Professores debatem modelos de terceirização uruguaio e brasileiro em Congresso do TRT-15

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As vantagens e as desvantagens da terceirização foram o tema do último painel de quinta-feira (8/6) do Congresso Nacional de Direito do Trabalho e Processual do Trabalho, realizado pelo TRT-15, no município de Paulínia. De um lado, o modelo uruguaio de regulação dos serviços terceirizados, apresentado pelo professor da Faculdade de Direito da Universidade da República do Uruguai Mario Garmendia Arigón. De outro, a versão brasileira, recém-regulamentada e detalhada aos mais de 1.000 congressistas pelo presidente da Comissão de Graduação do Departamento de Direito do Trabalho e Seguridade Social da Universidade de São Paulo, professor Otávio Pinto e Silva.

Coube ao coordenador do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos do TRT-15, desembargador José Otávio de Souza Ferreira, a mediação do painel e a introdução dos debates. "A resistência à terceirização é uma resistência à precarização do trabalho. Um tema desta relevância para a sociedade brasileira não pode, de forma alguma, ser tratado às pressas, de forma irresponsável e oportunista", afirmou.

Antes de detalhar a regulamentação da terceirização no Uruguai, o professor Arigón fez questão de estabelecer uma premissa que acompanhou toda sua palestra: o caráter concreto do direito do trabalho faz com que incorram em erro aqueles que tentam comparar o ordenamento jurídico utilizado em um país ao de outro. "O direito do trabalho é um direito apegado à realidade. Ele se constrói a partir do contexto, da história, da cultura de cada sociedade", destacou.

Para o professor Arigón, no mundo, há dois tipos de regulamentação do trabalho terceirizado. Há países que optam por proibi-lo ou por restringi-lo. Há também sociedades que não o limitam nem o restringem, apenas atribuem responsabilidades a quem utiliza esse tipo de mão de obra. Foi por essa última via que optou a sociedade uruguaia, que, em 1943, editou a primeira norma sobre o tema, na qual se estabelecia a responsabilidade subsidiária do empresariado.

"Atualmente, duas leis regulam o trabalho terceirizado no Uruguai. Uma de 2006 e outra de 2007. A primeira estabeleceu um regime de responsabilidade solidária. A segunda, após pressão do empresariado, consagrou o atual regime, em que o empregador pode optar por ter responsabilidade solidária ou subsidiária", esclareceu. Tem responsabilidade subsidiária aquele que assume a responsabilidade de fiscalizar o cumprimento dos direitos trabalhistas dos terceirizados admitidos pela empresa intermediadora de mão de obra. Caso opte por não fazê-lo, assume solidariamente os encargos trabalhistas.

"Um sistema como esse seria eficaz aqui no Brasil? Não podemos saber. São realidades muito distintas", afirmou o professor Arigón. Ele lembrou que há no Uruguai uma cultura de cumprimento de normas e de sentenças judiciais. Lá, por exemplo, não há a necessidade de os processos chegarem à fase de execução. Sentenças são cumpridas espontaneamente. Além disso, um sindicalismo forte (maior taxa de filiação espontânea de trabalhadores no mundo, com aproximadamente 30%; no Brasil, 16%), um empresariado responsável e um estado presente na vida da sociedade inibem a precarização da mão de obra terceirizada.

Modelo brasileiro

A Lei 13.429, aprovada em 31 de março, e a reforma trabalhista debatida no Congresso Nacional foram os instrumentos legais utilizados pelo professor Otávio Pinto e Silva para analisar a terceirização no Brasil. "Essa lei foi fruto de uma jogada do presidente da Câmara dos Deputados, que ignorou uma discussão anterior e ressuscitou um projeto de lei que estava arquivado desde 2002", destacou.

Para convencer a sociedade de que o desemprego de 14 milhões de pessoas é consequência do excesso de regras trabalhistas, de acordo com o professor da USP, grupos parlamentares, da imprensa, empresariais e outros segmentos da sociedade elegeram a Justiça do Trabalho e o princípio protecionista do Direito do Trabalho como responsáveis e protagonistas da atual crise.

Surgiram, então, uma série de declarações à imprensa, afirmando que a Justiça do Trabalho não deveria existir, que os tribunais extrapolam seu escopo de atuação e  que o Tribunal Superior do Trabalho seria um laboratório do Partido dos Trabalhadores. Ainda segundo o professor, os cortes orçamentários iniciados no ano passado seriam outra face dos ataques, somados a notícias falsas distribuídas nas redes sociais. Exemplo dessas mentiras é uma "reportagem" que narra a decisão de um juiz do trabalho de Vila Velha, autorizando uma funcionária a se masturbar no trabalho. "Não existe vara do trabalho em Vila Velha, município que está na jurisdição de Vitória. Essas mentiras servem apenas para reforçar a tese de que a Justiça do Trabalho está a serviço das ‘maluquices de advogado'", disse.

Para finalizar o painel, o professor Otávio Pinto e Silva narrou como os mesmos grupos que atacam a Justiça do Trabalho passaram a defender e estimular o projeto de reforma trabalhista. "Eles perceberam que a lei aprovada em março não permite a terceirização irrestrita, por eles almejada", afirmou. Ao definir que a terceirização deve ser utilizada para serviços determinados e específicos, a Lei 13.429 limitou o escopo de atividades passiveis de serem terceirizadas.

"A regulamentação da terceirização é primeiro caso na história brasileira de uma lei aprovada no final de um mês e que, poucos dias depois, já havia uma proposta de alteração sendo debatida no Congresso", esclareceu. Segundo o professor, a reforma trabalhista tem, entre outros objetivos, a intenção de dar amplitude geral e irrestrita a terceirização. "A frase de [Otto von] Bismarck ainda é muito atual: as leis são como salsichas; é melhor não saber como elas são feitas", concluiu.

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