Painel sobre as novas formas de trabalho introduzidas pela reforma trabalhista e suas consequências para a segurança do trabalhador encerra seminário no TRT
O desembargador Fabio Grasselli, presidente da 10ª Câmara do TRT-15, e a médica Renata Matsmoto, chefe da Seção de Segurança e Saúde no Trabalho da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE), órgão do Ministério do Trabalho (MT), protagonizaram o quarto e último painel do seminário "Os desafios na proteção à saúde e à segurança do trabalhador em face da reforma trabalhista", promovido em 27/4 pela Escola Judicial do Tribunal e pelo Programa Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho, na sede da Corte, em Campinas. Desta vez, o debate, coordenado pelo desembargador Lorival Ferreira dos Santos, gestor regional do Programa no 2º grau de jurisdição, focou as consequências, para a segurança do trabalhador, das novas formas de trabalho introduzidas pela Lei 13.467/2017.
Fabio Grasseli centrou sua exposição na crítica ao novo artigo 611-A da CLT, que determina que a convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei quando dispuserem, entre outros temas, sobre a jornada de trabalho, desde que observados os limites constitucionais, e sobre o intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas superiores a seis horas. O magistrado também expressou sua indignação quanto ao disposto no artigo 611-B, o qual, embora vete a negociação sobre a supressão ou redução das normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em normas regulamentadoras do MT, estabelece, em seu parágrafo único, que "regras sobre duração do trabalho e intervalos não são consideradas como normas de saúde, higiene e segurança do trabalho para os fins do disposto neste artigo". "O parágrafo único do artigo 611-B é de corar qualquer um. É óbvio que trabalhar mais de oito horas por dia tem repercussão na saúde do trabalhador. Sem falar no prejuízo existencial, causado pela dificuldade de convivência familiar. É evidente o dano existencial de jornadas exorbitantes. A vida não é só trabalho. Como desembargador, tenho decidido pela reparação por danos morais nos casos de jornadas muito elevadas", afirmou Grasselli.
Ainda sobre o intervalo intrajornada, o palestrante criticou a nova redação dada ao parágrafo 4º do artigo 71 da CLT, que determina que a não concessão ou a concessão parcial ao trabalhador do intervalo mínimo de uma hora para repouso e alimentação "implica o pagamento, de natureza indenizatória, apenas do período suprimido, com acréscimo de 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho". Pela redação anterior do parágrafo, incluída pela Lei 8.923/1994, caso o intervalo ou parte dele não fosse concedido pelo empregador, este ficava obrigado a remunerar todo o período correspondente, acrescido de no mínimo 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho. "Além de não ter de remunerar o período integral, a remuneração passou a ter natureza indenizatória e não salarial, com evidente prejuízo para o trabalhador. Ora, intervalo para refeição e descanso é para dar melhores condições de saúde ao trabalhador. A minimização das consequências da retirada ou restrição desse direito terá certamente repercussão na sua saúde", advertiu Grasselli.
Na avaliação do desembargador, a terceirização ou quarteirização da atividade-fim das empresas também terá consequências maléficas sobre a saúde e a segurança do trabalhador, "uma vez que terceirizados não recebem treinamento periódico, habitual, como os empregados da empresa. E quanto menor a atuação preventiva, mais acidentes tornam-se possíveis".
O magistrado demonstrou preocupação ainda com as inovações da reforma trabalhista relativas à saúde e segurança do empregado que presta serviços em regime de teletrabalho. "O artigo 75-E determina que o empregador deverá instruir os empregados em teletrabalho, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho, mas dispõe também que o trabalhador deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções recebidas. Com isso exime-se o empregador da fiscalização do cumprimento das medidas e de eventuais danos aos trabalhadores", lamentou.
Já a exposição da doutora Renata Matsmoto trouxe o olhar do Ministério do Trabalho. Segundo a palestrante, as mudanças trazidas pela reforma trabalhista agravam uma situação já crítica com relação à fiscalização das condições de saúde e segurança dos trabalhadores, as quais, segundo ela, tendem a se deteriorar com a liberação da terceirização e do trabalho insalubre de grávidas e lactantes. "Num quadro de deficit de auditores fiscais – são 3.800 em todo o Brasil, dos quais cerca de 400 em São Paulo –, teremos ainda mais dificuldade em fiscalizar e obrigar as empresas prestadoras de serviço a cumprir as normas de segurança e saúde do trabalho", avaliou Renata, para quem o investimento em equipamentos de proteção individual (EPIs) e na capacitação dos trabalhadores precisaria ser acompanhado de medidas de proteção coletiva. Ela defendeu também o estreitamento da parceria com a Justiça do Trabalho, de modo que o Ministério do Trabalho possa ter acesso, de forma informatizada, ao número de condenações de cada empresa.
Outro ponto abordado foi a responsabilidade das empresas contratantes de mão de obra terceirizada. "Hoje as grandes construtoras, por exemplo, não têm mais empregados contratados, e sim trabalhadores avulsos, que atuam sem qualquer treinamento. Com a reforma trabalhista, tornou-se ainda mais difícil cobrar a legislação de segurança de empresas com terceirizados. Precisamos, e para isso contamos com a ajuda da Justiça do Trabalho, responsabilizar as empresas contratantes no sentido de que elas acompanhem o cumprimento, pelas empresas contratadas, das medidas de segurança no trabalho."
Renata criticou ainda a possibilidade de prorrogação de jornada em ambientes insalubres mediante acordo, sem licença prévia das autoridades competentes do Ministério do Trabalho (art. 611-A, inciso XIII), e, em especial, o teor do artigo 394-A, inciso II, que condiciona o afastamento de empregada grávida de atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo à apresentação de atestado de saúde emitido por médico recomendando a medida. "Esta é uma legislação perversa. O ônus de preservação da vida do nascituro não pode recair só sobre a gestante e lactante. Um de nossos desafios é, portanto, resguardar a vida e integridade física do feto."
"É evidente a pretensão dos reformadores de diminuir os custos com o pagamento de adicionais e a promoção de medidas de segurança e de retirar o óbice da prorrogação de jornada", alertou, por fim, a palestrante, que, como o colega que a antecedeu, avaliou como absurda a ideia de não se considerar a duração do trabalho e os intervalos intrajornadas como normas de segurança. "Qualquer análise mais acurada sobre os acidentes de trabalho e os adoecimentos e transtornos relacionados ao trabalho vai concluir que eles estão estritamente relacionados ao excesso de jornada e ao desrespeito ao intervalo mínimo. A nova legislação só vai agravar essa situação."
Encerrando o evento, o desembargador Lorival Ferreira dos Santos, presidente do TRT no biênio 2014-2016, falou sobre a relevância do seminário, "que contemplou a maioria dos aspectos da temática proposta", e sobre a importância de uma maior aproximação com o Ministério do Trabalho.
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