Primeiro painel conta a história do caso Shell

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Por Ademar Lopes Junior

"A história da contaminação do meio ambiente do trabalho ocorrido em Paulínia" foi o tema do primeiro painel do seminário "As grandes contaminações e suas repercussões", e que contou com o depoimento pessoal de Antonio de Marco Rasteiro, coordenador da Associação das Vítimas no período de 2001 a 2015, com a apresentação da procuradora do trabalho da 15ª Região Clarissa Ribeiro Shinesteck, e com o procurador Paulo Penteado Crestana, como presidente de mesa.

Com 21 anos dedicados ao setor químico, Antonio Rasteiro, atualmente aposentado, prestou seu depoimento abordando questões relacionadas ao relatório de impacto ambiental elaborado pela Shell, por ocasião de sua venda, em 1992. O antigo empregado, que participou da elaboração desse relatório, afirmou que, de início, não tinha conhecimento nem da extensão nem da gravidade dos danos promovidos pela empresa, quer para o meio ambiente, quer para a saúde de seus funcionários, com a produção de Drins (aldrin, endrin e dieldrin), compostos por substâncias altamente cancerígenas, que se alojam principalmente no tecido adiposo.

 

De acordo com Rasteiro, "foram muitos os erros cometidos", e hoje, com a própria saúde comprometida, bem como a saúde de sua filha e da esposa, pela exposição habitual e permanente à contaminação, o sentimento é de uma "revisão de mundo e da própria vida".

A procuradora Clarissa Shinesteck apresentou um histórico da contaminação no centro industrial em Paulínia (Recanto dos Pássaros), iniciando-se pela instalação de uma indústria química da Shell, na década de 1970, contrariando laudos de impacto da Cetesb, na época, pela proximidade do rio Atibaia. A empresa atraiu facilmente empregados com excelentes salários e benefícios, e mesmo tendo a sua produção de agrotóxicos à base de substâncias altamente cancerígenas como os Drins (aldrin, endrin e dieldrin) proibida nos Estados Unidos, desde 1971, no Brasil, a Shell iniciou a produção sem se preocupar com a contaminação que se confirmou com o tempo, tanto pelo ar, pelo solo e pela pele, contrariando normas de segurança e expondo seus funcionários e familiares, além do meio ambiente, a uma contaminação extremamtente perigosa, com danos irreversíveis e letais, mesmo em pequenas doses, cujo conhecimento de sua extensão e intensidade são ainda desconhecidos. Falhas no processo produtivo, na estocagem, na incineração (que também gerava outros poluentes) foram registradas, com contaminação por outras substâncias como cromo, vanádio, zinco e óleo mineral.

 

Até 2001, com o início da atuação do Ministério Público do Trabalho, na elaboração do inquérito civil, a empresa só tinha feito estudos relacionados com o meio ambiente, e nenhum sobre a saúde dos trabalhadores. Foi com base no Protocolo de Atenção à Saúde, elaborado pelo Ministério da Saúde, que reuniu o máximo de informações possível e que se transformou num paradigma no Sistema Único de Saúde para casos de exposição a substâncias tóxicas, que o MPT, com ajuda de instituições representantes dos ex-trabalhadores, pediu a responsabilização da empresa, por meio de uma ação civil pública. Essa atuação culminou na condenação mais emblemática da história da Justiça do Trabalho, e que garantiu o atendimento médico vitalício a 1.058 vítimas (trabalhadores e seus familiares), além de indenização por danos morais individuais, no valor de R$ 83,5 milhões, danos materiais de R$ 87,3 milhões e uma indenização por danos morais coletivos de R$ 200 milhões que foram destinados, entre outros, à construção de hospitais e centros de pesquisa, prevenção e tratamento a trabalhadores vítimas de intoxicação.

Num balanço geral, a procuradora afirmou que o que marca a história, nesse caso, é a ausência de informações, o descaso com os trabalhadores, e o risco assumido abertamente pela empresa de lesar a vida com um produto que chegou a ser proibido de ser comercializado no País em 1985, mas que continuou sendo produzido para exportação até 1990.

O presidente de mesa, o procurador Paulo Crestana, registrou que tanto o depoimento de um ex-trabalhador da Shell, quanto a apresentação do histórico do caso revelam mais que o passado, mas o presente, que se perpetua indefinidamente pelo desconhecimento dos danos praticados, pelo número de doentes que ainda podem surgir, vítimas de uma ação de mais de 30 anos atrás, sem contar com a contaminação do meio ambiente e os prejuízos futuros.

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Comunicação Social