilidade civil do empregador para indenizar o trabalhador que sofre acidente de trabalho é subjetiva, sendo necessária a comprovação do dano, do ato ilícito praticado com culpa ou dolo e do nexo de causalidade, e ressaltou que há exceção à regra quando a atividade normalmente desenvolvida implicar, por sua natureza, em risco para direitos de terceiros, na forma do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, situação em que se aplica a teoria do risco com a responsabilização objetiva do empregador.
O relator anotou que o acidente de trabalho restou incontroverso, pois o de cujus, no momento do acidente, encontrava-se no exercício da sua função de motorista profissional em veículo pertencente à empresa. Contudo, consignou que a hipótese não era de responsabilidade objetiva, tal como reconheceu o juiz de primeiro grau, pois "o acidente não ocorreu em circunstâncias ordinárias relacionadas ao trânsito e, sim, em um contexto muito específico que será analisado e cuja prova da culpa do empregador se faz indispensável".
Em análise do depoimento das testemunhas, o desembargador José Carlos Ábile concluiu que o veículo conduzido pelo trabalhador falecido apresentava problemas mecânicos de forma recorrente, o que forçava o motorista a descer para realizar a verificação e colocar-se à frente ou sob o veículo estacionado frequentemente. O relator acrescentou, ainda, que a prova oral indicou que o freio de mão do veículo estaria quebrado, que para reconectar a mangueira do freio era necessário entrar debaixo do caminhão e que o motorista também permanecia em baixo do veículo para verificar algum barulho no cardan.
Destacou o relator que a empresa tinha conhecimento de tais situações e jamais se empenhou em efetuar as correções necessárias e afirmou que, se o caminhão estivesse em perfeitas condições, o de cujus, no dia dos fatos, não teria parado e, por consequência, o acidente não teria ocorrido.
O desembargador José Carlos Ábile citou também estudos que informam que parcela dos acidentes de trabalho ocorrem quando o trabalhador já está esgotado e, por conta da fadiga, deixa de empregar as cautelas necessárias para o desempenho de suas atividades. O relator constatou que esse seria o caso dos autos, pois o de cujus estava submetido a jornada de trabalho estafante, sem fruição do intervalo para refeição, e que o acidente ocorreu no sétimo dia de trabalho contínuo, em violação ao descanso semanal.
Assim, concluiu que a culpa da empresa restou caracterizada no acidente.
Por outro lado, diante do conjunto fático que demonstrou que o de cujus concorreu para o acidente ao não ativar o freio de mão, o relator considerou configurada a "culpa grave e concorrente para o acidente do trabalho que lhe ceifou a vida". Assim, relativizou a responsabilidade da empresa e estimou a culpa do empregado numa proporção de 60%, não sem ressalvar que "a questão não é matemática, devendo equivaler, ainda que por ficção jurídica, ao grau de culpa pelo infortúnio".
Em relação ao dano, o relator anotou que não há como negar a dor da viúva e das filhas e que a perda precoce de um pai de família dispensa qualquer prova de sofrimento. Fundamentou, ainda, que "o prejuízo sofrido com a perda de ente familiar tão próximo acarreta às autoras o direito à reparação (dano reflexo ou em ricochete)", e majorou o valor da indenização por dano moral para R$ 40 mil para cada autora, totalizando R$ 120 mil.
Quanto à indenização por dano material, fixada pelo juiz de primeiro grau em R$ 55.542,46, o colegiado afastou as pretensões da reclamada de excluir a condenação e, ainda, de deduzir do montante os valores pagos a título de seguro de vida e pensão previdenciária por morte. De outro modo, o julgado deu parcial provimento ao apelo das reclamantes para majorar a indenização para R$ 168.478,82, pago em parcela única, sob os fundamentos de que a expectativa de vida do trabalhador era de 75 anos e de que o décimo-terceiro salário também deve ser incluído na indenização, em razão da aplicação do princípio da restituição integral. (Processo 0010960-86.2015.5.15.0150)
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