Jornalista Leonardo Sakamoto, da Ong Repórter Brasil, discorre sobre trabalho escravo no sistema produtivo em simpósio no TRT-15
Dando sequência ao Simpósio "Trabalho Escravo Contemporâneo" realizado na sexta-feira, 11/10, no Plenário do TRT da 15ª Região, o jornalista Leonardo Moretti Sakamoto, fundador da Organização Não Governamental Repórter Brasil, discorreu sobre o tema do trabalho escravo no sistema produtivo em mesa presidida pela desembargadora Eleonora Bordini Coca, integrante do Comitê de Erradicação do Trabalho Escravo, Tráfico de Pessoas e Discriminação do Tribunal. Sakamoto é formado pela Universidade de São Paulo (USP), com mestrado e doutorado em Ciência Política, e, entre outras atividades, faz parte do Liechtenstein Initiative, um projeto conjunto dos governos de Liechtenstein, Austrália, Holanda, do secretariado nas Nações Unidas e de instituições e fundações privadas do setor financeiro global contra a escravidão moderna e o tráfico de pessoas.
Ao introduzir o tema, o jornalista apontou semelhanças entre a iniciativa recente de elaboração de proposta de emenda constitucional para extinguir a Justiça do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho e as tentativas recorrentes de se revogar determinadas conquistas no combate ao trabalho escravo obtidas desde 1995, quando o Brasil reconheceu, perante as Nações Unidas, a persistência de formas contemporâneas de escravidão. "Essa discussão se conecta com uma discussão maior. Há setores da sociedade e da política que não veem importância nas regras trabalhistas. Trata-se de uma tremenda bobagem porque ambos os órgãos têm o objetivo de possibilitar um equilíbrio entre dois grupos, empregadores e empregados, que são naturalmente conflitivos. Promover insegurança jurídica nesse momento em que o Brasil derrapa e patina para a retomada do crescimento é economicamente irresponsável", salientou.
Como exemplo dessa semelhança, Sakamoto lembrou de episódio ocorrido no ano passado, em que se tentou afrouxar as regras de fiscalização com a edição de uma medida provisória para alterar critérios de classificação do trabalho escravo. Para o jornalista, essas tentativas buscam "atender a determinados grupos de empregadores que não percebem que o regramento ajuda muito mais no desenvolvimento do seu próprio setor e mesmo no comércio internacional do qual o Brasil está inserido, protegendo a qualidade social e ambiental de produtos".
Em 2003, ano em que o governo brasileiro criou o Cadastro de Empregadores - a popular "lista suja" de empresas que submetem trabalhadores a condições análogas à escravidão –, a Repórter Brasil desenvolveu uma metodologia para identificação e rastreamento sistemático de cadeias produtivas flagradas e incluídas na relação. Sakamoto apresentou o cadastro de empregadores disponível no site do Ministério da Economia e também o rastreamento realizado pela Repórter Brasil de produtos de algumas cadeias inseridas na lista como soja, algodão, carvão vegetal e gado bovino, do momento da produção até o comércio nacional e internacional. Evidenciou ainda o valor de uma marca e os impactos negativos causados, inclusive no mercado de ações, quando ela é associada à prática de trabalho escravo ou infantil.
Segundo o jornalista, a lista está sendo utilizada pelos setores produtivo, financeiro e bancário para o gerenciamento de risco social trabalhista, o que considera de grande relevância. "Não se trata de restrição ou boicote a determinado produto e sim de um instrumento de transparência, de governança pública e privada, e de garantia de informações para a sociedade". Ainda de acordo com o palestrante, cabe também às empresas, dentro do conceito de responsabilidade social, agir ou não a partir da informação divulgada, sabendo dos riscos para os seus negócios e da possibilidade de sofrerem algum tipo de sanção no mercado.
Por fim, Leonardo Sakamoto destacou que, apesar das dificuldades, o Brasil é referência mundial no combate ao trabalho escravo, cujo regramento inspirou leis no estado da Califórnia (EUA), Reino Unido, França e Austrália. Citou como exemplos uma resolução do Banco Central que proíbe a concessão de crédito rural a empresas incluídas na lista suja e a própria atuação da Justiça do Trabalho e do MPT. "Combater trabalho escravo não é apenas uma questão humanitária e civilizacional, considerando que temos 40,3 milhões de pessoas no mundo em situação de trabalho escravo contemporâneo e que produzem um lucro de US$ 150 bilhões anuais, tornando-se um dos três principais crimes globais". Para Sakamoto, é preciso mudar a percepção do empresariado, inserindo o combate ao trabalho escravo no centro do negócio das empresas como política de gestão competitiva.
- 85 visualizações