Ministro Lelio Bentes Corrêa fala sobre os impactos e as lições da pandemia no Congresso do TRT-15

Ministro Lelio Bentes Corrêa fala sobre os impactos e as lições da pandemia no Congresso do TRT-15
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Com o título de “Pandemia global, direitos humanos e tutela jurídica internacional”, a conferência de abertura do 21º Congresso Nacional de Direito do Trabalho e Processual do Trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, proferida de modo telepresencial pelo ministro do Tribunal Superior do Trabalho Lelio Bentes Corrêa, marcou o início do evento na manhã desta quinta-feira, 7/10. O vice-presidente administrativo da 15ª, desembargador Fabio Grasselli, destacou a atualidade e relevância dos temas escolhidos e, ao apresentar o conferencista, salientou sua trajetória profissional, iniciada no Ministério Público do Trabalho em 1989, com forte atuação em defesa dos direitos humanos e no combate ao trabalho infantil, tendo exercido, entre outros, o cargo de oficial de programas para a América Latina do Programa Internacional para a Erradicação do Trabalho Infantil, da Organização Internacional do Trabalho, em Genebra, entre 2002 e 2003.

A palestra, apresentada ao longo de 1h30, abordou em três diferentes frentes o que o ministro chamou de “fenômeno trágico provocado pela pandemia da covid-19, a maior crise sanitária mundial da atualidade”: os números do impacto nos direitos humanos, a importância das normas e dos sistemas de proteção de direitos para o enfrentamento com dignidade e justiça social, e por fim, as perspectivas para uma sociedade pós-pandemia, num processo de plena execução das atividades econômicas.

Apesar de sua abrangência global, a pandemia que já registrou em todo o mundo 235 milhões de casos, vitimando 4,8 milhões de pessoas, não atingiu de forma idêntica a todos. Segundo o palestrante, a afirmação de que “a tempestade é a mesma, mas não nos encontramos no mesmo barco” explica as diferenças proporcionadas pela pandemia no mundo do trabalho, na saúde, na educação e no futuro de milhões de pessoas, especialmente as mais vulneráveis. Não à toa, os mais atingidos pela pandemia foram e ainda são os mais pobres, cerca de 4 bilhões de pessoas em todo o mundo, segundo dados da OIT, que vivem sem nenhum tipo de proteção social. São eles que, por força do trabalho, foram mais expostos aos riscos de contaminação pela não observância das medidas sanitárias (falta de recursos básicos de higiene, falta de distanciamento social e informalidade nas atividades laborais, essa que atinge cerca de 2 bilhões de pessoas, segundo dados da OIT). 

Para o ministro, porém, essa situação, ainda que gerada em plena pandemia, não é acidental, mas sim fruto de políticas ortodoxas contrárias aos objetivos do bem-estar social. Nesse sentido, “não faltaram alertas da OIT, com suas Recomendações, especialmente as que garantem pisos de proteção”, lembrou o expositor. Ele citou, como exemplo, a Recomendação 202, de 2012, que proporciona orientações aos Estados-membros para o estabelecimento e manutenção de Pisos de Proteção Social, que deverão ser implementados como estratégia para assegurar níveis mais elevados de proteção a um maior público possível, combatendo principalmente a vulnerabilidade e a exclusão social.

Após 20 anos, os números da pobreza extrema voltaram a crescer durante a pandemia do coronavírus, e confirmam que o mundo retrocedeu. Em um ano (de 2019 a 2020), subiu de 8,4% para 9,5%, atingindo cerca de 120 milhões de pessoas, e estima-se que até o final de 2021 atinja 150 milhões em todo o planeta, em acréscimo aos 600 milhões já existentes. No Brasil, 13% da população vive com menos de R$ 10,00 por dia, e a insegurança alimentar avança. Paralelamente, crescem também os números sobre trabalho infantil no Brasil e no mundo, atingindo cerca de 160 milhões entre 2019 e 2020, com impacto na evasão escolar.

Nem mesmo o acesso à vacina, principal recurso para o controle da pandemia, consegue se impor de forma igualitária em todos os continentes e revela a desigualdade entre ricos e pobres. Enquanto nos Estados Unidos e no Canadá são registradas 118 doses aplicadas em cada 100 habitantes; na Europa são 104, na Ásia 85, na América Latina 84 e, na África, apenas 9 doses em cada 100 habitantes, o que aumenta as chances de surgimento de novas variantes do vírus nesses países. 

Os efeitos devastadores e até mesmo “cataclísmicos” da pandemia, segundo afirmou o ministro, registram também perdas de renda gerada pelo trabalho na ordem de U$ 3,7 trilhões, fato diretamente ligado à supressão de postos de trabalho, sendo os mais vulneráveis, não por acaso, os jovens, as mulheres, os trabalhadores informais e os imigrantes. Soma-se a isso ainda o preconceito racial, que registra aumento de até 18% entre as pessoas pretas e pardas. Diante desse quadro, conclui-se que “o vírus não discrimina, quem discrimina é a sociedade”, afirmou o ministro, salientando que a crise econômica, aprofundada pela pandemia, atinge principalmente trabalhadores com jornada de trabalho parcial, com menores salários e sem carteira assinada, mesmo frente ao “falacioso discurso de necessidade de redução de direitos para se garantir empregos, e do estrondoso fracasso da Reforma Trabalhista que insiste em culpar o paciente e não o remédio”, destacou o palestrante.

Todo esse quadro reforça, segundo o ministro, a importância das normas e das leis de proteção aos direitos humanos consensuados pela comunidade internacional. Nesse sentido, o ministro destacou a atuação elogiosa da Justiça do Trabalho brasileira durante a pandemia, que mesmo com restrições conseguiu manter a prestação jurisdicional e a garantia de direitos. Para o futuro, essas normas, que devem ser estabelecidas para assegurar condições de existência a todos os seres humanos, deverão ser mais exigidas, principalmente pelos países do Parlamento Europeu, na chamada “devida diligência” na compra de produtos e insumos comprovadamente livres de violência a direitos humanos, ambientais, econômicos e culturais. 

Paralelamente, as jurisdições domésticas deverão intensificar o controle de convencionalidade das normas de direitos humanos, garantindo a elas pelo menos o status de normas supralegais. Nesse sentido, as inúmeras normas internacionais de trabalho, que apresentam uma gama enorme de proteção, com objetivo de garantir a paz universal e duradoura, e o respeito ao princípio de que o trabalho não é uma mercadoria, nem o trabalhador um objeto.

Em sua conclusão, o ministro Lélio Bentes Corrêa afirmou que, dentre as lições aprendidas com a pandemia, pelo menos duas podem ser destacadas: o custo humano foi consequência direta de políticas fracassadas e, também, embora seja animador o atual crescimento econômico, é alarmante que este se dê de forma tão desigual, o que exige uma mudança para o futuro, a fim de se evitar uma política ainda mais excludente. 

De acordo com o ministro, não podemos nos comportar como meros sobreviventes à peste, alimentando sentimentos de indiferença e banalização dessa experiência, mas sim devemos reforçar atitudes de solidariedade, a mesma registrada nos piores momentos da pandemia, e não fechar os olhos ao sofrimento do próximo, aos seus infortúnios ou à negação de seus direitos. “Não esqueçamos as lições da pandemia nem almejemos voltar a um novo normal que seja pior do que o anterior. Que sejamos definitivamente melhores do que já fomos”, encerrou. O conteúdo na íntegra está disponível no endereço eletrônico: https://congresso.trt15.jus.br/0710a

Painéis do dia

O primeiro painel reuniu na mesma mesa de debates dois especialistas internacionais, os professores Mauricio César Arese, titular de Direito do Trabalho da Universidade Nacional de Córdoba, Argentina, e José João Abrantes, catedrático da Universidade Nova de Lisboa, Portugal, que discorreram sobre os impactos da pandemia no direito do trabalho na América Latina e na Europa. O painel foi coordenado pelo  vice-diretor da Escola Judicial do TRT da 15ª Região, desembargador Ricardo Regis Laraia.

Presidido pela desembargadora do TRT-15 Maria Inês Corrêa de Cerqueira César Targa, o segundo painel abordou o direito do trabalho emergencial com participação do juiz do Trabalho e membro da Comissão de Jurisprudência do TRT da 4ª Região (RS) Cesar Zucatti Pritsch. A professora de Direito Digital da Universidade São Judas Tadeu,  Carolina Dalla Pacce, explanou, na sequência, sobre a “LGPD, direito à intimidade e tutela laboral”.

Os conflitos coletivos e a pandemia foram tratados no terceiro painel pelos advogados especialistas Tirza Coelho de Souza, mediadora judicial do Conselho Nacional de Justiça, e Fabiano Zavanella, além de Alexandre Furlan, presidente do Conselho de Relações do Trabalho da Confederação Nacional da Indústria, e do deputado federal Luiz Carlos Motta. A mesa foi conduzida pelo vice-presidente Judicial do TRT da 15ª Região, desembargador Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani.

O quarto painel, coordenado pelo desembargador Lorival Ferreira dos Santos  (presidente do TRT-15 no biênio 2014/2016), contou com a participação do procurador regional do Trabalho aposentado Raimundo Simão de Melo, que discorreu sobre a ação civil pública no contexto pandêmico. A corregedora regional do TRT-15, desembargadora Ana Paula Pellegrina Lockmann, palestrou sobre o rito emergencial e as novas modalidades de audiência impostas pela pandemia.

O quinto e último painel do dia teve como tema central o meio ambiente do trabalho. A médica Margareth Dalcolmo, professora e pesquisadora da Fiocruz, o juiz do trabalho Guilherme Guimarães Feliciano, professor associado do Departamento de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da USP, e o ministro do TST Augusto César Leite de Carvalho abordaram as obrigações e responsabilidades do empregador na prevenção da covid-19, incluindo a necessidade de vacinação. O painel foi presidido pela vice-corregedora regional do TRT-15, desembargadora Rita de Cássia Penkal Bernardino de Souza. Os conteúdos na íntegra estão disponíveis no endereço eletrônico: https://congresso.trt15.jus.br/710b

O congresso tem sequência nesta sexta-feira, dia 8/10, a partir das 9 horas, com a apresentação de Call for Papers por estudantes de Direito que tiveram seus artigos temáticos selecionados pela Ejud-15. Ainda serão abordados em mais dois painéis o trabalho infantil e a igualdade de gênero e trabalho na pandemia. A conferência de encerramento sobre tutelas de urgência e execução estará a cargo do ministro do TST, Cláudio Mascarenhas Brandão. 
           
Organização e patrocínios

O congresso, organizado pela Coordenadoria de Comunicação Social da Corte, conta com patrocínio do Banco do Brasil, Samsung e Febraban (Categoria Diamante); Sicoob Cocred e TransJordano (Categoria Ouro); Sindicamp, Honda, Associação Paulista dos Supermercados (APAS) e Unilever (Categoria Prata); e Alfa Financeira, Tel Telecomunicações e União da Indústria da Cana de Açúcar (Unica) (Categoria Bronze). Presidida pela desembargadora Ana Amarylis, a comissão organizadora do congresso é integrada também pelos desembargadores Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani (vice-presidente judicial), Ana Paula Pellegrina Lockmann (corregedora regional), João Batista Martins César (diretor da Ejud15), Ricardo Regis Laraia (vice-diretor da Ejud15), Eduardo Benedito de Oliveira Zanella, Lorival Ferreira dos Santos, Maria da Graça Bonança Barbosa, bem como pelos juízes Lúcia Zimmermann e Marcelo Garcia Nunes (auxiliares da Presidência), Guilherme Guimarães Feliciano (auxiliar da VPJ) e pelo juiz Marcel de Ávila Soares Marques.

Unidade Responsável:
Comunicação Social