Quarto painel do Congresso do TRT-15 analisa o trabalho rural no século XXI
Por Ademar Lopes Junior
As "Perspectivas do trabalho rural no século XXI" foram o tema do quarto painel do 19º Congresso Nacional de Direito do Trabalho e Processual do Trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região. A coordenação dos trabalhos ficou a cargo da vice-presidente judicial da Corte, desembargadora Tereza Aparecida Asta Gemignani, e o assunto foi abordado pelos palestrantes Roberto Funes Abrahão, professor associado da Faculdade de Engenharia Agrícola da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e Ricardo Tadeu Marques da Fonseca, desembargador do TRT-9 (PR).
O professor Roberto Abrahão, que é mestre em Engenharia Agrícola pela Unicamp na área de máquinas agrícolas e doutor em Engenharia Mecânica pela mesma universidade na área de projeto mecânico, além de livre-docente na área de Ergonomia, abordou os aspectos técnicos do trabalho rural, mais precisamente a teoria do equilíbrio das dimensões física, cognitiva e afetiva do trabalho.
De acordo com o palestrante, o trabalho rural ainda é um dos setores que mais empregam no mundo. Só no Brasil ele representa 10,3% da força de trabalho. Sua natureza complexa exige, porém, diferentes habilidades e dimensões cognitivas dos trabalhadores (controle de atenção, consciência situacional, cooperação, processamento de informações, tomada de decisões e inteligência cinestésica corporal), dependendo muito das diversas relações de organizações do trabalho (tipos de cultura). Outro desafio enfrentado pelos trabalhadores rurais são os fatores de risco, que envolvem diretamente sua saúde e segurança. Nesse sentido, os equipamentos de proteção individual (EPIs) que deveriam servir para proteger os rurais estão longe de cumprir esse papel, sustenta o palestrante. Segundo o professor, a maioria dos EPIs disponíveis no mercado são inadequados e de baixa proteção, o que, para o especialista, reflete desconhecimento técnico dos produtores desses equipamentos a respeito das reais condições do trabalho realizado no meio rural.
Outros pontos abordados pelo palestrante foram a crescente feminização no campo e o desafio da engenharia na adequação das ferramentas de trabalho para as mulheres, o crescimento da agricultura orgânica e sua correlação com a saúde do trabalhador e, ainda, os efeitos da mecanização da cultura sucroalcooleira no Estado de São Paulo, como a eliminação das mortes por exaustão dos cortadores de cana e a redução, para apenas 2% em comparação com o número máximo já atingido, da mão de obra empregada.
O segundo palestrante, o desembargador Ricardo Tadeu, prometeu trazer o desafio das inquietações, mas negou qualquer resposta pronta para o tema que ele escolheu abordar, "até porque essas soluções ainda estão para ser construídas". O magistrado evocou o conceito de dignidade para combater o que ele chamou de "império do mercado sobre o humano" e criticou duramente o fato de os direitos sociais serem encarados hoje como um "custo ao livre trânsito da riqueza". Afinal, "o mercado deve estar a serviço do homem, ou o homem a serviço do mercado?', questionou.
Nesse sentido, o magistrado, que também é epecialista e mestre em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Universidade de São Paulo, além de doutor em Direito das Relações Sociais pela Universidade Federal do Paraná, discorreu sobre a evolução dos direitos humanos, primeiro como direitos individuais, com a Declaração dos Direitos Humanos, vindo depois os direitos sociais e, mais recentemente, a adoção do conceito social para os direitos das pessoas com deficiência. Esse reconhecimento no Brasil, segundo o palestrante, está sedimentado na Constituição Federal e ganha uma dimensão política, segundo a qual a definição de deficiência não mais se encontra na pessoa, mas nas barreiras (físicas, tecnológicas e até atitudinais) que impedem o pleno exercício da cidadania.
Essa mudança de conceito impõe às empresas a necessidade de adaptações que, na opinião do magistrado, precisam ser, no mínimo, razoáveis. Nesse sentido, o uso das tecnologias assistivas podem remover as barreiras. Segundo o palestrante, é emblemático o exemplo do Sindicato da Indústria da Construção Civil de São Paulo (Sinduscon), que elencou mais de 140 atividades possíveis a trabalhadores com alguma deficiência nos canteiros de obras, e abre portas para outras atividades, como o trabalho rural, onde a mecanização pode ser uma aliada nesse processo de inclusão.
A coordenadora do painel, desembargadora Tereza Asta, deixou algumas reflexões, principalmente no que se refere à necessidade do "revigoramento do ordenamento jurídico como um sistema", basicamente em dois aspectos: a primazia da realidade e o princípio da proteção. A magistrada afirmou ainda que "a norma é vital para a pacificação social" e que "é preciso acreditar na força do jurídico". A desembargadora encerrou ressaltando que essa tarefa agora cabe aos juízes, advogados e demais operadores do Direito.
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