Projeto Primeira Chance de Franca deve destinar 95% das vagas a adolescentes socialmente vulneráveis

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O Município de Franca deverá destinar 95% e não apenas 20% das vagas ofertadas por meio do “Projeto Primeira Chance” a adolescentes em situação de vulnerabilidade social, num processo seletivo para preenchimento de 80 vagas para a contratação de aprendizes de auxiliar administrativo. A decisão unânime da 5ª Câmara do TRT-15, que teve como relator o desembargador Lorival Ferreira dos Santos, entendeu que é dever do Município estabelecer políticas públicas de inclusão da criança, do adolescente e do jovem, visando contribuir com a melhoria da grave situação a que estão submetidos durante a sua formação”. O colegiado justificou ainda a decisão com base no artigo 227 da Constituição Federal, que prevê a integralidade da proteção por parte da família, da sociedade e do Estado. Os outros 5% das vagas se destinam a pessoas portadoras de deficiência.

A condenação do município em primeira instância tinha se dado pela procedência de uma Ação Civil Pública do Ministério Público do Trabalho, que pedia a destinação de 95% das vagas ofertadas por meio do “Projeto Primeira Chance” aos adolescentes em situação de vulnerabilidade social, e não apenas 20%, como defendeu o município, que justificou que esse percentual atenderia aos critérios previstos em lei municipal. Em sua defesa, o município afirmou também que “a decisão proferida viola a separação de poderes, além de suprimir integralmente o direito do recorrente à autonomia municipal e ao poder de auto-organização administrativa inerente ao Poder Público”.

Para o relator do acórdão, em consonância com a sentença de autoria da juíza Eliana dos Santos Alves Nogueira, da 2ª Vara do Trabalho de Franca e coordenadora do Juizado Especial da Infância e Adolescência (Jeia) local, a questão trazida aos autos pelo Ministério Público do Trabalho, por meio da Ação Civil Pública, tem como centro “o princípio da proteção integral à criança e ao adolescente” e, neste caso, “especificamente a adolescentes aptos ao contrato de aprendizagem e em situação de vulnerabilidade socioeconômica, através de ações a serem implementadas pelo Município”. Nesse sentido, o colegiado afirmou que “cabe ao poder público, representado pelo Município, cumprir fielmente tal princípio”, que prevê, “dentre as garantias constitucionais, a que envolve o direito à profissionalização, alcançável, no caso, através do contrato de aprendizagem”. 

O colegiado lembrou, porém, que a profissionalização está estabelecida em sequência à garantia do direito à vida, à saúde, à alimentação e à educação, e salientou que essa escolha “não foi aleatória”, já que é preciso “primeiro garantir o direito à vida, à saúde, à alimentação e à educação para, garantidos estes direitos fundamentais, outro, tão fundamental quanto, possa ser garantido na sequência, como é o da profissionalização”. E nesse entendimento, segundo o acórdão, “encontra-se a chave para a interpretação adequada do princípio da proteção integral”, uma vez que, “quando ameaçados esses direitos fundamentais, “crianças, adolescentes e jovens, invariavelmente, são vítimas do trabalho infantil e, via de regra, nas suas piores formas, como o trabalho nas vias públicas, o tráfico de drogas e a exploração sexual”. 

O colegiado alertou ainda que “romper este ciclo de violência contra crianças e adolescentes em grave situação de vulnerabilidade social e econômica passa, necessariamente, por políticas educacionais adequadas”, como, por exemplo, o encaminhamento de tais adolescentes aos contratos de aprendizagem, “cujo viés educacional preponderante permite que eles frequentem a escola até o final do ensino fundamental II e, ao mesmo tempo, adquiram aprendizagem profissional que possibilite o rompimento do ciclo da pobreza e lhes garanta oportunidade de um futuro como cidadãos”. 

O acórdão ainda destacou o fato de que a própria municipalidade, em defesa e em audiência, por seus procuradores, chegou a indicar a possibilidade de fixação do percentual em 80% para os jovens em situação de grave risco social e vulnerabilidade, remanescendo 15% do percentual das vagas para adolescentes oriundos de família com renda de até um salário-mínimo mensal. Para o colegiado, esse reconhecimento da prioridade que deveria ser observada trata-se “praticamente de confissão real da municipalidade, no que diz respeito aos critérios que deveriam ter norteado o ente público municipal para fixação das condições de ingresso no Programa Primeira Chance”.

Outro ponto da defesa do município foi no sentido de que “não existiam jovens interessados para participar do certame e apenas poucos se inscreveram”. Para o colegiado, essa afirmação “beira a litigância de má-fé”, uma vez que a petição inicial “já evidenciava que o exíguo prazo para inscrição de tal público impediu que os adolescentes conseguissem efetuar a inscrição para participação”. Durante uma audiência realizada no Centro Judiciário de Métodos Consensuais de Solução de Disputas (Cejusc)  para tentativa de mediação, representantes dos CRAS e dos CREAS locais confirmaram a dificuldade de acesso dos adolescentes à inscrição para o “Programa Primeira Chance” decorreu do prazo exíguo concedido pela municipalidade e que, “em razão da precária estrutura de tais entidades, não houve tempo hábil para localização dos adolescentes e comunicação para que apresentassem a ficha de inscrição solicitando isenção”.

O colegiado concluiu, assim, que “cabe ao Município de Franca, na política pública adotada para contratação de aprendizes, direcionar os esforços e recursos, de forma integral, aos adolescentes mais vulneráveis, nos termos do artigo 227 da Constituição Federal, dos artigos 4º, parágrafo único, "c" e "d", e do artigo 259, parágrafo único da Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), até mesmo porque o artigo 37 da Constituição Federal estabelece que a Administração Pública deve obedecer aos princípios ali estabelecidos, dentre os quais o da eficiência”.

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