Câmara afasta condenação de testemunha que havia sido aplicada com base em mudança trazida pela reforma trabalhista

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Por Ademar Lopes Junior

A 1ª Câmara do TRT-15 excluiu a condenação de uma testemunha da Usina Caeté S.A. ao pagamento de multa por litigância de má-fé, aplicada pelo juízo da Vara do Trabalho de Dracena, que havia entendido que as contradições no depoimento da testemunha, quanto à duração do intervalo do trabalhador, revelaram tentativa de "favorecer a reclamada". A condenação havia sido de 2% do valor atualizado da causa, com base no artigo 793-D da Lei 13.467/2017, que instituiu a chamada reforma trabalhista.

Em seu recurso, a empresa pediu a exclusão da multa em questão, sob o argumento de que a testemunha "não prestou depoimento contraditório às demais provas dos autos".

O relator do acórdão, desembargador Jorge Luiz Souto Maior, concordou com o pedido, mas antes fez críticas à reforma trabalhista de 2017, afirmando que, no caso, "por ironia histórica, ao contrário do que se projetava com a sua aprovação, foi utilizada para punir a litigância do empregador", e que, por isso, "o feito é bastante sintomático, pois permite aos maiores defensores da denominada 'reforma' trabalhista, os empregadores, verificarem um pouco dos desvios jurídicos cometidos pela Lei 13.467/2017".

O acórdão ressaltou que a condenação foi feita "sem acusação, sem defesa, sem contraditório e com trânsito em julgado automático". O colegiado salientou que o juízo de primeiro grau, com base no artigo 793-D da nova lei, "condenou alguém que não era parte em um processo e que, por isso mesmo, não teve oportunidade de oferecer defesa, até porque a fase de acusação foi suprimida, passando-se direto para a condenação, sem passar pelo duplo grau de jurisdição para ser executada".

O acórdão afirmou ainda que o juízo de primeiro grau aplicou o dispositivo sob o argumento de que "toda lei se presume constitucional", mas, para o colegiado, "para a preservação da autoridade da Constituição, a presunção de constitucionalidade da lei não basta", pois "é preciso que o preceito jurídico a ser aplicado não fira a Constituição e esta verificação deve ser feita, concretamente, pois o compromisso jurisdicional é o do respeito à ordem jurídica como um todo, com vistas, sobretudo, à efetivação do Estado Democrático de Direito, dentro do objetivo fundamental de preservação e elevação da dignidade humana".

O colegiado afirmou ainda que "acima da Lei 13.467/2017 estão a Constituição Federal, as Convenções da OIT - ratificadas pelo Brasil (e mesmo as não ratificadas, sobretudo aquelas que são consideradas fundamentais pela Organização) - e os Tratados Internacionais de Direitos Humanos". Sustentou também que os juízes do trabalho se manifestaram, conforme Enunciado nº 1 da 2ª Jornada da Anamatra, sobre a ilegitimidade da Lei 13.467/2017 "nos sentidos formal e material".

O relator assinalou que o artigo 793-D da Lei 13.467/2017 "fere a segurança jurídica determinada pelo Estado Democrático de Direito, ao estabelecer punição processual para quem não é parte e que, por consequência, não tem como se defender, sendo o acusador e o julgador o próprio juiz".

O texto se refere à suposta intenção da testemunha de "alterar a verdade dos fatos ou omitir fatos essenciais ao julgamento da causa". Mas qual é a "verdade dos fatos?", questiona o acórdão. Para o colegiado, "a constatação de que a testemunha prestou declarações contraditórias não é prova, por si, de que ela teve a intenção de alterar a verdade dos fatos, até porque pode apenas ter se confundido durante o depoimento".

"Com efeito, fazer juízo equivocado do fato é bem diferente de ter a 'intenção' de alterá-lo", concluiu o colegiado. (Processo 0010062-77.2018.5.15.0050)

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