2ª Câmara nega indenização a motorista atacado com facão
A 2ª Câmara do TRT-15 negou provimento ao recurso do trabalhador que insistiu no pedido de reconhecimento da responsabilidade civil da empregadora pelos danos decorrentes do acidente de trabalho e, por consequência, as indenizações por danos morais, materiais e estéticos. O trabalhador, vítima de um ataque a facão de um terceiro agressor, além dos vários ferimentos pelo corpo e cabeça, perdeu o polegar da mão esquerda e a visão em um dos olhos.
No dia 30/8/2018, o trabalhador, um motorista de transporte escolar, começou mais um longo dia de serviço, com início às 5h30 e que encerraria às 19h30. Por volta das 6h30, já dentro do ônibus, ele e a monitora, sua companheira de trabalho, pararam no ponto escolar para captar as crianças, quando um homem se aproximou e entrou ao ônibus de uma forma intimidante, portando um facão em suas mãos e ameaçando matar a monitora. Mais tarde, soube-se que o agressor era um ex-namorado da monitora, que não teve tempo de fechar a porta do ônibus e impedir sua entrada.
O motorista, diante do perigo iminente, tentou segurar o homem para que não atacasse sua colega de serviço, mas não teve sucesso. O agressor acabou desferindo golpes de facão na sua mão, decepando o polegar esquerdo, e golpes na cabeça, que causaram a perda da visão de um olho, e obrigaram a vítima a ser submetida a diversas cirurgias, o que se comprova por todos os laudos periciais, junto com o Boletim de Ocorrência anexos aos autos. Após os ataques e a fuga do agressor, o motorista e a monitora tiveram que suportar os danos, esperando a chegada do socorro no local.
O Juízo da Vara do Trabalho de Tietê entendeu que não ficou configurada a culpa do empregador, uma empresa de pequeno porte de transportes urbanos e rodoviários, e julgou “improcedentes os pedidos de indenização por danos morais, materiais e estéticos”.
O motorista, irresignado, defendeu a “responsabilidade objetiva da ré pelos danos sofridos”, com o argumento de que “as atividades de motorista de transporte de alunos e transporte coletivo urbano se caracterizam como de risco acentuado”, e que o entendimento doutrinário do Juízo de primeiro grau, no sentido de que o fato de terceiro rompe o nexo de causalidade e a responsabilidade da ré, “viola o art. 927, parágrafo único, do CC, assim como a tese firmada pelo STF quanto à imposição da responsabilidade objetiva da empregadora pelos danos decorrentes de acidente de trabalho quando o trabalhador atua em atividade de risco”.
A relatora do acórdão, a juíza convocada Patrícia Glugovskis Penna Martins, reputou aplicável ao caso a teoria subjetiva da responsabilidade civil da empresa, que “limita o ressarcimento dos prejuízos sofridos pelo trabalhador aos casos em que houve a efetiva comprovação da culpa da empresa no evento danoso, com exceção das hipóteses previstas no art. 927, parágrafo único, e 932, III, do Código Civil”. Segundo afirmou a relatora, a “responsabilidade tratada no primeiro desses dispositivos decorre de dano causado ao empregado quando a atividade normalmente exercida, pela sua natureza, acarreta-lhe risco superior ao que estão expostos os demais indivíduos da sociedade”.
Apesar do risco inerente ao trabalho de motorista de transporte escolar, de trafegar por vias públicas, “exposto, portanto, a situação capaz de caracterizar a atividade de risco e atrair a aplicação da responsabilidade objetiva da empregadora”, o acidente de trabalho relatado nos autos “não decorreu de fatores inerentes aos riscos próprios da atividade de motorista de transporte escolar, o que permitiria a aplicação do parágrafo único do art. 927 do CC”, mas sim “de agressão de autoria do ex-namorado da companheira de trabalho do recorrente, a monitora, com a intenção, inclusive, de vitimá-la de forma fatal”, afirmou o colegiado.
De acordo com o Boletim de Ocorrência, que tratou de roubo de veículo (diverso daquele em que ocorreram os fatos relatados), foi descrito que “após perseguição pelos policiais, o motorista parou e saiu do carro, onde havia também outra pessoa que permaneceu em seu interior. Nessa ocasião, ‘os policiais perceberam que o passageiro estava com as vestes sujas de sangue, sendo que ao procederem a revista pessoal encontraram uma pequena faca presa à cintura do indivíduo. Ao indagarem o indivíduo, este confessou que havia acabado de tentar matar sua ex-namorada com um facão, dentro de um ônibus escolar, sendo que também havia esfaqueado o motorista do ônibus’.”.
O acórdão concluiu, assim, que ficou “evidenciada a hipótese de excludente de responsabilidade da empregadora, por se tratar de fato de terceiro, absolutamente desvinculado das atribuições desempenhadas no exercício das funções de motorista de transporte escolar”, e que “o episódio se amolda à situação de imprevisibilidade, o que caracteriza o caso fortuito externo e corrobora a conclusão quanto à exclusão da responsabilidade civil da empregadora”. Nesse sentido, “em que pesem aos graves danos sofridos pelo recorrente, não há como ser imposta à recorrida as reparações pretendidas, em face da caracterização da excludente de responsabilidade civil da empregadora”, concluiu o acórdão. (Processo 0010224-49.2019.5.15.0111)
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