Encerramento do seminário no TRT-15 apontou a educação, a inclusão e o combate a fraudes como instrumentos de eliminação do trabalho infantil

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A desembargadora Maria Madalena de Oliveira, vice-corregedora da Justiça do Trabalho da 15ª Região, presidiu a mesa do 3º Painel do Seminário "Trabalho Infantil: Infância Perdida, Educação Comprometida, Exclusão Inevitável", realizado na última sexta-feira, 6/12, no plenário "Ministro Coqueijo Costa", no 3º andar do edifício-sede do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região. Foram convidados para debater o tema "Educação, Inclusão e Combate a Fraudes como instrumentos de eliminação do Trabalho Infantil" o desembargador do TRT-9 (PR) Ricardo Tadeu Marques da Fonseca e a juíza Eliana dos Santos Alves Nogueira, titular da 2ª Vara do Trabalho de Franca e coordenadora do Juizado Especial da Infância e da Adolescência (Jeia) daquela cidade.

A desembargadora Maria Madalena fez questão de homenagear e cumprimentar publicamente o desembargador João Batista Martins Cesar "pelo seu aniversário e pelo trabalho tão importante desenvolvido à frente do Comitê de Erradicação ao Trabalho Infantil do TRT-15". Em relação aos convidados para apresentarem o tema, a vice-corregedora do TRT-15 disse "ter muito orgulho de estar ao lado deles", e registrou que eles são "nossos", referindo-se à juíza Eliana e, também, à trajetória do atual desembargador do tribunal paranaense Ricardo Tadeu, que iniciou a carreira como procurador do Ministério Público do Trabalho em Campinas.

Estágio e fraude

A coordenadora do Jeia de Franca, juíza Eliana dos Santos Alves Nogueira, apresentou o tema "O estágio no ensino médio regular e sua inadequação para garantir transição escola-trabalho. Combate às situações de fraude que geram passivo trabalhista. Alternativas". A magistrada, que também é gestora regional do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem do TST – CSJT e membro do Comitê correlato no TRT-15, iniciou sua exposição com um panorama do jovem brasileiro no mercado de trabalho, que aponta, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que ¼ dessa geração de jovens nem trabalha, nem estuda, o que segundo ela "é uma tragédia para o mercado" por revelar uma juventude despreparada para o trabalho e o consequente comprometimento da economia em R$ 3 bilhões/ano.

A magistrada defendeu que é preciso "mudar o discurso atual" e começar a profissionalizar os jovens, investindo-se no "capital humano, que é o melhor para garantir o retorno financeiro e econômico para o país". Com relação ao estágio no ensino médio, a juíza ressaltou as inúmeras fraudes que envolvem essa relação entre os jovens e os empresários, e criticou a cultura empresarial de se aproveitar dessa mão de obra para baratear os custos de produção. Dentre os principais problemas elencados, estão a falta de um acompanhamento desses estagiários (ao contrário dos contratos de aprendizagem), a violação do número máximo de estagiários por empresa, a falta de plano de atividades, o trabalho executado sem relação com o estágio, e a geração, por tudo isso, de um grande passivo trabalhista.

Dentre as soluções sugeridas, a magistrada apontou, a partir da previsão da própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), a possibilidade de mudança da grade curricular do ensino médio para a efetiva preparação do jovem para o mercado de trabalho. Segundo a palestrante, o principal problema dos adolescentes e jovens que buscam trabalho, especialmente os que se encontram em situação de vulnerabilidade (miséria econômica, envolvimento com o tráfico de drogas, exploração sexual ou provindos de lares destruídos), se refere ao seu comportamento inadequado nas entrevistas (48% dos casos), que nada mais é do que a demonstração da falta de habilidades socioemocionais (autoconfiança, empatia, espírito de equipe, ética, criatividade) que precisam ser aprendidas por todos ao longo da vida.

A magistrada também elencou algumas alternativas para a transição do jovem da escola para o mercado de trabalho, dentre elas a implantação do ensino integral para garantir a incorporação, ao ensino regular, de recursos e treinamentos vocacionais; o incentivo, durante o ensino médio, à elaboração de projetos transversais nas disciplinas curriculares capazes de desenvolver habilidades socioeconômicas (exemplo: ações sociais, solidárias e voluntárias, diagnóstico da realidade local e proposições, e criação de oficinas de leituras e laboratórios); e, por fim, o incentivo às escolas de ensino médio para a criação e desenvolvimento em parcerias com universidades, institutos, ONGs, órgãos públicos e empresas.

A juíza Eliana concluiu sua apresentação, lembrando que um dos maiores desafios para se tirar o jovem de sua condição de vulnerabilidade é a garantia de uma renda, e nesse sentido, a magistrada reafirmou a necessidade de criação de projetos curriculares, tutorias e estágios efetivos com renda, e que visem ao desenvolvimento das habilidades socioemocionais.

Dever do Estado

O desembargador do TRT-9 Ricardo Tadeu falou sobre "O dever do Estado de oferecer educação básica e o direito de não trabalhar antes da idade prevista para sua conclusão". Para o magistrado, toda a questão reside no (des)cumprimento constitucional do artigo 227, que prevê a proteção integral da criança e do adolescente, por parte da família, da sociedade e do Estado, e o tratamento "absolutamente" prioritário a ser dedicado a eles, e como ressaltou o desembargador, esse "tratamento não pode ser mais ou menos, mas pleno, absoluto".


O magistrado ressaltou, como o primeiro direito da criança a ser garantido, "o direito de ser criança, de brincar e de sonhar" e, para o adolescente, "o direito de atravessar com segurança essa fase da vida, de tanta fragilidade emocional". Nesse sentido, o trabalho precoce é uma "anomalia", afirmou o palestrante, que chamou de "inconstitucional" a prática de estágio sem a proteção trabalhista, e defendeu que o principal direito a ser assegurado às crianças e adolescentes é o da educação. "O trabalho precoce rouba a infância e a adolescência e é uma vergonha nacional", afirmou o desembargador.

O magistrado criticou também o projeto Primeiro Emprego, do governo federal, que restringe direitos ao jovem que precisa entrar no mercado de trabalho. De acordo com o palestrante, a iniciativa é "altamente inconstitucional" porque fere o artigo 227 da CF. Segundo o magistrado, o correto seria o governo promover "isenção fiscal das empresas que contrastassem os jovens, ao invés de tirar deles mais direitos".

Encerramento

Ao final dos trabalhos, o desembargador João Batista Martins Cesar, presidente do Comitê de Erradicação do Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem do TRT-15, apresentou suas considerações sobre o evento que, segundo ele, abriu o debate para ideias que deverão ajudar a sociedade a combater o problema do trabalho infantil no país.

O desembargador afirmou o papel da Justiça do Trabalho de defender os direitos humanos e sociais e não permitir retrocessos, e lembrou a  "conspiração do universo" em favor do evento, que reuniu pessoas tão engajadas nesse trabalho há tanto tempo, e ressaltou, por exemplo, uma decisão em uma Ação Civil Pública envolvendo a desembargadora Maria Madalena de Oliveira, quando atuava como juíza de primeira instância em Bauru, em meados nos anos 1990, e que serviu, segundo ele, como paradigma em defesa dos estagiários num grande banco oficial.

A Mesa Alta do encerramento da solenidade foi composta também pela desembargadora Maria Madalena de Oliveira, pelo desembargador do TRT-9 (PR) Ricardo Tadeu Marques da Fonseca, pelo procurador do MPT Ronaldo José de Lira, pelas juízas Eliana dos Santos Alves Nogueira e Camila Ceroni Scarabelli, respectivamente coordenadoras dos Jeias de Franca e de Campinas, pelo juiz aposentado José Roberto Dantas Oliva, e pelo professor Victor Hugo de Almeida, da Universidad Estadual Paulista (Unesp) "Julio de Mesquita Filho". 

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Comunicação Social